Alterações Climáticas : Goiás bate recordes de temperatura em 2023

Na capital a temperatura chegou aos 39,7°C e no interior do Estado os termômetros alcançaram os 44,3° C, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia
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Foto: Naiane Caroline (arquivo pessoal)

Goiás vem enfrentando o segundo maior ano com mais dias com onda de calor dos últimos 30 anos, perdendo apenas para 2015. Para ser considerada uma onda de calor, é preciso que as temperaturas fiquem elevadas por ao menos 6 dias seguidos acima do esperado, e somente na capital foram 60 dias de onda de calor, de acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

O mês de setembro foi considerado o segundo mais quente dos últimos 86 anos, o ápice do calor para o mês foi em 25 de setembro, com os termômetros atingindo 39,3°C na capital e 41,3ºC em Itumbiara, sendo considerada pelo Inmet a 6º cidade mais quente do Brasil. Em novembro tivemos recordes seguidos de dias mais quentes da história para o mês, no dia 15 foi medido 39,4°C em Goiânia e 41,9°C em Aragarças, e no dia 16 os termômetros marcaram 39,7°C na capital. 

As temperaturas sem precedentes vêm sendo registradas pelo Inmet em todo o território nacional. Aragarças chegou a ser considerada a cidade mais quente da história do Brasil em 19 de outubro,  quando o calor chegou aos 44,3ºC, mas o recorde foi superado 30 dias depois: no dia 19 de novembro os termômetros registraram 44,8°C na cidade de Araçuai, em Minas Gerais. Cuiabá superou a marca dos 40°C em 35 dias no segundo semestre do ano, e somente em novembro 10 estados superaram a marca dos 40°C. No Rio de Janeiro a sensação térmica chegou a 52,7° C às 8h da manhã. 

A atual onda de calor não configura um fenômeno isolado no Brasil, e 2023 está a caminho de se tornar o ano mais quente já registrado. Segundo alerta divulgado pelo Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus em outubro, a temperatura média global estava 0,52°C acima da média normal. A temperatura global de janeiro a setembro foi 1,4ºC mais alta do que a média pré-industrial (dos anos 1850 a 1900), e somente o mês de setembro foi cerca de 1,75°C mais quente do que a média de setembro do período pré-industrial. No dia 6 de julho a temperatura média global atingiu 17,2°C sendo considerado o dia mais quente do planeta. 

O que explica este cenário?

Os especialistas e os relatórios publicados apontam que a onda de calor atual é resultado de uma série de fenômenos e mudanças que, juntas, fazem a temperatura subir. As mudanças climáticas, somadas aos efeitos do fenômeno El Niño, do Aquecimento Global e as ações do homem, têm causado as temperaturas recordes. 

O Geógrafo, diretor geral do Centro de Excelência em Estudos, Monitoramento e Previsões Ambientais do Cerrado (CEMPA-Cerrado) e vice-coordenador do Laboratório de Processamento de Imagens e Geoprocessamento (LAPIG) da Universidade Federal de Goiás(UFG) Profº Dr. Manuel Ferreira, explica que as altas temperaturas e baixa quantidade de chuvas vêm sendo observadas no estado de Goiás e no bioma cerrado como um todo já há alguns anos. Manuel diz ainda, que as mudanças climáticas com aumento da temperatura Global quando observadas a fundo têm seus extremos de temperatura localmente, que é o que temos visto no Estado nos últimos meses. 

Segundo Manuel “este ano podemos atribuir parte dessas mudanças a um efeito natural que é o El Niño, esse fenômeno que é compreendido pelo aumento da temperatura no Oceano Pacifico, ele causa uma seca na região Norte, que é uma seca pronunciada que vemos agora na Amazônia, ele causa mais chuvas na região Sul e na região Central pode ocorrer secas também mais prolongadas, pode ocorrer modificações”, porém esses efeitos irão depender das condições climáticas normais nas regiões, como massas de ar quente e frentes frias. 

De acordo com o Inmet, pôde-se observar em Goiás nesse período o tempo predominantemente seco e o aumento da insolação e da pressão atmosférica entre os níveis médios e a superfície. Tais condições foram completamente favoráveis aos efeitos do fenômeno El Ninõ e persistência da onda de calor na região.

As mudanças ocasionadas pelos fenômenos naturais vêm sendo intensificadas pelas mudanças ocasionadas pelo homem na superfície terrestre. O professor Manuel explica que “como alteramos bastante a área agrícola, convertemos a vegetação nativa em grande proporção para atividades de agricultura e pecuária, nós mudamos essa relação de evapotranspiração, que é a água que volta para a atmosfera, e isso provavelmente, é um dos principais fatores para estarmos sentindo esse calor extremo neste ano de El Niño.”

Outro fator comprovadamente associado é a excessiva emissão de gases de efeito estufa, como por exemplo o Dióxido de Carbono (CO2) e o Metano(CH4). Sabemos que o dióxido de carbono é responsável pela retenção de calor na atmosfera, o que é naturalmente essencial para a vida humana. Porém, Manuel explica que têm-se observado uma emissão em excesso de CO2 através, principalmente, do petróleo, mais precisamente a gasolina e o diesel, no Brasil como um todo, e consequentemente gerado maior bloqueio na liberação de calor para o espaço, aumentando assim a temperatura na atmosfera. Já o Metano, que tem uma capacidade de retenção de calor 6 vezes maior que uma molécula de CO2, na região centro-oeste, é proveniente em grande escala da criação de bovinos. O processo digestivo dos animais libera o gás metano no ambiente, e devido ao desmatamento para pastagem, não há um equilíbrio entre a evapotranspiração e a emissão desses gases, ou seja, têm-se retornado para a atmosfera mais gases de efeito estufa do que água. 

O que podemos esperar daqui para frente? 

Segundo o Inmet, a partir de dezembro as chuvas passarão a ser mais regulares e acima da média, porém as temperaturas permanecerão elevadas. A tendência é que essa condição climática se estenda até fevereiro de 2024 em toda a faixa central do país.

A Organização Meteorológica Mundial (OMM) afirmou que o fenômeno El Ninõ deverá durar até, pelo menos, abril de 2024, e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) diz que o próximo verão será marcado pelo auge do El Ninõ, estando entre os 3 mais quentes da história. O Governo Federal aponta que diante das altas chances deste fenômeno continuar a impactar e agravar as alterações climáticas nos próximos meses, são previstas que sigamos com  temperaturas acima da média, chuvas acima da média, mais secas, maiores possibilidades de incêndio e maiores riscos de desmatamento. O geógrafo Manuel afirma que, no bioma cerrado essas condições serão “inevitáveis pelas mudanças antrópicas que ocasionamos no ambiente”.

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