Geração Z: Mal acostumados, ou ciente de seus direitos?

Vista como preguiçosa e exigente, mas a única que promove a luta por igualdade e justiça social.
Tempo de leitura: 8 min
Marcos Carbone
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Nos últimos anos, a Geração Z, composta por aqueles nascidos entre os anos 90 e o início dos anos 2010, tem estado no centro de um debate cada vez mais intenso. Por um lado são considerados uma geração que nasceu com a tecnologia em um nível globalizado, cientes de seus deveres e direitos, e determinados a exigir mudanças sociais e políticas. Por outro, são frequentemente criticados pelo seu comportamento, tidos como impacientes, exigentes demais e “mal-acostumados”. 

Mas, afinal, qual dos lados é a verdade? Seria essa uma geração mais consciente, ou apenas uma que se tornou vítima das facilidades e comodidades que o mundo moderno proporciona?

Criança mexendo no celular. Foto: Centro de Referências em Educação Integral

Forjados na Era Digital

Enquanto as gerações anteriores testemunharam toda a transição para o digital, a Geração Z nunca conheceu um mundo sem essas tecnologias. Essa familiaridade com o ambiente digital deu a esses jovens uma vantagem em termos de acesso à informação, de modo que é cada vez mais fácil explorar novas e diversas perspectivas, assim como conseguem participar ativamente de debates e pautas globais desde cedo.

Segundo um estudo da empresa inglesa Deloitte 2023 divulgado pela Forbes Brasil, a geração Z, entretanto, criou um juízo de valor que não era presente em gerações anteriores, onde a busca por justiça social, diversidade e sustentabilidade tornou-se uma característica marcante.

 Movimentos como o Fridays for Future, liderado pela ativista ambiental Greta Thunberg, ou as manifestações em prol da igualdade racial, após o caso de George Floyd que ganharam força em 2020, demonstram a capacidade da Geração Z de mobilizar as redes sociais e exigir mudanças que realmente ocorrem no mundo real. Para muitos desses jovens, é uma questão de responsabilidade moral e ética: se você tem o poder de influenciar o futuro, mesmo que um pouco, tem também a obrigação de fazer.

313ª semana de protestos pelo clima, organizada por Greta Thunberg.

A linha tênue entre direito e privilégio

Entretanto, essa postura combativa e exigente é vista pela maioria das gerações anteriores como sinal de imaturidade, preguiça, ou falta de paciência. Por serem gerações, que cresceram sob condições socioeconômicas diferentes e com menor conectividade, tendem a ver a Geração Z como “mal-acostumada”. 

De acordo com Gorick Ng, consultor de carreira de Harvard, menos de 2% da Geração Z almeja o crescimento na carreira corporativa. O fato de que passar duas décadas em uma mesma empresa parece um compromisso excessivo, ou porque o ambiente corporativo já não exerce o mesmo apelo de antigamente. 

Para eles, os jovens, que nunca conheceram um mundo sem internet ou sem a facilidade de acesso a bens e serviços, confundem direitos com privilégios, querendo menos dias de trabalho na semana, remunerações especiais ao longo do mês, e outras coisas que não são necessariamente obrigatórias por lei. 

Eles argumentam que a Geração Z, por estar tão acostumada a ter suas demandas atendidas de forma rápida e eficiente, acaba se tornando menos tolerante a frustrações e situações repentinas. E, nesse contexto, as reivindicações dessa geração podem ser vistas mais como um reflexo de uma educação com muitas permissões e poucas regras do que de fato uma consciência social bem desenvolvida.

Mas a realidade de alguém que é da Geração Z, e trabalha para alguém que compactua com esse pensamento, não condiz com a visão que a geração anterior tende a ter. Júlio Cezar Balbino,de 21 anos, é funcionário em uma empresa de confecções com escala 6×1, e conta que muitas vezes o 6° dia útil na semana é totalmente dispensável, tornando a carga de trabalho sufocante:

“Chegar ao fim da semana e saber que só tenho um dia para descanso, e ainda preciso cumprir minhas obrigações em casa torna isso exaustivo. O fluxo de trabalho no sábado é quase irrelevante, e meu patrão geralmente não entrega muitas folgas, até mesmo em feriado nacional e regional. Isso desgasta muito o mental.”

Júlio Cezar Balbino
Protestos contra o fim da escala 6×1. Foto: AtivOz

O Impacto Socioeconômico de uma geração 

Mas seria justo reduzir a complexidade da Geração Z a um simples rótulo de “mal-acostumados”? A realidade é que essa geração enfrenta desafios diferentes dos que pessoas mais velhas costumavam passar. 

O estudante Ezequiel da Mata Aguiar, relata que constantemente é cobrado em diversas esferas, por conquistas irreais para sua idade, o que aumenta bastante sua autocobrança e consequentemente sua ansiedade:

“Mesmo com 17 anos, já penso que deveria ter algumas coisas que meus pais possuíam, por exemplo. Tanto nas relações sociais quanto em relação ao meu futuro, economicamente principalmente. Vou fazer o Enem no fim do ano, e não sei nem o que farei se não passar. não consigo por essa ideia na cabeça, ao mesmo tempo que não me sinto muito confiante para a prova.” 

Ezequiel da Mata Aguiar

Além de uma pressão social muito maior que a de antes para serem bem-sucedidos, os jovens estão crescendo em um mundo marcado por crises políticas e sociais, mudanças climáticas e até mesmo uma pandemia global.

Mapa de casos de COVID em março de 2020, publicado pela IDECOR.

 Em meio a tantas incertezas, a Geração Z encontrou nas mídias digitais uma ferramenta poderosa para navegar pelas adversidades, reivindicar seus direitos e tentar moldar um futuro diferente. Segundo a pesquisa “Truth About Generation Z”, realizada pelo grupo McCann, baseado em pilares como clima, sociedade, igualdade e representatividade, 66% dos jovens entre 18 e 24 anos afirmam que a sua geração tem a capacidade de atuar na resolução de problemas globais.

“Os jovens estão mais abertos às mudanças, seja de empresa, seja de carreira. Eles têm uma mentalidade mais aberta, estando dispostos a se desafiar, experimentar, conhecer novas áreas, sem ter que haver uma definição para a vida inteira” — explica Luciane Linden, Consultora de carreiras e professora da Universidade La Salle, em entrevista ao site Gaúcha ZH.

É importante lembrar que as mudanças sociais e econômicas pelas quais a sociedade passou nas últimas décadas tiveram um impacto profundo na forma como a Geração Z enxerga o mundo. A crescente desigualdade econômica, a precarização das condições de trabalho e a crise climática são questões que afetam diretamente a vida desses jovens e moldam suas percepções e atitudes, desde sua disposição para ir ao trabalho, quanto suas metas de crescimento e prospecção.

Nesse contexto, o desejo de mudança não é apenas uma questão de capricho, mas sim uma necessidade urgente. É essencial reconhecer a complexidade dessa discussão, pois os jovens estão, sem dúvida, mais conectados e informados do que qualquer geração anterior.

 Ao mesmo tempo, estão lidando com desafios globais que exigem novas maneiras de pensar e agir. Se, por um lado, a crítica de que são “mal-acostumados” pode ter algum fundo de verdade em certos contextos, por outro, seria um erro ignorar o impacto positivo de sua atuação na sociedade, a começar pelo ambiental.

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