Polícia Militar de Goiás: quando o perigo é quem deveria proteger, a segurança é ameaçada

Quando o perigo é quem deveria proteger, a segurança enfraquece: veja como os abusos de poder e negligência policial são muito presentes em Goiás e como impactam na segurança pública goiana
jan 24, 2024
Tempo de leitura: 6 min

Em Goiás, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública publicado em julho de 2023, a taxa de mortes resultantes de ações policiais é mais elevada do que a média nacional. Enquanto em todo o Brasil há uma média de 3,2 mortes a cada 100 mil habitantes devido a intervenções policiais, em Goiás essa taxa é de 7,6. Em números absolutos, apenas os estados do Rio de Janeiro e Bahia registraram mais mortes causadas pela polícia do que Goiás. Assustadoramente, embora representando apenas 3,2% da população brasileira, Goiás contribuiu com 8,3% de todas as mortes decorrentes de intervenções policiais no país em 2022.

Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; Instituto de Segurança Pública/RJ (ISP); Polícia Civil do Estado do Amapá; Polícia Civil do Distrito Federal; Polícia Civil do Estado de Roraima

A desculpa para relativizar a força letal usada por policiais muitas vezes é baseada na ideia de que esse é o único jeito de combater a criminalidade. O argumento sugere que, se assim não for feito, os criminosos ameaçariam ainda mais a vida dos cidadãos, e que, se inocentes morrerem durante essa opressão ao crime, seria um sacrifício necessário. Porém, analisando os dados, será mesmo que com a polícia goiana matando quase três vezes mais do que a média brasileira, ela faz os bandidos menos perigosos?

A resposta é não. Apesar de Goiás ter uma taxa um pouco acima da média nacional de Mortes Violentas Intencionais (MVI), com 25,2 por 100 mil habitantes (a média brasileira é de 23,4), quando analisamos a proporção de mortes por intervenções policiais em relação às mortes violentas intencionais, o estado tem a segunda maior taxa do Brasil, perdendo apenas para o Amapá. As intervenções policiais em Goiás representam 30,2% de todas as mortes por violência no estado goiano.

Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; Instituto de Segurança Pública/RJ (ISP); Polícia Civil do Estado do Amapá; Polícia Civil do Distrito Federal; Polícia Civil do Estado de Roraima.

Alvos Negros

Além das pessoas estarem sendo mortas por quem deveria lhes proteger, o racismo institucional é presente quando o assunto é força policial. Da quantidade de mortos em decorrência de intervenções policiais, 83,1% são negros, 16,6% brancos e 0,2% amarelos. Esse cenário, infelizmente, é realidade majoritária da população de jovens entre 18 e 24 anos. De acordo também com o anuário, 45,4% dos mortos possuem essa faixa etária. O restante dos 54,6% pertencem ao restante das idades.

Fonte: Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Social; Instituto de Segurança Pública/RJ (ISP); Polícia Civil do Estado do Amapá; Polícia Civil do Distrito Federal; Polícia Civil do Estado de Roraima.

Medidas Cabíveis

Uma maneira eficaz de amenizar o problema e dar eficiência ao trabalho policial, é a implementação de monitoramento de vídeo no uniforme dos policiais militares goianos. Medida essa que já é contemplada por oficiais do estado de São Paulo, que obtiveram ótimos resultados por meio do programa “Olho Vivo” que instituiu ‘bodycams’ nas fardas dos policiais paulistas.

Aqui em Goiás, a juíza Mônice de Souza Balian, atendendo ao pedido de promotores de Justiça, decidiu que câmeras devem ser instaladas nas fardas e viaturas da Polícia Militar (PM) em Anápolis, cidade localizada a 55 km de Goiânia. A medida tem como objetivo a redução da letalidade policial e foi estabelecido um prazo de 90 dias para que o governo estadual elabore um plano de implementação de sistemas de áudio e vídeo na farda dos policiais, com a execução prevista para ocorrer em seis meses, de acordo com informações divulgadas pela Secretaria de Segurança Pública de Goiás.

A determinação da juíza ocorre em meio a um intenso debate sobre o uso de câmeras de áudio e vídeo nos uniformes policiais no estado de Goiás. No dia 25 de maio de 2023, a Assembleia Legislativa de Goiás realizou discussões sobre o andamento do Projeto de Lei (PL) 924/22, proposto pelo deputado estadual Antônio Gomide (PT-GO).

O PL 924/22 visa a implantação de um sistema de áudio e vídeo nos uniformes policiais em todo o estado de Goiás. A proposta tem como objetivo principal promover a transparência e o controle das ações policiais, além de contribuir para a redução de abusos e violações dos direitos humanos.

Em entrevista com Gomide (PT-GO), ele diz que “o uso das bodycams foi constatado em pesquisas feitas pela PM paulista a redução de 87% do uso de força letal nas atividades policiais, e também redução de 70% na mortalidade de policiais no seu serviço diário” e mais continuamente mostrou também aumento de eficácia na prisão de flagrantes, pelos policiais adeptos da tecnologia: “A experiência paulista destacou também aumento de 43,14% no número de prisões em flagrante nos batalhões que adotaram câmera nas fardas, aumento de 12,9% na apreensão de armas, aumento de 56,6% na atuação de policiais em casos de violência doméstica”.

Fonte: Assessoria de Antônio Gomide (PT-GO)

Implementação

Durante o debate na Assembleia Legislativa, parlamentares discutiram os benefícios e desafios da implementação do sistema de câmeras nos uniformes policiais. Desse modo, algumas preocupações foram levantadas em relação à privacidade dos policiais e ao custo da implementação do sistema. Sobre os gastos para tal prática, Gomide afirma: “O principal custo que temos que levar em conta é a preservação de vidas, a eficiência do serviço de segurança e a obediência às leis e as garantias individuais“. A presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-GO, Larissa Junqueira Bareato salienta que o custo para a Justiça das audiências entre vítimas e policiais também é custo, “O uso das bodycam representa economia para o Poder Judiciário.“, afirma também o deputado.

Houve também debates sobre a necessidade de treinamento adequado para o manuseio das câmeras e o armazenamento seguro das imagens capturadas, que de acordo com o petista, terá inspiração na experiência dos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Ceará, Santa Catarina, Rondônia, além da prática de países como Reino Unido e Estados Unidos. Porém, não houve menção de previsão ou detalhamento desses treinamentos.

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