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JOAO CESAR ALMEIDA CARVALHO

Goiânia é nacionalmente conhecida como a Capital do Sertanejo, o que não poderia ser diferente, visto que grandes nomes desse gênero surgiram na cidade. No entanto, a capital goiana apresenta diversas facetas em suas produções musicais, especialmente no cenário independente de bandas. Nos anos 1990, surgiu um movimento de rebeldia e rejeição à música veiculada nas grandes rádios e emissoras de televisão. Assim, festivais como o Goiânia Noise e o Bananada deram espaço para essa cena emergente.

Ao longo desses 30 anos, diversas bandas surgiram e conseguiram ultrapassar a bolha da região, com nomes influentes como Boogarins, Aurora Rules, Violins e Carne Doce, que ajudaram a espalhar pelo Brasil o som alternativo feito na cidade. Contudo, a realidade para os artistas que ainda não conseguiram se estabelecer nos grandes centros do país é difícil, especialmente após a pandemia de COVID-19.

Uma banda em crescimento é a Banana Bipolar, que já conta com mais de 10 mil streams em suas músicas nas plataformas. O quinteto, formado por Amanda Hatamari, Vinni Silva, Pedro Leon, Júlio Mesquita e Gabriel Morais, acredita que a cena goiana ainda precisa de muitas melhorias, principalmente no que se refere à coletividade entre os músicos, às condições para tocar na cidade e ao apoio à cultura local.

Show da banda Banana Bipolar na Marcha da Maconha em Goiânia (Reprodução: Banana Bipolar)

Para o guitarrista Pedro Leon, ser artista independente em Goiânia significa fazer de tudo para que as coisas aconteçam, mas ainda é muito frustrante perseguir o sonho de viver da música. “Enfrentamos muitas dificuldades em nosso trabalho, principalmente em relação a questões técnicas, produção de eventos e relações com outras bandas”. Uma dura realidade vivida por eles é a falta de trabalho conjunto entre os músicos; segundo Leon, existe uma certa competitividade entre as bandas, o que impede a união na luta por respeito ao trabalho de todos.

FINANCEIRO

Na realidade da música independente em Goiânia, as questões se entrelaçam: a falta de condições adequadas para shows, o pagamento, os horários e os locais para tocar são alguns dos empecilhos financeiros enfrentados pelos músicos. No caso do Banana Bipolar, todos os integrantes possuem empregos paralelos à música. Nas palavras da vocalista Hatamari, “É uma experiência que beira o impossível”, já que a música é um trabalho que consome muito tempo para planejar, compor, ensaiar, gravar e se apresentar.

Para os músicos que trabalham de forma independente, o apoio financeiro é uma das questões mais difíceis, e muitas vezes não condiz com o esforço investido. O dinheiro que circula na cena vem, em sua maioria, dos eventos, já que as plataformas musicais não pagam de forma justa. O Spotify, por exemplo, paga entre US$0,003 e US$0,008 por reprodução. Porém, a pandemia de COVID-19 alterou essa lógica, com o lockdown e as proibições de eventos com grandes aglomerações.

Após o fim da pandemia, os eventos voltaram, mas não com a mesma força de antes, o que afetou a subsistência da cena para os artistas independentes. Algo que foi sentido pelo baixista da banda Rise Go e produtor musical Ali Rosa, que chegou na cidade logo no começo da pandemia. Para ele, ser independente é muitas vezes financeiramente inviável, pois o dinheiro que se ganha não cobre os custos da banda e o tempo investido. “O underground é mantido pela paixão”, complementa Rosa.

Outra realidade apontada pelos músicos goianos é a falta de público, muitas vezes devido à falta de dinheiro para ir aos eventos ou ao desconhecimento das pessoas sobre o que acontece na cidade. “Goiânia tem fome de cultura, mas as pessoas muitas vezes não sabem que há eventos culturais acontecendo na cidade”, explica Hatamari, da banda Banana Bipolar. Isso também afeta a forma como os movimentos culturais da cidade se mantêm ativos, pois eles precisam de público tanto para financiar quanto para participar das apresentações.

Banda Rise GO em show no espaço La Santa Madre (Reprodução: João César Almeida)

Uma alternativa para manter o trabalho artístico são as leis de incentivo à cultura, que existem nas esferas federal, estadual e municipal. Na visão dos artistas goianos, essas leis são uma saída para o cenário cultural da cidade, mas ainda não são suficientes. Segundo a Secretaria Municipal de Cultura de Goiânia (SeCult), entre 2021 e 2023, cerca de R$7,4 milhões foram destinados a aproximadamente 195 projetos culturais, incluindo a música, mas ainda assim esses recursos não alcançam todos os artistas.

GOVERNO

No Brasil, muitas vezes se levanta a discussão sobre as leis de incentivo e captação de recursos para projetos culturais. A mais conhecida delas é a Lei Rouanet, que permite que empresas e pessoas físicas deduzam do Imposto de Renda os valores doados ou patrocinados a projetos culturais. Essa lei demonstra um esforço do governo para manter viva a cultura, mas ainda há desafios em algumas esferas, como já mencionado anteriormente.

Para a realidade dos artistas independentes goianienses, as principais leis são: a Lei Municipal de Incentivo à Cultura, a Política Nacional Aldir Blanc e a Lei Paulo Gustavo, oferecidas pela Secult. As inscrições para essas iniciativas são feitas por meio de editais, nos quais as bandas apresentam suas propostas, explicam como executariam os projetos e mostram seus portfólios com trabalhos anteriores. No entanto, as verbas não são divididas de forma igual, e, em um mesmo edital, várias expressões artísticas concorrem por recursos, o que dificulta a aprovação.

Devido às jornadas duplas que esses artistas enfrentam, estudar os editais não é uma prioridade, e muitos não encontram apoio para entender como funciona o processo de inscrição. Em entrevista por mensagem, a diretora de Políticas, Ações e Patrimônio Cultural da Secult , Edelweiss Vieira, afirmou que existem ações desenvolvidas pelo Conselho Municipal de Cultura com o intuito de promover orientações sobre as formas de fomento disponibilizadas.

Além disso, o apoio a festivais e eventos culturais por parte dos órgãos públicos é fundamental para fortalecer a música, e, segundo a diretora da SeCult, os grandes eventos são “um meio eficaz para fomentar a cadeia produtiva musical local, gerar novos empregos, estimular a formação de plateias e, consequentemente, ampliar a visibilidade do município em várias esferas.”

Esse texto foi produzido pela equipe do Correio Cultural, de autoria de João César Almeida e revisão de Hayane Bonfim.

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