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A hashtag #livronacional atingiu mais de 85 milhões de visualizações na rede social TikTok em 2022. Com a produção de vídeos que indicam e comentam obras escritas por brasileiros sob essa tag, outros usuários conhecem títulos novos.

O crescimento dessa hashtag está ligado com a subcomunidade do TikTok chamada “BookTok”, em que produtores de conteúdo para a plataforma fazem recomendações literárias, mostram os livros que compraram ou têm interesse em ler e interagir com outros leitores. 

A Bienal do Livro de São Paulo 2022, que ocorreu do dia 2 a 10 de julho foi marcada, principalmente, pela expressiva participação de escritores nacionais com influência nas mídias digitais. Com recorde de vendas, a 26ª edição da Bienal acentuou a importância das redes sociais no mercado literário, já que títulos fortemente indicados por produtores de conteúdo para o nicho BookTok tiveram grande procura por parte do público.

Oportunidade através das redes

Alguns dos temas comuns presentes nos títulos populares entre os nichos literários das redes sociais são a fantasia, o romance, a temática juvenil (presente nos livros de Young Adult, que é o nome dado a ficções para jovens com assuntos mais sérios) e a representatividade LGBTQIA+ e de outras minorias. Os membros das bolhas do “BookTok”, “Bookgram” (produtores de conteúdo literário para o Instagram) e “BookTT” (grupos de pessoas que falam sobre livros no Twitter), também buscam divulgar autores brasileiros que produzem obras que se encaixam nesses tópicos.

Um desses escritores, que não apenas foi acolhido pelas redes sociais, mas que também produz conteúdo para elas, é Felipe Saraiça. Somando mais de 46 mil seguidores no TikTok, o criador de “Para Onde Vão os Suicidas”, livro de fantasia que aborda saúde mental, misticismo e conflitos internos, foi abraçado por essa comunidade durante a pandemia. “O público do TikTok é um público que gosta de falar de emoções. Como eu escrevo sobre elas, acabou gerando uma conexão muito boa. Além disso, há muitos jovens por lá e a narrativa de minhas histórias conversa demais com a idade”, explica o autor. Segundo ele, “o TikTok possui uma comunidade do livro muito grande e os usuários da rede recebem muito bem os escritores, sendo eles novos ou já conhecidos”.

Homem de cabelo curto azul com roxo aparenta estar falando algo com um microfone em sua mão e segurando um livro na outra. Ele está na frente de um telão.
O autor Felipe Saraiça na Bienal do Livro SP 2022. Foto: Acervo Pessoal/Felipe Saraiça.

De acordo com Saraiça, o alcance das suas obras e de outros autores nacionais também foi ampliado devido à rede social, pois os vídeos publicados nela se espalham mais facilmente: “Com as grandes chances de se tornar viral e atingir um bom público, a rede tem ajudado muitos autores a terem sua vida transformada. Seja em vendas, publicações ou estar em grandes editoras”. Felipe também sentiu emoção ao retornar para a Bienal em 2022 e ver “a literatura nacional em destaque”, já que foi na sua primeira participação no evento em que realmente se viu como escritor.

Outra autora que se encontrou nas redes sociais é L.S. Englantine. Publicando de forma independente, ela vê nas redes uma forma de se aproximar dos seus leitores, visto que é possível ter contato direto com o público. Embora goste mais de utilizar o Instagram, Englantine também está presente em outras plataformas e esclarece que existem diferenças entre elas: “Em todo lugar existem públicos distintos, com intenções diferentes. Eu sinto que esses três meios de acesso [BookTok, Bookgram e BookTT] estão conectados pelo amor do livro, porque os três possuem divisões significativas para com os livros; há quem prefere sagas, livros hots, livros com CEO, livros de comédia. E nos três, encontro os setores bem divididos. Só muda a divulgação, onde prevalece quase sempre os vídeos”.

Mulher de cabelos longos e pretos autografa livro. Há várias pessoas ao fundo no que parece ser um evento cultural.
L.S. Englantine autografa livro na Bienal 2022. Foto: Acervo Pessoal/L.S. Englantine.

A escritora de “Minha Última Pessoa Preferida” presenciou na Bienal um momento muito marcante, quando três leitoras que se conheceram lá se juntaram para encontrá-la no evento. Conversar com leitores, interagir com pessoas de todos os lugares do Brasil, contato com editoriais e entrevistas para rádio e revistas foram algumas das oportunidades causadas pela sua presença como escritora nas redes sociais.

Efeito do “BookTok” é sentido pelas editoras

O potencial das redes sociais já foi percebido pelas editoras, que enxergam nelas um público crescente e aficionado. No TikTok, a hashtag #BookTok conta com 68,9 bilhões de visualizações na plataforma. 

Segundo Julia Braga Tourinho, assistente editorial na Editora Nacional, “o BookTok proporciona uma disseminação muito mais ampla dos livros, despertando interesse e alcançando até mesmo públicos que não cultivam o hábito da leitura. Os livros nacionais estão ganhando cada vez mais espaço no BookTok, e os autores, por estarem eles mesmos dentro dessas redes e por conversarem diretamente com os leitores, acabam amplificando seu público.”

Inclusive, o TikTok teve um papel essencial para a criação do selo Naci, que surgiu “da força percebida entre os leitores de YA [Young Adult]”. Através da plataforma, foi observada pela editora a paixão desses leitores pelo gênero.

A interligação entre editora e TikTok não fica restrita apenas no monitoramento do gosto do público: as publicações feitas pelos autores TikTokers também resultam em um número maior de vendas, o que abre um espaço ainda maior para os escritores nacionais receberem mais reconhecimento. 

“BookTok” traz mais interesse dos jovens pela leitura

Como a maior parte do público do TikTok é formado por jovens, o BookTok não é diferente. Com vídeos divertidos e elaborados, essa subcomunidade motiva o grupo de tal faixa etária a conhecer e consumir mais livros. 

Para a secretária Maria Eduarda de Castro Moura, 18, a descoberta de novos títulos literários veio de uma forma descontraída: através de memes sobre livros publicados na plataforma. O nicho tornou a leitura algo mais interessante para ela. Quando aparece um vídeo falando sobre livros nas suas sugestões, a jovem se interessa por ele de imediato, pois já tem confiança nas recomendações feitas pelos outros usuários. Além disso, o BookTok também quebrou o preconceito que Maria Eduarda tinha com livros nacionais, tornando-a em uma apreciadora de obras brasileiras indicadas no aplicativo.

A professora Fabiana Iolanda Sotini, formada em Letras pela PUC-GO e mestre em Educação Básica com ênfase em Literatura pelo CEPAE/UFG, tem uma visão otimista sobre o efeito do BookTok para crianças e adolescentes. “Eu enxergo esses novos espaços e ferramentas como algo muito positivo porque o ato de ler demanda motivação que é proporcionada de maneira muito criativa nas plataformas e redes virtuais. Acredito que esses fenômenos, se pudermos chamar assim, prestam um importante serviço para a formação  e manutenção de leitores, até mais que as aulas de literatura”, explica.

4 thoughts on ““BookTok” e nichos literários nas redes sociais expandem reconhecimento de autores nacionais”

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