O Fiasco do Golpe: A Resistência do Brasil e a Força da Democracia

"Infelizmente para o futuro espero um país mais apático"
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No dia 8 de janeiro de 2023, o Brasil vivenciou um dos episódios mais tensos e ameaçadores de sua história democrática. Esses dados marcaram uma tentativa violenta de abolição do estado democrático de direito, quando um grupo de extremistas, autodenominados “patriotas”, invadiu as instituições governamentais no coração da capital federal. O episódio foi um reflexo das profundas aberturas no país desde a eleição de Jair Bolsonaro (PL) em 2018, e de uma polarização política que ressoava desde os anos anteriores.

Fonte: site Metropoles

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi um fator crucial para a radicalização política do Brasil. Seu discurso de ódio, o ataque sistemático às instituições democráticas e sua postura negacionista em relação à ciência e à pandemia de COVID-19 transformaram seu governo em uma época de grandes divisões sociais. Com uma retórica agressiva e estratégias populistas, Bolsonaro (PL), conseguiu capitalizar sobre o desgaste dos escândalos de corrupção envolvendo o Partido dos Trabalhadores (PT), fazendo-se passar como o “redentor” do país. O seu governo também ficou marcado pelo desmonte de políticas públicas essenciais, ataques à imprensa e o empoderamento de uma base radical de apoio, que buscava, acima de tudo, fortalecer um autoritarismo brasileiro.

O impacto do governo Bolsonaro foi profundo. A democracia brasileira, que completou mais de 30 anos de redemocratização, enfrentou desafios inéditos. As imagens de depredação, os confrontos com a polícia e os ataques à democracia transmitidos ao vivo para o Brasil e o mundo inteiro serviram como um lembrete brutal de que a democracia no Brasil ainda estava longe de ser consolidada. Em nome de um “patriotismo” distorcido, os manifestantes tentaram romper o governo legítimo e reverter a vontade das urnas. Aquilo não foi apenas uma tentativa de golpe, mas um claro ataque às instituições que garantem os direitos em um estado democrático de direito.

Entretanto, a tentativa de subversão em Brasília foi uma demonstração indiscutível da força e da resiliência da democracia brasileira. O povo brasileiro, as forças armadas, a polícia e, sobretudo, as instituições democráticas resistiram. O Supremo Tribunal Federal (STF), a Câmara e o Senado, bem como as lideranças políticas de diversas correntes ideológicas, se uniram na defesa do estado democrático de direito. Além disso, as redes sociais e a mobilização cidadã desempenharam um papel decisivo ao denunciar as ações e chamar a atenção para a urgência da proteção das liberdades civis.

Fonte: Fellipe Sampaio/SCO/STF

Os ataques terroristas, como ficou conhecida essa invasão, não conseguiu desmantelar o Brasil democrático, mas deixou cicatrizes profundas que ainda precisam ser curadas. O evento gerou uma reflexão sobre as fragilidades da democracia brasileira.

O indiciamento de Jair Bolsonaro após os ataques terroristas de 8 de janeiro de 2023 representa um marco significativo no processo de responsabilização política e judicial do ex-presidente por seu envolvimento em instigar e fomentar uma cultura de desinformação, autoritarismo e violência política no Brasil. Além disso, as instituições democráticas mostram que em uma democracia existe lugar para tudo, exceto o desrespeito.

Convidamos o professor de Geografia e analista político, Lucas Santos, para fazer uma análise sobre a tentativa de golpe que ocorreu no Brasil em 2023 e sobre o indiciamento de Jair Bolsonaro.

YP: Como as declarações e ações do ex-presidente Jair Bolsonaro ajudaram a alimentar um ambiente propenso a esse tipo de tentativa de golpe?

Lucas Santos: Por mais que as falas do ex-presidente Bolsonaro nunca foram claras a respeito de um golpe de estado, o presente em questão sempre colocou em dúvidas ferramentas de manutenção da democracia brasileira, mesmo com todos os indícios mostrados pelo TSE, incluindo até mesmo o exército (mesmo que desnecessariamente).

YP: Qual foi o impacto da tentativa de golpe sobre a democracia brasileira e a confiança das pessoas no processo eleitoral?

Lucas Santos: Um grande reforço no levante da extrema-direita (fascismo) brasileira, ornando com a tendência global dessa face perversa da política. As prisões que se sucederam após o 08/01/2023 foI uma tentativa de suprimir esse movimento fascista em território nacional, porém, com novos desdobramentos dessas investigações federais o cenário para Jair M. Bolsonaro, fica mais enclausurado, mostrando formalmente a faceta golpista dessa trupe.

YP: Em que medida as redes sociais e a mobilização popular desempenharam um papel na proteção da democracia e na denúncia dos atos criminosos em Brasília?

Lucas Santos: Sabemos bem que os cargos importam mais que os atos, não deveria ser assim, muitos atos criminosos podem ser engavetados pois envolvem nomes e cargos importantes na política brasileira. As redes sociais sendo canal para os levantes populares são necessários para escancarar esse problemas, criando um ambiente de exposição com uma comunicação fácil e acessível, sendo imprescindível para a democracia e inclusiva para as famílias de trabalhadores brasileiros.

