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Trabalhadores da equipe administrativa da educação de Goiânia estão há um mês de greve e quase 20 dias acampados em frente ao Paço Municipal. O intuito principal é que o prefeito Rogério Cruz (Republicanos) ouça suas demandas e atenda suas reivindicações, para isso, estão dispostos a manter-se no local até que um acordo seja declarado.
Os servidores públicos não buscam só melhorias através da greve. Mas, o cumprimento do que lhes foi prometido desde o ano passado, como o pagamento da data-base que seria pago em maio de 2023.
A greve que disparou no início do mês de outubro (02/10) já sofria com indícios desde o ano passado, porém, tanto os administrativos, quanto os professores estavam envolvidos nessa luta. Entretanto, somente os docentes conseguiram que seus direitos fossem cumpridos, ficando, assim, de lado a equipe administrativa de educação da Prefeitura de Goiânia.
A busca dos servidores é pela equiparação do auxílio locomoção com o dos professores, o reajuste de 6% no pagamento da data-base que está atrasado há 3 anos e principalmente, a renovação do plano de carreira. Para os administrativos da educação, um salário à medida de sua experiência e qualificação é um ponto fundamental para o que buscam.
LabNotícias (LN): Para começarmos, o quão importante e necessária é a atuação da equipe administrativa em uma escola?
Clécia Borba: A atuação da equipe administrativa em uma instituição de ensino é de extrema importância, tendo em vista que são eles os responsáveis em executar tarefas que têm enorme relevância para o processo educacional. Por exemplo, preparar; higienizar e servir as refeições, manter limpo todo o ambiente; atender aos alunos e responsáveis na portaria da escola; organizar e receber os visitantes em espaços como bibliotecas, secretaria e o ambiente de informática.
Em Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) e creches é o administrativo, como os auxiliares de sala, além de tudo isso que mencionei, que são responsáveis pela higiene íntima das crianças. Fora que é o auxiliar administrativo que toma conta das crianças que necessitam de cuidados especiais, como alunos com transtorno do espectro autista (TEA) ou qualquer outro tipo de atendimento especializado. Só quem está no chão da escola consegue entender que sem eles na instituição é impossível cuidar e educar; o que por sinal é lei! [sua presença nas escolas]
LN: Com isso e toda importância dessa atuação no dia a dia das instituições de ensino, você enxerga que as pessoas visualizam a equipe administrativa com tamanha relevância na colaboração educacional dos jovens e das crianças?
Clécia Borba: Não, desde sempre as funções que exigem mais da capacidade física, do que da intelectual, não são vistas como importantes, muito menos são reconhecidas pela maior parte da sociedade. Nem mesmo a própria classe se valoriza.
LN: E, como gostaria e acha que deveriam ser vistas?
Clécia Borba: Gostaria muito que a administração do país, do Estado, do município, bem como as pessoas de poder aquisitivo maior, entendessem que somos peças fundamentais na engrenagem da vida. E que se sairmos de baixo, eles caem. Pois entendendo isso, seríamos sim valorizados.
LN: A senhora acredita que pela forma que as pessoas enxergam a equipe administrativa possa ter resultado na banalização dos seus direitos trabalhistas?
Clécia Borba: Sim. Pois, vivemos em um país de pouquíssimas possibilidades, quando ocorre de tentarmos reagir, como é o caso da atual greve dos administrativos do município de Goiânia, o que não falta são pessoas para colocarem no nosso lugar, com intuito de nos desqualificar, pagando um salário ainda menor.
Como ocorreu agora, o prefeito de Goiânia convocou mais de 1.000 pessoas de processos seletivos, contratados temporariamente, pra nos substituir, além de mandar [para essas funções] funcionários de outros órgãos municipais. A tentativa de reação perde força quando se sabe que de forma fácil e rápida, somos substituídos. E o pior, por pessoas que não são preparadas para desempenhar tais funções. O gestor do município deveria ser punido por isso, entretanto as leis são falhas se tratando das pessoas que detém o poder.
LN: Sim, o caso da decisão da prefeitura de Goiânia de colocar funcionários da Comurg é um bom exemplo do que a senhora acabou de falar. O que deixa ainda mais nítida a tentativa de protelar a resolução de um problema que está em busca de ser sanado por meio das greves. Mas se tratando da qualificação e preparação, de que área da equipe administrativa você faz parte e quais etapas enfrentou para poder estar nela?
Clécia Borba: Trabalho na cozinha, sou merendeira. Tive que passar por uma prova de múltipla escolha na primeira etapa, uma prova física na segunda e uma bateria de exames na terceira. Além de vários cursos sobre boas práticas na manipulação de alimentos, utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPIs), ergonomia, primeiros socorros, atendimento; reconhecimento e conhecimento do TEA. Para assim, prestar um serviço de qualidade às crianças.
LN: Sobre direitos, quais são as demandas da equipe administrativa em greve e quais foram os principais desafios que culminaram na decisão da greve?
Clécia Borba: Estamos cobrando nosso reajuste do data-base de 2023 com o pagamento retroativo, a equiparação do auxílio locomoção com o dos professores, tendo em vista que precisamos nos locomover da mesma forma que eles, e o principal, um plano de carreira que corresponda às nossas expectativas.
LN: A senhora destacaria algum desafio pessoal que está enfrentando enquanto ocorre a greve?
Clécia Borba: Acho que o grande desafio está em fazer com que todos os administrativos vistam a camisa e busquem seus direitos, pois, infelizmente, não creio que teremos resultados positivos, não enquanto a maior parte estiver fora da luta.
LN: Qual é a sua opinião sobre a abordagem do governador Ronaldo Caiado e do prefeito Rogério Cruz em relação às questões relacionadas à educação, já que a equipe administrativa faz parte da educação?
Clécia Borba: São abordagens mentirosas, vivem na mídia dizendo que estão negociando, buscando soluções, que estão buscando junto a secretaria de finanças uma alternativa. Quando na verdade ele [Rogério Cruz] deu uma entrevista dizendo que os grevistas não estão fazendo falta. Não fazem falta porque não são eles que estão fazendo o trabalho de cinco pessoas por um salário miserável.
LN: E para terminarmos, muitas pessoas têm medo de se colocar em uma iniciativa como essa, além de todas as pautas envolvidas na busca da equiparação para vocês da administração. Há uma história ou experiência própria que te fez ter coragem de se envolver na greve?
Bom, a experiência própria que tenho pra relatar é que quando o salário cai na conta, é insuficiente para conseguir pagar as contas e fazer a compra do mês, lazer nem pensar, pois para isso seria necessário que sobrasse ao menos um terço do salário.
Temos o menor salário dos órgãos públicos, concursados há dez anos, ganham o mesmo salário de um contratado por tempo determinado. Isso tudo é por conta da falta do plano de carreira. [“Uma merendeira, que está há 20 anos fazendo a comida das crianças, na hora de receber seu salário ganha R$ 600,00. É pouco demais” argumentou Bia Lima, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores em Educação no Estado de Goiás (Sintego)]