Tempo de leitura: 5 min
(Divulgação/Revista Exibidor)

Acordei essa semana com uma vontade enorme de ir ao cinema. Vi na internet que essa quinta-feira iria lançar um filme de quase 3 horas sobre um soldado japonês da Segunda Guerra que ficou em uma floresta nas Filipinas por 30 anos, continuando a lutar por seu país até 1974, se recusando a acreditar no fim do conflito. Interessado, visitei o site de venda de ingressos, mas não encontrei nada a respeito do filme na minha cidade. Levemente desanimado, e indisposto a dar uma de Jack Sparrow e recorrer à pirataria, saí para dar uma chance ao que os grandes cinemas multiplex tinham a oferecer.

Ao chegar no cinema (depois de levar bastante tempo para encontrar uma bendita vaga no estacionamento do shopping), me deparei com uma seleção bem peculiar de filmes: tínhamos o habitual filme de super-heróis; uma sequência daquele anime super famoso; dois filmes de ação genéricos com elencos estelares; a comédia nacional; aquele blockbuster que estreou 3 meses atrás e continua em cartaz; o novo filme daquele diretor vencedor do Oscar; e, como a cereja do bolo, uma animação que aborda o ponto de vista dos bichos de estimação dos super-heróis. Escolhi o único filme que realmente me interessava: o do diretor “Oscarizado”.

Fui à bilheteria para comprar o ingresso. O atendente, mal olhando diretamente para mim, perguntou que filme eu queria ver. Falei o nome do filme, apontando para o cartaz. “Você quer a sessão em 2D, 3D, XD ou Prime?”, ele perguntou. “A mais simples”, respondi. Entediado, o atendente escolheu a sessão 2D, e me mostrou o mapa de assentos. A sala era enorme, muitos dos assentos já estavam ocupados e só tinha um lugar na fileira do fundo, o qual eu peguei. “Inteira ou meia?”, ele perguntou. “Meia”, respondi, pegando o meu comprovante de matrícula da faculdade. Aí veio a primeira reviravolta do meu arco narrativo: “Deu 25 reais, moço”, informou o atendente no final da transação. Desde quando o cinema começou a ficar tão caro?

Lembro de quando ia com meu avô a um cinema de rua antigo da cidade, quando as coisas eram mais simples: menos salas, sem mapa de assentos, ingressos baratos. As sessões lotavam. As pessoas até sentavam no corredor para ver o filme. A criança que eu era na época vibrava de emoção com meu saquinho de pipoca de 5 reais na mão quando as luzes da sala se apagavam e o brilho do projetor apontava para a tela como um holofote que iluminava sonhos. E quem estava animado de verdade ficava na sala para ver o próximo filme que iria passar. 

Afinal, comprei o ingresso, e, disposto a resgatar algumas destas memórias, fui à bombonière para comprar uma pipoca. Na época do cinema de rua, tinha só dois tipos de pipoca (salgada e doce) em um único tamanho. Aqui, tinha pipoca salgada, pipoca de chocolate, pipoca de caramelo, pipoca de banana (em homenagem àquela animação que virou sucesso no TikTok) e pipoca com um biscoito que eu gosto muito. Curioso para saber o resultado da combinação, pedi a última em tamanho médio, certo de que não seria tão caro quanto o ingresso. E aí veio a segunda reviravolta da trama: “Deu 34 reais, moço”, o atendente disse com um sorriso no rosto. Quase deixei o cartão cair. Engolindo em seco, comprei a pipoca.

Então, lá fui eu, pipoca na mão, para a sala indicada pelo atendente que validou meu ingresso. Chegando na sala, as luzes ainda estavam acesas. Os trailers começaram a passar. Um filme de terror qualquer. Comerciais de banco, seguros de saúde e até de uma funerária. E aí, chegou a hora de sonhar. De parar tudo aquilo que estava fazendo e aproveitar. O filme acabou sendo um verdadeiro espetáculo. Uma narrativa tensa, daquelas que dá até medo de comer pipoca no meio da cena pra não quebrar a tensão, fortalecida por atuações competentes e uma proeza técnica impecável. E debaixo de toda essa grandeza, há uma mensagem, que reforçava tudo o que pensava sobre o ato de ir ao cinema na atualidade. A elitização do fazer cinematográfico, o caráter atrativo do espetáculo, o preço cada vez mais caro para fazer e, consequentemente, vender os filmes através dos ingressos. Era como se o diretor tivesse lido meus pensamentos. Foi algo inestimável.

Ao sair da sala, sentimentos mistos me passaram pela cabeça. Felicidade, por ter matado a vontade de assistir um filme na telona e ter resgatado algumas das memórias de infância; e frustração, por ter gasto tanto dinheiro para fazer isso. Agora, só precisava pagar o estacionamento e voltar para casa. E aí, veio ela. A cena da revelação do assassino no filme de terror; a cena do aeroporto na comédia romântica; a grande luta final no filme de super-heróis. O clímax do terceiro ato, tempo perfeito para uma última reviravolta de cair o queixo. Deu 20 reais de estacionamento. Dessa vez, não teve jeito. Paguei o estacionamento, e os créditos começaram a rolar no meu caminho para casa. Mas quem disse que o filme acabou?

Ao chegar em casa, liguei meu computador para baixar um filme que passou pela minha cabeça enquanto estava no cinema, e me veio a surpresa na cena pós-créditos: o filme que tinha acabado de ver estava disponível para baixar na Internet. E foi aí que eu percebi algo que poderia ter evitado toda essa frustração: eu deveria ter dado uma de Jack Sparrow.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *