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Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (Everything Everywhere all at Once no original), nos traz um novo olhar sobre algo a que já estamos acostumados: heróis e multiverso. O filme, lançado em março de 2022, foi dirigido pela dupla The Daniels – Dan Kwan e Daniel Scheinert – e tem como protagonista Evelyn Wang (Michelle Yeoh). Enquanto gere sua lavanderia familiar, a imigrante chinesa tenta lidar com seu casamento fracassado, uma relação conturbada com sua filha e cuidados com seu pai idoso que a negligenciou durante a infância.
No decorrer da trama, Evelyn precisa reunir documentos para realizar uma auditoria, evitando que sua lavanderia seja fechada. Ao chegar lá, uma ruptura no tecido interdimensional ocorre e a protagonista se vê frente às loucuras que um multiverso pode trazer. Neste novo universo de possibilidades, Evelyn não somente tem que se tornar uma heroína e salvar o mundo de uma seita que quer acabar com as camadas do multiverso, como também lidar com suas próprias crises internas e familiares.
O filme, que estreou há pouco mais de quatro meses, tem sido aclamado pelas críticas, obtendo uma porcentagem de 89% de aprovação pelo público nos Rotten Tomatoes e uma classificação de 8,2/10 no IMDb. A obra já vem sendo cotada como uma das melhores do ano – se não a melhor – mas também tem causado algumas divergências nas opiniões do público. Apresentemos então, três coisas que achamos extraordinárias sobre Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo.
Primeiramente, a obra foi lançada quase paralelamente à Doutor Estranho no Multiverso da Loucura, filme de cerne similar, mas resultante de um estúdio muito maior. Diferente de Multiverso da Loucura, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo não teve o amparo de mais de uma década de construção cinematográfica de um universo já definido e de personagens já conhecidos pelo público. Por isso, pode ter sido um pouco renegado pelos fãs mais assíduos da Marvel no início.
Assim, as críticas que Multiverso da Loucura já vinha recebendo sobre seus efeitos visuais e roteiro mediano ficaram ainda mais acaloradas ao serem postas em paralelo a Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo. Poderíamos ousar dizer, então, que a obra teria transformado a premissa de uma das histórias mais esperadas do ano em um filme muito mais integral e sem espaço para erros. Ousadia essa que talvez não fosse possível em outro universo.
Em segundo lugar, a própria premissa do filme é preciosa. Já estamos vendo há algum tempo o mercado cinematográfico trazer pautas de reconciliação familiar para seus líderes de bilheteria. As próprias animações da amada Disney têm trabalhado em peso com esta pauta, como em Luca (2021), RED (2022) ou Encanto (2021). E Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, trabalha muito bem a temática, na qual a premissa do drama familiar – aliado aos tenazes pontos de ficção científica – traça linhas entre a sensibilidade, o humor, o drama e as referências a outras obras que consagram uma experiência brilhante.
O filme nos propõe, de forma inventiva, a refletir no “E se?”. A pergunta que coloca em questionamento a existência humana, que abre um leque de muitos universos para serem explorados caso os “e se” fossem concretizados. Todas as escolhas que são feitas em nossas vidas são importantes e vão acarretar mudanças? Se sim, ou se não, o que será de nós e quem nos tornaremos quando e se essas escolhas forem feitas? Viveremos então, em dúvida? Cabe o questionamento.
Finalmente, através das peculiares possibilidades já apresentadas pelos outros universos, a obra nos leva ao nosso terceiro ponto extraordinário: a ruptura com o cinema “leguminoso” que conhecemos. Nos últimos anos temos visto cada vez mais movimentações no mundo do cinema para que mais obras “não-convencionais” sejam aclamadas na Academia. O que se discute é que, muitas vezes, filmes que têm uma tendência a serem indicados ao prêmio do Oscar são como legumes: sabemos que devemos comê-los porque vai ser bom para o nosso organismo, mas não necessariamente gostamos da experiência.
Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo vem com uma total despreocupação com a “leguminosidade” de seu prato e coloca em pauta o viés artístico do cinema, uma obra onde não existem regras. A imaginação marcada no filme traz um quê de “filme independente”, mas não tira seu trunfo presente nos diálogos, direção de arte, atuação e fotografia. É, portanto, um filme para reflexão, para se permitir uma diferente experiência cinematográfica e, claro, para compreender um universo que oferece tudo isso e mais um pouco (ao mesmo tempo).