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Os fenômenos El Niño e La Niña, embora possam parecer distantes e abstratos para muitos, têm desencadeado uma série de desafios para as comunidades brasileiras. Seus efeitos são profundamente sentidos, afetando desde a produção agropecuária até a incidência de doenças como a dengue. 

Os fenômenos como o El Niño e a La Niña não representem mudanças climáticas por si só, eles têm um histórico cíclico que remonta a 1950 e exercem influência sobre a variabilidade climática.  Essas alterações climáticas afetam diretamente setores chave como agricultura, pecuária e áreas urbanas, que sofrem com estiagens intensas ou chuvas excessivas. Por exemplo, em 2023, enquanto algumas regiões enfrentavam estiagem, outras eram atingidas por tempestades.  

Essa irregularidade climática impacta diretamente os agricultores, reduzindo sua rentabilidade e limitando recursos para investimentos. As perdas na produção agrícola não apenas afetam os agricultores, mas também seus funcionários, consequentemente prejudicando a economia local e estadual. 

SITUAÇÃO ATUAL

Atualmente, o Brasil enfrenta os desafios decorrentes dos efeitos climáticos causados pelo El Niño e La Niña. Regiões do país sofrem com chuvas intensas, inundações, estiagens prolongadas e surtos de doenças transmitidas por vetores, como a dengue. 

Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), as transições sazonais ocorrem de forma variável ao longo do ano, sendo a chegada da La Niña mais comum no final do ano, embora não haja uma data precisa ou padrão definido. Por exemplo, no ano passado, o El Niño começou em junho e é esperado que dure cerca de um ano, podendo terminar por volta de maio deste ano. Essa variação temporal torna o fenômeno dinâmico, com possíveis variações de até dois meses em relação ao período esperado. 

ORIGENS

De acordo com a PERFARM, os fenômenos El Niño e La Niña têm suas origens nas alterações das temperaturas das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial. Essas mudanças térmicas desencadeiam padrões climáticos que afetam todo o globo, incluindo o Brasil. 

Os fenômenos El Niño e La Niña não são os causadores diretos das mudanças climáticas. Eles são eventos que ocorrem devido às variações nas águas do Pacífico equatorial e têm sido monitorados desde então. Esses fenômenos podem ser amplificados por ações humanas locais, criando um efeito em cascata que pode ter impactos globais. 

CONTEXTO E ANÁLISE 

Em entrevista feita pelo Lab Notícias, o especialista André Amorim, coordenador do Cimehgo, afirmou que:

A análise dos impactos do El Niño e La Niña no Brasil revela a complexidade desses eventos climáticos. Enquanto o El Niño traz chuvas irregulares e estiagens na parte centro-sul do país, La Niña pode causar inundações e períodos de seca em outras áreas do país. 

El Niño: 

– Na parte centro-norte do Brasil, o El Niño causa chuvas altamente irregulares e tendência de estiagem. 

– Na parte centro-sul, as consequências do El Niño são chuvas em excesso, alternando entre períodos de muita chuva e estiagem. 

La Niña: 

– No Brasil Central, a La Niña é vista com bons olhos, trazendo chuvas abundantes que beneficiam a região e estados como Goiás. 

– No sul do país, a La Niña pode ser prejudicial, aumentando a incidência de estiagem e trazendo irregularidades nas chuvas, impactando negativamente diversos setores. 

DADOS E ESTATÍSTICAS

O fenômeno climático El Niño está se encaminhando para o fim e se aproximando de uma condição neutra, de acordo com as últimas observações do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Ao longo do mês de abril, foi registrado um resfriamento notável nas Temperaturas da Superfície do Mar (TSMs), alcançando valores próximos a 0,5ºC acima da média nos últimos cinco dias na região de Niño 3.4, indicando uma transição para a fase neutra do oceano.