YP: A invasão das instituições no 8 de janeiro pode ser vista como um reflexo da polarização política crescente no Brasil? Como a sociedade pode superar essas divisões?

Lucas Santos: A verdadeira polarização é aquela entre os que querem o direito de existir num país democrático e os que querem o “direito de dar um golpe”? Não faz sentido encararmos essa situação de forma balanceada, “se você está sentado em um mesa com quatro nazistas, não são quatro nazistas, são cinco.” Podemos facilmente trocar para “fascistas” que funciona muito bem.

YP: Quais foram as respostas do Supremo Tribunal Federal (STF), do Congresso Nacional e da Presidência da República frente à tentativa de golpe?

Lucas Santos: A melhor possível: investigações sérias, com mais de 800 páginas, muito concreta e bem estabelecida. Teremos um longo caminho até vermos pessoas de alto escalão sendo presas, mas já temos o ex-presidente pedindo anistia, confirmando uma culpa, reforçando o quanto as investigações da PF foram muito bem sucedidas.

YP: O que a tentativa de golpe revela sobre os desafios que a democracia brasileira ainda enfrenta, apesar de já ter mais de 30 anos?

Lucas Santos: A democracia brasileira ainda enfrenta dois entrave; 1º – a relevância (desnecessária) da voz que o exército ainda tem. O papel do exército não está lotado nas cadeiras dos três poderes dos Estado, vide os 20 anos de trevas que o Brasil enfrentou. Me espanta terem pessoas que apelam para retornarmos à este momento sombrio para a real liberdade. 2º – O conservadorismo cristão servindo como impeditivo do crescimento libertário da criatividade social e econômico do nosso país. Trazendo um atrazo quase medieval inquisitório para um Brasil miscigenado e rico em diversas culturas, não fazendo o menor sentido.

YP: Como a força das instituições democráticas e a mobilização popular evitaram que o golpe fosse bem-sucedido?

Lucas Santos: A tentativa de golpe de estado de 2023 só não foi bem sucedida pois as forças militares do Brasil recuou. Óbvio que não é um mérito dessa instituição, mas uma tentativa de se livrar de um possível futuro fracasso dessa tentativa. Incoerentemente as forças militares sempre estão envoltos em auto-golpe ou estão recheados de senhores de idade saudosos de um período onde eram privilegiados (spoillers: ainda são). Portanto a força das instituições democráticas estão deixando a desejar, passando pano e livrando a barra de muitos parlamentares eleitos que estão pedindo a secessão do estado democrático de direito.

YP: O que pode ser feito para evitar que novos episódios de extremismo político e ataques à democracia ocorram no futuro?

Lucas Santos: Punho firme nas ações das instituições democráticas, baseados sempre na constituição brasileira de 1988. Mas infelizmente não é que veremos nos próximos anos.

YP: Qual a importância de a sociedade brasileira se engajar na defesa das liberdades democráticas, especialmente diante de ameaças como as observadas no 8 de janeiro?

Lucas Santos: É a efetivação do que é a democracia, participação popular nas atividades políticas públicas nacional. O que me incomoda como analista, é como a população pode ser manipulada com vídeos “cortes” para suas redes sociais, sendo mais palatáveis e moralistas (sendo que muitos não seguem o que prega).

YP: A tentativa de golpe deixou alguma lição importante para as futuras gerações de brasileiros sobre a fragilidade e a importância da democracia?

Lucas Santos: Vejo nos olhos dos adolescentes o total desinteresse nesse tema, não só essa violência nos discursos moralistas mas também a facilidade no acesso à informação de vários lados distintos, as exigências em estar em um lado, se posicionando obrigatoriamente, trouxe um peso nas costas dos adolescentes, infelizmente para o futuro espero um país mais apático.

YP: Como o episódio de 8 de janeiro afetou a imagem do Brasil no cenário internacional?

Lucas Santos: O cenário político global é esta instabilidade vulgo “polarizada”, o Brasil é mais um deste palco. O direito a fala trouxe voz até para neo-nazista, no mundo incluindo o Brasil, essa liberdade de fala é misturada com a “síndrome protagonista” e a vontade ganhar cliques “likes” e comentários só acentuou a dominação do discurso de ódio e uma adesão maior de incautos.

YP: Quais medidas podem ser adotadas para garantir que ações antidemocráticas como as do ano passado não se repitam no Brasil?

Lucas Santos: Ações antidemocráticas é um sintoma de um sociedade doente, como um órgão lutando contra, matando o corpo a que pertence. Isto se combate privilegiando ações dentro das escolas desde o fundamental 1 até o ensino médio, acentuando o quão desastroso foi as escolhas políticas de países que entraram na autocracia, no golpismo.

YP: O que é necessário para restaurar a confiança das pessoas nas instituições democráticas, considerando o impacto que o golpe falhado teve na sociedade brasileira?

Lucas Santos: Reforçando as benesses do pensamento livre e democrático acima de tudo. Reforçando a educação crítica e intelectual não só da elite burguesa mais também, principalmente, das classes periféricas da sociedade.

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