Um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Cardiologia (INC) aponta que 38% da população está acima do peso e 24% já se encontra no quadro de obesidade. Dados da pesquisa mostram que, esse quadro em que o país se encontra teve início entre 2010 e 2011, quando a percentual de indivíduos com excesso de peso ficou igual ao de pessoas com peso normal. A partir de 2012, pela primeira vez, houve uma inversão nessa proporção, o número de pessoas adultas com sobrepeso ultrapassou o daqueles com peso normal, permanecendo até os dias de hoje.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), obesidade pode ser definida como uma doença caracterizada pelo excesso de gordura corporal prejudicial à saúde, e não há um fator absoluto para a doença. Como consequência, ela aumenta o risco de diversos outros problemas de saúde, como doenças cardíacas, diabetes e certos tipos de câncer.
O epidemiologista, coautor do estudo do INC, Arn Migowski, afirma em entrevista à Radio Nacional do Rio de Janeiro que o quadro de sobrepeso em que a população brasileira se encontra é multifatorial, indo muito além do desequilíbrio entre consumo e gasto calórico. “Em geral, a principal causa é o aumento, nas últimas décadas, do estilo de vida urbano com maior prevalência do sedentarismo e o padrão dietético com maior ingesta de dietas ricas em lipídios e carboidratos. O consumo de alimentos ultraprocessados, é um alimento comumente encontrado nesse tipo de dieta. Também tem sido estudado como possível causa desse aumento”.
O papel da má alimentação
Apenas 45,5% dos brasileiros consome verduras e legumes cinco vezes ou mais na semana, e 17,8% incluem refrigerantes e sucos artificiais na dieta praticamente todos os dias, aponta pesquisa da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
É mais que comprovado, por diversos estudos, que os alimentos processados e ultraprocessados têm papel fundamental no aumento das taxas de obesidade. “Esses alimentos são considerados alimentos de calorias vazias, que não possuem nutrientes, apenas gorduras saturadas, sódio em excesso e carboidratos”, afirma a nutricionista Gabriela Fernandes.
A classificação dos alimentos pelo grau de processamento é recente, foi proposta em 2009, baseada em um artigo do coordenador científico do Nupens (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde) publicado na revista Public Health Nutrition, e se chama NOVA.
A NOVA classifica alimentos processados como sendo aqueles “modificados por processos industriais relativamente simples” com adição de uma ou mais substâncias, como sal, açúcar ou gordura. Já os ultraprocessados, que podem ser bebidas ou comidas, “não são propriamente alimentos, mas, sim, formulações de substâncias obtidas por meio do fracionamento de alimentos do primeiro grupo (in natura ou minimamente processados)”.
Para o fotógrafo e estudante de jornalismo Alexandre Manso , dois grandes vilões da sociedade atualmente, a ansiedade e a depressão, foram fatores determinantes para o seu ganho excessivo de peso.
“Isso me fez desenvolver uma compulsão alimentar, e essa compulsão não era somente por comida, mas por bebida também… eu tomava muita cerveja, que é algo que faz com que a gente ganhe peso de forma rápida, e isso fez com que todos os meus problemas piorassem”, conta Alexandre.
Segundo a classificação NOVA, para o estilo de vida acelerado da sociedade moderna, esses alimentos são vistos como “salvação”. São produtos acessíveis, que já vêm prontos ou são de fácil preparo, são super agradáveis ao paladar e fortemente promovidos por publicidades como “aliados”.
O papel da atividade física
A prática de atividade física é considerada um fator de proteção contra o desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT). A OMS recomenda que os adultos pratiquem pelo menos 150 minutos de atividade física aeróbica de intensidade moderada ao longo da semana.
De acordo com a pesquisa da UFPel, apenas 31,5% dos brasileiros são adeptos as recomendações da OMS. O educador físico especialista em emagrecimento Igor Coelho, diz que tudo é uma questão de prioridades: “É impossível que uma pessoa não consiga separar esse mínimo de tempo para cuidar da saúde… Há exercícios, como os HIITs (Treinamento Intervalado de Alta Intensidade) que são ótimas opções de treino e que promovem altos gastos calóricos com pouca demanda de tempo”.
