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O despertador toca às cinco e meia. Primeiro aviso do dia: levanta! Abro os olhos, mas o corpo demora a obedecer. Dormi pouco de novo. Mas quem se importa? Lá vou eu, de volta às engrenagens. Ligo a luz e ao pé da cama encontro minha mochila e, antes de mais nada, confiro se meu Passe Livre está no bolso da frente. Deus me livre chegar na catraca do ônibus e perceber que o esqueci em casa. Depois de encontrá-lo pego minha toalha e vou tomar meu banho.
O gosto do café preto e adoçado, ainda está forte na garganta enquanto visto a roupa para mais um dia. No ponto de ônibus, a fila se arrasta. Quando o coletivo chega, a multidão se aperta como se ali coubesse mais um pedaço de esperança. Todos ali têm pressa. Pressa para não se atrasar, pressa para chegar a algum lugar, pressa para ser alguém. Eu tenho pressa para a chegada do meu último dia na linha 105 sentido Câmpus Samambaia.
Pelo vidro sujo, eu vejo muitos carros. Olho para o relógio e ainda não são nem sete horas da manhã. Eu me pergunto: “Quantos aqui tiveram boas horas de sono essa noite?”. Para mim é um cenário distante, mas depois de tanto tempo: “Ah, meio que tanto faz!”, penso. Nessa correria entre trabalho e faculdade, já considero um luxo se consigo ter boas horas acordado.
Ainda no ônibus abro o Instagram. Um colega postou fotos de uma viagem para a Europa. Outro exibe o apartamento recém-comprado. Uma influenciadora sorri segurando um café artesanal num bairro nobre. O meu reflexo se mostra na tela apagada. De repente a tela brilha novamente, notificação do banco. E à minha mente vem: “Droga, minha fatura ainda não virou”. Me sinto pequeno. Menos. Como se minha vida fosse um rascunho mal feito enquanto a dos outros já fosse um quadro pronto e emoldurado.
Oito horas da manhã e nossa como estou cansado! Na faculdade, a sala está cheia, mas estou sempre me sentindo sozinho. Jovem negro em um curso onde poucos se parecem comigo. Sei que aqui ninguém está para brincadeira. Todo mundo tem pressa. Mas a minha corrida é diferente, não sei se você me entende…
O trabalho é um misto de repetição e esgotamento. Atendimento, prazos apertados, cobrança por eficiência. Me sinto desvalorizado. Não é louco pensar que colocam preço no tempo que a gente possui aqui na Terra? E para mim é ainda mais louco porque esse valor é baixo, muito baixo. “Nosso bem mais precioso é o tempo”, porém eu vejo que o tempo de alguns é mais precioso que de outros.
Chega ao fim, mais um dia. No caminho de volta, o ônibus está tão lotado quanto pela manhã. Fecho os olhos e me permito sonhar, mesmo sabendo que amanhã tudo recomeça. Amanhã uma nova entrega, novas possibilidades mas, infelizmente, a mesma engrenagem. E nela você tem que produzir. Produza ou padeça! A ideia sempre foi essa.