“Estamos em um caminho que não tem volta,  as tecnologias não são ruins. Muito pelo contrário, veio para facilitar as nossas vidas”: Raquel fala sobre o vício em tecnologias e como pode afetar a saúde mental

Raquel Maracaípe é psicóloga, mestre e doutora em psicologia, atualmente docente da Universidade Federal de Jataí (UFJ), explica a importância de reconhecer o vício em tecnologias e ter uma base de apoio para a saúde mental
jan 12, 2024 ,
Tempo de leitura: 6 min

O acesso constante a dispositivos digitais e o domínio das redes sociais têm contribuído para um aumento nos casos de dependência tecnológica, que pode levar à exaustão mental.

A dependência tecnológica é especialmente preocupante entre os jovens, impactando o desenvolvimento emocional e social. A educação sobre o uso saudável da tecnologia é crucial para diminuir esses efeitos, estabelecer limites no tempo de tela e promover atividades offline pode ser estratégias importantes para preservar a saúde mental.

Em entrevista ao LabNotícias, Raquel ressalta que estamos num caminho que não tem volta,  as tecnologias não são ruins. Muito pelo contrário, veio para facilitar as nossas vidas. Com a economia de tempo e agilidade. Então, a tecnologia veio para agregar, para somar, mas existe, como tudo na vida, riscos. Tudo em excesso não faz bem. E deve-se usar toda essa mídia, essas tecnologias a favor do desenvolvimento, mas o que se  percebe é exatamente na contramão disso, o uso excessivo, o impacto negativo do uso dessas tecnologias na saúde mental, emocional, pode afetar  todos nós, mas principalmente crianças e adolescentes.

Lab Notícias: Quem são os mais afetados com o hiperconsumo de vídeos rápidos nas redes sociais?

Todos nós, de certa forma, somos afetados, mas sem sombra de dúvida, os mais afetados, no meu ponto de vista, são crianças e adolescentes, exatamente por essa sociedade do consumo, da rapidez. As crianças e adolescentes querem tudo para já, não sabem esperar, e a gente vê o aumento da ansiedade, da depressão, que é uma coisa que a gente pode falar um pouco mais para frente, o aumento de número de casos de depressão, infelizmente, de número de suicídios, tentativa de auto extermínio entre crianças e adolescentes, tudo isso vem em um combo de ansiedade, depressão, claro que não é queimar as bruxas, a gente não pode colocar a culpa,  ou responsabilizar apenas isso, mas esse modo de vida acelerado, esse modo de vida, como você colocou aqui, o hiperconsumo, vídeos rápidos, isso tudo traz uma urgência, acelera essa aceleração das coisas, e será que isso não causa um impacto? O que é ansiedade? É você sofrer por antecipação, você querer tudo a pronto, você querer tudo aqui e agora, então as crianças hoje não sabem esperar, o não, o agora não, depois o pai e a mãe dão,  as crianças não entendem o agora não, querem que seus desejos e vontades sejam satisfeitos, esses desejos e vontades o mais rápido possível, então será que não existe uma ligação com essa questão dessa velocidade da informação, do consumo excessivo, como você colocou aqui, desses vídeos rápidos?

Lab Notícias: O que pode ser desenvolvido com esse consumo?

Como eu disse, principalmente, a questão da depressão e da ansiedade, que pode, claro que nem todas as crianças e adolescentes terão isso, serão afetadas, mas nós sabemos por estudos, outros estudos, pesquisadores e estudiosos, não só da psicologia, mas em várias áreas do conhecimento, que existe sim uma relação.

Lab Notícias: Onde isso pode ser evitado?

