Dono de supermercado fala como a crise afeta os comércios da periferia da Capital

Funcionário por 25 anos e dono do seu próprio negócio há um ano, Péricles fala da dificuldade de manter um empreendimento com a crise financeira atual do país.
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Bianca Nascimento

Péricles Gonçalves Cavalcante, um homem que por vinte e cinco anos foi funcionário do antigo Supermercado Campos, que teve sua fundação em 1992, resolveu se arriscar e comprar o empreendimento do antigo patrão, para se transformar no agora Supermercado Bueno. Dono do comércio há um ano no bairro Jardim Guanabara, ele fala como está sendo a experiência de conseguir se manter “de pé” em um bairro de periferia com a crise financeira, aumento da fome e aumento nos valores dos produtos.

Bianca Nascimento: O supermercado funciona no bairro há quanto tempo?

Péricles Gonçalves: Esse supermercado aqui ele já existe há mais ou menos trinta anos, só que eu estou à frente há 1 ano. Eu era funcionário aqui, faz 25 anos que trabalho aqui e de um ano atrás “pra cá” eu assumi como proprietário.

Como surgiu a ideia de ter um supermercado? Surgiu quando o senhor trabalhou com ele ou já era algo que tinha em mente há muito tempo?

Não, não, eu não tinha planos de ter o negócio, mas aí surgiu uma oportunidade e como eu trabalhava muito tempo com meu ex-patrão aqui, ele facilitou muito as coisas para mim, foi coisa mesmo de pai pra filho e como era uma chance que eu não teria outra, então eu não deixei escapar e hoje eu estou à frente [do supermercado].

Como o senhor lida com a concorrência na formação dos preços dos produtos?

A concorrência é muito acirrada aqui no setor, tem muito comércio, muito supermercado, então está sempre todo mundo fazendo promoção e coisa e tal, então a gente tem que correr atrás de preço. Eu tenho bastante contato com atacados e outros supermercados, então quando surge um preço bom de uma determinada mercadoria eu vou atrás, compro em grandes quantidades e faço promoção aqui. Tenho que estar sempre movimentando e sempre por dentro dos preços da região.

Como ser competitivo num mercado tão acirrado?

O segredo é procurar o melhor preço. A gente fica sempre ligado se certo produto vai faltar, se certo produto vai ter alta para a gente se antecipar a essas oscilações de preço, para você conseguir fazer [o melhor preço].

Como o supermercado lidou com a crise na pandemia? Ela foi boa ou ruim para as vendas?

 Eu lembro que quando começou a pandemia eu era funcionário ainda, foi um período bem difícil e complicado, porque teve muito desemprego, teve muita gente que perdeu o poder de compra, então as vendas caíram muito, principalmente com o isolamento, que foi uma coisa assim… surreal. Você não via ninguém na rua, todo mundo com medo de sair de casa, as vendas caíram bastante, preço de algumas coisas subiram muito também, então foi um efeito cascata, foi bem difícil.

Com os casos de desemprego no Brasil, cada vez mais pessoas vem ficando em casa, consequentemente menos dinheiro no bolso, tudo isso em um pós-pandemia que gerou uma crise econômica, como o senhor lidou e lida com isso até hoje?

[No trecho a seguir, Péricles se emociona ao contar a história de uma senhora que por muitos anos frequenta seu supermercado.]

Posso te citar o caso de uma cliente de muitos anos, ela comprava frequentemente, tinha o emprego dela e comprava da gente aqui para pagar por mês, no antigo “caderninho”. No meio da pandemia ela perdeu o emprego e já era uma senhora de idade, ou seja, não teria como conseguir arrumar um outro emprego em lugar nenhum. Ela passou a pagar a gente bem parcelado, mas o consumo dela continuava o mesmo, e como a gente aqui tem um atendimento mais humanizado, por ser um mercado já de muitos anos, de bairro e conhecer bem as pessoas, a gente se viu em uma situação bem difícil porque a gente também não poderia dar a nossa mercadoria para ajudar mas ao mesmo tempo a gente tem aquele olhar mais humano de ver a dificuldade da pessoa, então a inadimplência nesse período foi bem elevado e a gente já estava perdendo venda por causa de pessoas que já estavam consumindo menos, então nossa solução foi tentar cortar gastos, tentar diminuir conta de água, luz, a gente teve que dispensar dois funcionários de um quadro de quatro funcionários, para poder honrar com os compromissos.

Qual a maior diferença que o senhor vê entre a época que era funcionário, e agora como patrão?

Quando eu era funcionário a responsabilidade era muito menor, mesmo eu estando a frente em muitas questões aqui dentro porque meu ex patrão pelo tempo que eu já estava aqui, ele via que eu já era de confiança, deixava muita coisa por minha conta, só que a gente não tem muita noção, porque quando a gente está mexendo com o que não é seu parece que a responsabilidade é menor, só que quando eu assumi a responsabilidade, toda da parte administrativa que era meu ex-patrão que cuidava, lidar com as despesas e pagamento de funcionário, pagamento de impostos, contabilidade da empresa, tudo era com ele, a outra parte eu cuidava, só que agora não, agora eu tenho que cuidar de tudo, então assim, o peso fica muito maior, a diferença mesmo é essa, a gente começa a ver as coisas com outros olhos.

Quais as maiores dificuldades que o senhor vem enfrentando?

Hoje em dia a maior dificuldade é nessa parte mesmo de preço. A gente precisa ter preço, eu acho que o segredo de um comércio é você ter preço que atraia o cliente porque o cliente vai atrás de preço, então a gente sempre está atrás de fazer um bom negócio com o fornecedor para poder conseguir um melhor preço.

Consegue gerar lucro hoje?

Eu peguei o negócio bem defasado do meu antigo patrão, tive que investir uma quantidade de dinheiro aqui para repor mercadoria, contratar um funcionário, fazer divulgação, aí eu consegui melhorar e trazer muitos clientes que tinham parado de comprar, então teve um aumento considerável nas compras e, com o aumento das vendas, com essas pessoas que consegui trazer de volta, gera um lucro. Não é o desejado, mas conseguiu [sic] melhorar.

Existe algum tipo de promoção que fazem para atrair mais clientes?

Geralmente faço promoção aos finais de semana, sexta, sábado e domingo, eu lanço o folheto com as promoções [sua esposa o ajuda com essa parte] e faço.

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