Esse resfriamento é parte de uma tendência observada anteriormente, com as TSMs diminuindo constantemente no Pacífico Equatorial, passando de 1,5ºC para 1,2ºC acima da média entre fevereiro e março de 2024. Os modelos climáticos mais recentes indicam que essa condição de neutralidade deverá persistir até meados de junho. 

Monitoramento do índice diário de El Niño/La Niña na região 3.4. Fonte: Inmet
TRANSIÇÃO PARA O LA NIÑA

O fenômeno climático La Niña está previsto para ocorrer no segundo semestre deste ano, conforme indicado pelo boletim do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet). Este fenômeno é caracterizado pela queda na temperatura da superfície das águas do Oceano Pacífico Tropical Central e Oriental. Sua formação está ocorrendo concomitantemente ao término do El Niño, com áreas mais frias já detectadas em algumas regiões do Pacífico Equatorial, sinalizando o surgimento do La Niña. Há uma probabilidade de que o Brasil comece a sentir os efeitos deste fenômeno durante o período entre junho e agosto, com previsão de chuvas acima da média nas regiões Norte e Nordeste e possíveis irregularidades nas regiões Sul, Centro-Oeste e Sudeste, o que poderia aumentar os riscos de secas ou estiagens, especialmente durante a primavera e o verão. 

Mapa de anomalias de TSM no período de 1º a 15 de abril de 2024. Fonte: Inmet
IMPACTOS NA AGRICULTURA

Os fenômenos climáticos, como El Niño e La Niña, podem desencadear e agravar a proliferação de vetores e pragas, afetando tanto áreas urbanas quanto rurais. Em Cáceres, Mato Grosso, oscilações frequentes entre chuva e calor no campo propiciaram o surgimento de uma espécie de lagarta que devastou as pastagens locais, acarretando prejuízos significativos para os produtores. 

A proliferação de pragas, como as lagartas, destaca a vulnerabilidade das atividades agrícolas e a importância de medidas adaptativas para mitigar esses impactos e garantir a segurança alimentar das comunidades rurais. 

Segundo o agricultor na região de Goiás, Robson: 

“Como somos pequenos produtores rurais não tivemos tantas perdas, o que aconteceu foi retardar o processo da colheita, devido às altas temperaturas e falta de chuva. No caso do excesso de chuva que tivemos posteriormente, fez com que as mandiocas apodrecessem ainda no solo, impossibilitando o seu consumo, nesse sentido tivemos algumas perdas, as quais não foi possível lidar.” 
IMPACTOS NA SAÚDE: 

O Brasil enfrenta uma crescente epidemia de dengue em 2024, com números alarmantes que superam qualquer registro histórico anterior. De acordo com dados do Ministério da Saúde, o país registrou mais de 4 milhões de casos prováveis e confirmados de dengue nas primeiras dezesseis semanas deste ano. Esse número representa um aumento significativo em relação ao mesmo período do ano anterior, que contabilizava cerca de 900 mil casos. A magnitude desta epidemia é evidenciada pelo fato de que 2024 já ultrapassou o recorde anterior de casos de dengue, estabelecido em 2015. 

A dengue tem sido uma preocupação constante na área da saúde. O mosquito Aedes aegypti, transmissor da doença, encontra em ambientes com água parada o local ideal para se reproduzir. Mesmo com cuidados rigorosos, como no caso de Luciene Rios de 49 anos, moradora atenta, a proximidade com essas áreas naturais pode resultar em contaminação. 

Luciene compartilhou sua experiência pessoal em entrevista realizada ao Lab Notícias: 

“Na primeira vez que eu peguei dengue, eu tive bastante sintomas. Já na segunda vez foi bem pior. Os sintomas foram bem fortes e eu fiquei bem debilitada. Eu fiquei duas semanas bem mal, bem mal mesmo. E por um mês depois eu ainda tive sequelas. Então foi uma experiência bem ruim, bem ruim mesmo.” 
Luciene Rios, moradora de Goiânia
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Segundo Rosana Richtmann, Infectologista do Instituto Emílio Ribas, em entrevista à Jovem Pan, “Os cuidados em casa não são suficientes diante da proliferação do mosquito Aedes aegypti. A quantidade de chuvas e calor ainda propicia a sua reprodução. Ele precisa de calor para sugar o sangue e de água para depositar os ovos.” Richtmann enfatizou a importância de usar repelente e roupas para evitar a exposição da pele. 

Luciene também compartilhou os cuidados preventivos que adota: 

“Nós, eu e minha família, utilizamos repelentes para o corpo, aqueles de colocar na tomada, SPP ou outros. Evito abrir as janelas e portas em momentos que os pernilongos entram para dentro de casa. Estamos sempre tendo esse cuidado para prevenir a dengue. Retiro todos os recipientes dos vasos que podem acumular água no meu lote e no meu quintal.” 

A seguir, a imagem mostra os números de óbitos confirmados decorrentes da dengue. 

FONTE: CENTRO DE OPERAÇÃO DE EMERGÊNCIAS (COE) INFORME SEMANAL
El NIÑO, LA NIÑA E A PROLIFERAÇÃO DO AEDES AEGYPTI

Os fenômenos climáticos El Niño e La Niña exercem influência direta nos padrões climáticos do Brasil, o que por sua vez afeta a ecologia do mosquito Aedes aegypti, vetor da dengue. 

Estudos feito pelo Ministério da Saúde, sugerem que períodos de El Niño podem criar condições ideais para a reprodução do Aedes aegypti, aumentando a disponibilidade de locais propícios para a sua reprodução, como poças d’água estagnada. Por outro lado, o La Niña pode diminuir a incidência de chuvas, reduzindo os criadouros potenciais do mosquito. Essa interação entre fenômenos climáticos e a ecologia do vetor pode explicar, em parte, o aumento abrupto nos casos de dengue durante períodos de El Niño. 

Os mapas apresentam a distribuição do coeficiente de incidência de dengue nos anos 2023 e 2024, referente ao acumulado entre as semanas epidemiológicas 01 a 16. Em 2024, destacam-se o Distrito Federal e os estados de Minas Gerais, Acre, Amapá, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia, Paraná, Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Em 2023, os destaques foram o Espírito Santo, Rondônia, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás e Distrito Federal. 

SOLUÇÕES E PERSPECTIVAS

Diante das questões relacionadas aos fenômenos El Niño e La Niña, surgem iniciativas e estratégias para lidar com os seus efeitos e promover a sustentabilidade em face das flutuações climáticas. 

 Segundo o coordenador do Cimehgo, André Amorim: 

“A população precisa compreender que o planeta está passando por mudanças, o que resulta em variabilidade climática, levando a períodos de chuvas excessivas e, em outros momentos, de escassez. Portanto, é crucial que a população esteja consciente dessas situações. Planos de contingência são essenciais para lidar com essas condições. Esses planos, desenvolvidos em colaboração com a Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros de Goiás, são fundamentais para enfrentar tais desafios.” 

Atualmente, há uma crescente necessidade de conscientização por parte da população. Essa conscientização, em grande parte, é disseminada pelos meios de comunicação. No contexto de Goiás, o Cimehgo, vinculado à Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, desempenha um papel fundamental nesse processo. O setor de comunicação assume, portanto, uma relevância significativa ao transmitir essas informações, possibilitando que as pessoas desenvolvam uma cultura de conscientização e promovam mudanças nesse sentido. 

André ainda acrescentou sobre o futuro: 

“A análise atual aponta para um aumento das mudanças climáticas, sugerindo um cenário preocupante para o futuro. Observa-se uma tendência de extremos climáticos, com períodos prolongados de seca e estiagem em algumas regiões, contrastando com excessos de chuvas e neve em outras. Essa tendência acentuada para os extremos climáticos sugere um panorama potencialmente desastroso caso essa trajetória persista.” 
2 thoughts on “Os Impactos dos Efeitos Climáticos do El Niño e La Niña na Saúde e na Agricultura”

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