Uma pesquisa do Instituto do Coração (Incor) encabeçada pelo professor Carlos Eduardo Negrão aponta que embora não haja estudos definitivos mostrando que pouco exercício aumenta o risco de obesidade ou que muito exercício o reduz, praticar menos atividade fisica ou não praticar pode levar a mais ganho de peso e vice-versa.
Além disso, o estudo afirma ainda, que a prática de exercícios ajuda na manutenção do peso corporal a médio prazo, evita o reganho de peso em obesos, e traz benefícios independentes para várias consequências relacionadas à obesidade, como resistência à insulina, níveis elevados de açúcar no sangue e problemas de lipídios. Ou seja, um estilo de vida ativo pode ajudar a reduzir os riscos de doenças e morte em pessoas com sobrepeso ou obesidade.
Foram as alterações nos exames que fizeram com que Alexandre Manso inserisse a atividade física em sua rotina diária, ele chegou a pesar 116 kg. “O médico me falou, ou você muda de vida ou você vai morrer”, conta Alexandre. Esse alerta fez ele sair da compulsão alimentar e do vício em bebidas, e eliminar 28 kg.
O que esperar daqui para frente?
Segundo a Federação Mundial de Obesidade ( World Obesity Federation – WOF) até 2035 a obesidade deve atingir até 41% da população adulta brasileira. O Novo Atlas da Obesidade 2024, divulgado no Dia Mundial da Obesidade, aponta ainda que metade das crianças brasileiras terão sobrepeso em 2035.
A nutricionista Gabriela Fernandes afirma que esse panorama para o público infantil está fortemente atrelado ao desequilíbrio entre o consumo e gasto calórico. “As crianças de hoje em dia ficam muito atras das telas, computador, televisão e celulares. Há, um desequilíbrio entre o que elas ingerem com o que elas gastam. Elas consomem muitos alimentos industrializados, ricos em gordura, açúcar e sódio, e como estão mais sedentárias, isso faz com que tenha o acúmulo de gordura ocasionando o excesso de peso”.
Atualmente no Brasil, 1 a cada 3 crianças está com o Índice de Massa Corporal (IMC) elevado, e esse número pode saltar para 50% dos casos nos próximos anos, entre os indivíduos de 5 a 19 anos. Como consequência, esse quadro de sobrepeso poderá acarretar as crianças e jovens, pressão alta, hiperglicemia e colesterol HDL baixo, aponta o documento da WOF.
A importância das políticas públicas
Os resultados do estudo do INC e as projeções apontadas no Novo Atlas da Obesidade 2024, deixam claros a necessidade de politicas públicas para o enfrentamento e quebra de estigmas da obesidade.”Fundamental é que a obesidade e o sobrepeso não sejam vistos apenas como problema individual, um problema de força de vontade. Muitas vezes tem esse estigma. Evitando a culpabilização dos individuos. Quando na verdade existe outros determinantes que vão muito além disso. Criando um ambiente obesigênico, ou seja, um ambiente que é gerador de obesidade”, afirma Arn Migowski a Rádio Nacional.
Um estudo realizado por pesquisadores do Brasil e do México e publicado na Revista Nature Metabolism, elenca oito determinantes principais da obesidade nos países latino-americanos, sendo eles: ambiente físico, exposição alimentar, interesses econômicos e políticos, iniquidade social, limitação do acesso ao conhecimento cientifico, cultura, comportamento contextual e genética. Os pesquisadores destacam a necessidade das politicas e estratégias públicas envolverem abordagens multidisciplinares e globais que considerem esses determinantes.
Em Goiânia, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) afirma abordar a questão na Atenção Primária à Saúde (APS) com base na Política Nacional de Alimentação Saudável. “ Temos o Incentivo a Atividade Fisica (IAF), que ajudam no controle, promoção e prevenção da obesidade. Dentro do Programa Saúde nas Escolas(PSE) temos a antropometria para avaliar o IMC, e ainda o acompanhamento nos cais e ambulatórios por meio de ações e palestras sobre práticas alimentares saudáveis, vigilância alimentar e nutricional”, afirma Caroline Gonçalves, assessora de imprensa da SMS.
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