Comunicar ou impressionar?

A linguagem simples como alternativa para um Jornalismo acessível
Tempo de leitura: 3 min
Gabriel Antonelly
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Em uma cidade qualquer, havia um menino chamado Lorenzo. Filho de um professor e de uma escritora, cresceu cercado por livros, boa música e cinema cult. Desde pequeno, destacava-se pela facilidade com as palavras. Lia Guimarães Rosa antes dos 15, ouvia Caetano Veloso e discutia cinema Neorrealista com naturalidade.

Quando chegou a hora de escolher uma profissão, não teve dúvidas: Jornalismo. Acreditava que mudaria o mundo com sua escrita afiada, suas análises profundas e um vocabulário impecável. Tirou mais de 900 na redação do Enem, passou em uma universidade federal e anunciou o feito nas redes sociais com legendas elaboradas e emojis estrategicamente escolhidos. Seus pais viam nele a promessa de um intelectual.

Nos primeiros semestres, Lorenzo se sentia em casa. Os debates sobre comunicação, política e cultura alimentavam sua vaidade. Escrevia para um público seleto, com palavras complexas e referências que poucos compreendiam. Impressionar era mais importante do que ser entendido.

Mas ao entrar no mercado de trabalho, enfrentou um choque. As redações estavam encolhendo, os salários eram baixos e, nas redes sociais, conteúdos simples atraíam mais atenção do que seus textos cuidadosamente construídos. Matérias longas passavam despercebidas, enquanto vídeos curtos e mensagens diretas viralizavam.

Lorenzo não entendia. Como um adolescente com um celular e um vocabulário limitado poderia atrair mais público do que ele, um jornalista formado e preparado? Culpava exclusivamente a decadência do jornalismo, a não obrigatoriedade do diploma e a ignorância do público. O problema com certeza não estava nele.

Até que, um dia, algo mudou. Durante uma pauta de rua, entrevistou Dona Cida, que saía de um hospital público em greve. Ao ler sua prévia de reportagem, ela perguntou:

— Meu filho, o que quer dizer isso aqui? “Deflagração de um movimento paredista”. Quer dizer que tá tudo parado? O hospital fechou?

Lorenzo congelou. A resposta estava ali, clara e direta, enquanto ele complicava o óbvio. Nesse instante, percebeu que sua suposta superioridade intelectual era uma cortina que ocultava a sua própria ignorância. Comunicar não era exibir erudição, mas promover entendimento.

Daquele dia em diante, reformulou sua escrita. Abandonou os floreios desnecessários e adotou a linguagem simples, não como superficialidade, mas como inclusão. Seus textos se tornaram acessíveis sem perder a precisão, e ele começou a conquistar o público que antes desprezava.

Lorenzo entendeu que a verdadeira inteligência está em contribuir para ser entendido. Ao deixar a soberba de lado, reencontrou o propósito que o levou ao jornalismo: comunicar para mudar o mundo, não para alimentar o próprio ego. Talvez esse seja um dos caminhos para o jornalismo brasileiro reconquistar a sua credibilidade com a audiência: menos pedantismo, mais clareza. O público não é bobo. E quando falamos de igual para igual, ganhamos não apenas leitores, mas também confiança.

Escrever de forma simples não é escrever de forma simplória. É ter humildade para democratizar a informação. Um bom jornalista não escreve para exibir seu conhecimento, mas para garantir que a mensagem chegue a todos de forma clara e objetiva.

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