‘O Brutalista’: A falsa terra de oportunidades é realmente brutal

As 10 indicações ao Oscar para "O Brutalista" é justificada por um épico memorável.
fev 24, 2025 , ,
Tempo de leitura: 4 min

O Brutalista ganhou um presente dos críticos de cinema ao ser categorizado como épico. O vínculo ao gênero literário de obras longas, feitos heroicos e personagens divididos entre honra e responsabilidade justificam as 3 horas e meia do filme que acompanha László Tóth,  um arquiteto húngaro judeu, interpretado por Adrien Brody, que sobreviveu ao holocausto, e imigrou para os Estados Unidos na recente pós-Segunda Guerra Mundial. 

Brady Corbet, que assina a direção e compartilha o roteiro com Mona Fastvold, sua esposa, parece ter gastado toda sua cota de genialidade no papel de diretor nos 15 primeiros minutos de filme – mas ele soube canalizar a energia onde importava. Uma das primeiras cenas mostra o arquiteto chegando aos EUA em uma bagunça sem fim. Com uma câmera fechada, enquadramentos apertados e dançantes e uma barulheira inextinguível, László chega a Nova York e vê a estátua da liberdade de cabeça para baixo. Durante todo o filme, essa imagem volta à tona, pois os Estados Unidos não é a terra de oportunidades e liberdade que se espera. 

Passada essa cena, recolhe-se os queixos caídos e começamos a ver um Adrien Brody brilhar no que é, sem sombra de dúvidas, o melhor papel da sua carreira. László é recepcionado na casa de seu primo Atilla, interpretado com muita energia por Alessandro Nivola, que abriu uma loja de móveis, mudou seu sobrenome e se converteu ao catolicismo, com a intenção de que as oportunidades do capitalismo finalmente batessem à sua porta. 

László, que já era um arquiteto renomado em seu país, tem a oportunidade de desenhar um centro comunitário financiado por um milionário que se apresenta como amante das artes. Harrison Van Buren, mais uma interpretação curiosa, que gerou uma indicação ao Oscar para Guy Pearce, é uma daquelas pessoas afogadas em sua própria mediocridade que acreditam que dinheiro é suficiente para apagar a história. 

É nesse projeto que László se torna o brutalista. O brutalismo é um estilo arquitetônico que se resume pelo uso predominante do concreto bruto. Alguns críticos de arquitetura dizem que o brutalismo é frio, sem sentimento e usado apenas como uma opção barata para reconstruir a Europa destruída pela Segunda Guerra Mundial. E é justamente isso que László é: um homem destruído pelo nazifascismo. 

A construção da obra brutalista é a reconstrução de László, um homem em ruínas que se recusa a esquecer de onde veio, mesmo encontrando de frente norte-americanos que usam ingenuidade como máscara da ignorância sobre os acontecimentos globais. O arquiteto impede que seus vínculos com seu passado, como a Sinagoga, se encontrem com sua versão estadunidense.

Impedir o encontro direto com seu passado se torna quase impossível quando sua esposa, Erzsébet Tóth, chega aos Estados Unidos após ficar presa em questões burocráticas na Europa. Agora, László encara sua esposa e se lembra de uma vida que já não existe mais, e precisa sustentar sua melancolia com um projeto que se torna um feito heroico, e não mais um trabalho. Tanto que ele abre mão da sua parte para poder financiar exageros em nome da beleza. 

Estátua da Liberdade em “O Brutalista”. Foto: Divulgação A24

São três horas e meia do show de Adrien Brody. A franqueza, fraqueza e força preenchem o espaço com enquadramentos angustiados, que deixam faltas e lacunas na tela e na história. A trilha sonora, assinada por Daniel Blumberg é sóbria, mas distorcida, nos deixando com um sentido constante de luto por um homem que tenta se manter vivo longe de suas raízes. 

Temos um Guy Pearce, que interpreta Harrison, que invocou a personalidade de patrício de barbas finas que não tem habilidades próprias, mas dinheiro suficiente para roubar para si a arte alheia, que nos lembra muito Daniel Day-Lewis em Sangue Negro. E temos uma Felicity Jones, também indicada ao Oscar pelo papel da Erzsébet, em um papel sóbrio, contido, mas cheio de dúvidas. 

Harrison parece tentar, de propósito, fazer com que o projeto do centro comunitário se torne o pesadelo de László, o desconectando com o seu antepassado húngaro: ele exige uma capela no meio do centro, por exemplo. László responde com brutalismo. Frio, duro, perfeccionismo e fracasso capitalista. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *