“Enfrentamos preconceitos como o de que não ‘somos boas’ para fazer ciência” relata pesquisadora do Instituto Internacional para a Sustentabilidade do Rio de Janeiro

Pesquisadora colombiana de pós-doutorado do Instituto Internacional para Sustentabilidade do Rio de Janeiro, Luisa F. Liévano-Latorre, fala sobre as dificuldades de ser cientista e mulher latino americana no atual cenário acadêmico.
out 30, 2023 , ,
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Cientistas trabalhando. (Foto: Reprodução Internet)

O analfabetismo cientifico, ou seja a incompreensão parcial e/ou não entendimento completo de dados científicos no cotidiano, no Brasil ultrapassa de forma assustadora margem de 80% de acordo com a primeira edição do Indicador de Letramento Cientifíco(ILC), publicado pelo Instituto Abramundo em parceria a outros dois institutos. O fenômeno se dá por inúmeros motivos.

A falta de investimentos na educação é catalisador do problema, promovendo uma grande evasão na educação. A cada nível do ensino, a evasão aumenta, de acordo com dados do IBGE. Mas a questão é ainda mais alarmante quando trazida para questões de gênero nesses espaços.

Segundo um relatório de 2016 da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura(UNESCO), apenas um terço dos pesquisadores em todo o mundo são mulheres. Essa distância cresce ainda mais quando se observa o número reduzido de mulheres ocupando cargos nas academias de ciências nacionais, sendo somente 12% das vagas. Estes dados ressaltam a urgência de ações para promover a igualdade de gênero no campo da pesquisa, incentivando mais mulheres a ingressar e permanecerem nessas áreas, e garantindo que seus talentos sejam reconhecidos e valorizados.

Em um relatório feito pelo British Council e Organização das Nações Unidas, em áreas da ciência, tecnologia, engenharia e matemática, em inglês nomeadas como STEM, a disparidade entre a presença masculina e feminina é gigantesca, menos de 40% dos matriculados nessas áreas do saber são mulheres. No relatório é ressaltado dados da UNESCO que dizem “Muitas meninas são impedidas de se desenvolver por conta da discriminação, pelos diversos vieses e por normas e expectativas sociais que influenciam a qualidade da educação que elas recebem, bem como os assuntos que elas estudam”.

Diante dessa realidade enfrentada por mulheres, Luisa F. Liévano-Latorre, graduada em Biologia e mestra pela Universidade Federal do Paraná, doutora em Ecologia e Evolução pela Universidade Federal de Goiás e atualmente pesquisadora de pós-doutorado no Instituto Internacional para a Sustentabilidade no Rio de Janeiro, também interessada em discutir sobre a inclusão de minorias e falta de investimentos na ciência nos cedeu uma entrevista dando a sua opinião sobre o assunto.

Luisa F. Liévano-Latorre. (Foto: Arquivo Pessoal)

Confira a entrevista:

Anna Salgado: Primeiramente, poderia nos dizer o que te motivou a seguir a carreira acadêmica?

Luisa: Sempre achei interessante fazer pesquisa. Desde que estava na graduação, ficava curiosa sobre diferentes questões da natureza e como podíamos descrever e entender diferentes processos através da pesquisa.

Anna Salgado: Quais as maiores dificuldades que você enfrenta sendo uma mulher colombiana no meio acadêmico?

Luisa: Acho que enfrento as mesmas dificuldades que as mulheres brasileiras e Latino Americanas em geral. Além da falta de finançiamiento da pesquisa, as mulheres enfrentamos preconceitos como que não “somos boas” para fazer ciência. Embora não tenha acontecido comigo já vi colegas mulheres sofrendo assédio e sobrecarregadas, ao ter que responder pela pesquisa e o cuidado dos filhos.

Anna Salgado: Você acredita que houve alguma melhora nesse sentido desde o seu início na academia?

Luisa: Eu acho que sim. Atualmente estamos começando a discutir sobre as questões de inclusão na academia e a implementar ações afirmativas. Também estamos questionando que a ciência europeia não é a única maneira de fazer ciência. Porém, também tem tido pioras, como a diminuição do financiamento para educação e pesquisa.

Anna Salgado: Quais iniciativas você acredita que podem mudar o atual cenário?

Luisa: Acho que as ações afirmativas para permitir que mais mulheres e outros grupos sub-representados se mantenham na academia são muito importantes. Por exemplo, ter creches nas universidades, bolsas específicas para mulheres ou outros grupos e medidas efetivas contra o assédio e a discriminação dentro da academia.

Anna Salgado: Quais outras dificuldades você enfrenta?

Luisa: Acho que uma das principais dificuldades para todos os cientistas é a falta de finançiamiento, as poucas opções de emprego depois de concluir o doutorado e a pouca valorização da ciência na atualidade.

Anna Salgado: Como você acredita que a sua presença na academia afeta positivamente para motivar outras mulheres a adentrarem o meio acadêmico?

Luisa: Acho que é importante que as meninas que gostariam de ser cientistas vejam diferentes mulheres seguindo uma carreira acadêmica, porque podem ver diferentes exemplos e sentir que é possível para elas entrarem e se manterem na academia. Assim, mulheres cientistas de diferentes nacionalidades e raças podem inspirar às meninas a escolher ser cientistas.

Anna Salgado: E para finalizar, qual o seu conselho para mulheres ingressantes na ciência?

Luisa: Que é possível realizar e se manter na academia. Procurem pessoas com quem se sintam confortáveis para criar uma rede de apoio forte, assim como orientadores que as impulsem a continuar.

Cientistas no laboratório. (Foto: Reprodução Internet)

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