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Acordo sabendo que não vou ter um pingo de animação durante o dia. Nada emocionante. Nada feliz. Nada que me entretenha minimamente. Acordo e meu primeiro pensamento é me perguntar se minha vizinha também vai ter o mesmo dia, se ela já acorda querendo dormir novamente. Temos estilos de vida parecidos, mas sinto que ela – e todas as pessoas que conheço -, conseguem viver mais. Aquele estilo de vida “ideal”, sabe? Trabalho, estudos, exercícios físicos, alimentação balanceada, vida social, estabilidade financeira. E tudo isso com a saúde mental e emocional intactas (e que, para alguns, não deveriam nem ser uma preocupação).
Me levanto da cama, tomo meu banho, e percebo: estou atrasado. Mais um desequilíbrio entre eu e a vida perfeita. Vou ter que correr para o trabalho, sem tomar café, e fingir. Fingir que tudo isso é perfeito para mim, que tudo está seguindo sob meus planos minuciosamente traçados, obviamente, desde os primeiros minutos de minha vida adulta, claro. E não algo que foi jogado no meu colo durante a pressa da vida, de ter dinheiro, crescer, ser adulto, ser obrigatoriamente feliz de maneiras específicas de acordo com o que é certo. Ideal.
Entro no carro. O carro que gasta mais do meu salário do que deveria. Mas que foi uma grande conquista na minha vida adulta. Meu estômago ronca. Estou pensando que tenho que comer antes de tomar meus antidepressivos – que ninguém sabe que tomo – e fico nervoso tentando montar uma estratégia para fazer isso escondido de todos no escritório. Quero sair do carro e passar o dia todo na cama. Me sinto ingrato, de pensamento elitista, egoísta. Que tenho tudo que muitas pessoas queriam e deveriam ter, e estou desperdiçando. Tudo por não aguentar ser o que deveria. Mas será mesmo? Será que deveria ser desse jeito? Será que todos deveriam seguir os mesmos moldes, os mesmos caminhos da vida?
Chego ao trabalho. Começo a tremer dentro do carro. Quero voltar para casa. Quero ser melhor, mais forte. Resisto à vontade de chorar e tento engolir a ansiedade que faz minha pele formigar e suar junto com o iogurte que comprei no meio do caminho, junto com os remédios que deveriam me fazer mais estável. Respiro. Conto as horas. 8 horas para chegar em casa, 8 horas para a pausa antes de tudo começar de novo. Conto até 10. Substituo o pânico pelo sorriso no rosto, a formalidade. Disfarço as mãos tremendo ao ajeitar a gravata. Só 8 horas, de várias 8 horas para o resto da minha vida.