Na família, na escola, enfim, dosar esse consumo, de novo, não é proibir, nós estamos num caminho sem volta, é usar isso a favor da aprendizagem, do desenvolvimento, não dá pra tirar as telas do celular, videogame das crianças, mas tudo é questão da dosagem, do limite, de priorizar também o que é mais importante. Exemplo, a gente tá num período de férias escolares, então a gente dosa isso nas férias, pode ser utilizado isso de uma forma melhor, no período de aulas, que pode afetar o aprendizado, o estudo, as tarefas de casa, enfim, o sono dessa criança ou adolescente, então tem que ser um consumo mais limitado, mais reduzido, principalmente pelo diálogo, pela conversa entre pais, filhos, alunos, professores, enfim, envolve todos esses grupos sociais, todo esse contexto familiar, social, escolar de crianças e adolescentes.

Lab Notícias: Quando ocorreu essa transformação nas mídias e esse consumo desenfreado?

Não sei precisar quando que isso ocorreu. Acho que é tão rápido, a gente não consegue nem mensurar isso. Mas eu acredito que seja muito pelo impacto, pela urgência, o excesso de informação, enfim, de todo esse uso e abuso de telas, de mídias.

Lab Notícias: Por que esse consumo pode desencadear vários problemas mentais?

Não é que necessariamente vai desencadear. Pode desencadear, pode ser um facilitador, pode ser um gatilho esse consumo. E a gente não está falando de um consumo moderado, sempre é importante pontuar um consumo desenfreado, um consumo excessivo, um consumo sem limites. Então, esse consumo desenfreado, excessivo, sem limites, é importante a gente ter cuidado, não é que vai desencadear, mais a possiblidade. E também não necessariamente esse consumo excessivo vai afetar todas as crianças e adolescentes que estão expostas a esse consumo. Mas pode desencadear vários problemas mentais, porque isso tem um impacto diretamente na vida escolar, como eu já comentei, na vida social, familiar, dessa criança. E, principalmente, se a gente for pensar na ansiedade, as crianças cada vez mais estão com essa urgência, com essa ansiedade. E a ansiedade, ela pode desencadear estados depressivos, transtornos de humor, e aí a gente vai para os transtornos mentais, transtornos alimentares, transtornos de humor. Pode afetar o sono, então uma criança ou adolescente que dorme demais ou que tem insônia, que existe uma dificuldade para dormir, que tem um pensamento muito acelerado. Enfim, tem várias coisas aí que podem estar acontecendo.

Lab Notícias: Como controlar e ajudar as pessoas que desenvolveram alguma doença mental a partir desse consumo?

Acho que a base, primeiro, é tomar a consciência, o reconhecimento da pessoa em si, do adolescente ou dos pais, quando se trata de criança, adolescente, os pais estarem atentos. Primeiro, a percepção, perceber que seu filho ou que eu preciso de ajuda, ou que o indivíduo precisa de ajuda, ou que meu filho, meu aluno precisa de ajuda. Então é perceber a percepção, a consciência, primeiro acho que é isso, pra gente tentar, acho que nem tanto controlar, pode ser, mas ajudar as pessoas que, como você colocou, desenvolveram alguma doença mental a partir desse consumo. E  a partir dessa percepção, dessa consciência, o diálogo, a conversa, não é tirar, não é proibir, não é punir, não é castigar, mas tentar mediar, priorizar, negociar com esse filho, com essa criança, com esse adolescente, principalmente em casos extremos, às vezes nem precisa ser tão extremo assim, buscar ajuda, ajuda profissional, ajuda emocional, psicológica, às vezes procurar um psicólogo, um profissional da psicologia, pra fazer uma terapia, às vezes, até mesmo um médico psiquiatra, pra prescrever alguma medicação, um ansiolítico, um antidepressivo, pra regular, o sono, o humor dessa criança. Então existem, sim, formas de controlar, entre aspas, ou de ajudar, principalmente buscando o reconhecimento, reconhecer, ter essa consciência e buscar ajuda de profissionais e ter, principalmente, essa ajuda não seria nada se não tiver o apoio familiar, o apoio de amigos, pessoas importantes, da escola e, principalmente, o apoio dos pais, quando se trata de crianças e adolescentes.

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