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Da esq para dir: Mark Zuckerberg (Meta), Jeff Bezos (Amazon) e a noiva, Lauren Sanchez, Sundar Pichai (Google) e Elon Musk (X/Twitter) — Foto: Julia Demaree Nikhinson/REUTERS

A ascensão de Donald Trump nos Estados Unidos trouxe à tona uma realidade até então velada, deixando para trás cuidadosas campanhas de marketing que, por anos, pintaram gigantes tecnológicas como paladinas da diversidade. Mas a presença de magnatas do Vale do Silício na posse presidencial de Trump, em 20 de janeiro, expõe um fato incontestável: eles se cansaram de fingir.

Talvez o exemplo mais emblemático seja a Meta, conglomerado que controla Facebook, Instagram e WhatsApp. No início de 2025, a empresa anunciou o fim de seu programa de checagem de fatos e a implantação do sistema de “Notas da Comunidade”, delegando aos próprios usuários a responsabilidade de fiscalizar a desinformação na plataforma.

O movimento não chega a surpreender, embora a mudança de postura de Mark Zuckerberg possa parecer abrupta para aqueles que apenas se lembram dele diante do Senado norte-americano em 2018, prestando esclarecimentos sobre o vazamento de dados de milhões de usuários para a Cambridge Analytica. A empresa de consultoria política explorou essas informações para influenciar as eleições dos Estados Unidos de 2016, que culminaram na primeira vitória de Trump para a presidência. Na ocasião da audiência, o presidente-executivo do Facebook disse que “proteger a nossa comunidade é mais importante que maximizar nossos lucros”.

Mas talvez essa mudança não seja tão inesperada assim, considerando a alteração da situação geopolítica nos últimos anos. Circulam teorias de que Zuckerberg nutria rancor pelas supostas “censuras” que sofreu durante o governo Biden, algo que ele mesmo afirmou em declarações recentes. Some-se a isso a influência de Elon Musk, o homem mais rico do mundo e maior entusiasta da “liberdade de expressão” irrestrita, que transformou o X (antigo Twitter) em um reduto de discurso livre de regulação, mesmo que isso signifique tolerar o discurso de ódio contra grupos minoritários e marginalizados.

Para alguns, o fim do que chamam de “cultura woke” — um termo pejorativo para políticas progressistas — pode parecer uma vitória. Medidas como a redução ou extinção de programas de diversidade recentemente anunciadas pela Meta e Amazon, copiadas por outras organizações, apontam claramente para um alinhamento com visões mais reacionárias. Para outros, isso representa o retorno a tempos mais sombrios, onde o progresso social e os direitos conquistados com muito esforço são colocados em xeque.

Mas ambos os lados dessa disputa ideológica negligenciam o verdadeiro cerne da questão: tudo é voltado para a conservação da hegemonia dessas corporações. Essas empresas sempre se adaptarão ao vento mais favorável — e, no momento, ele sopra na direção de políticas mais conservadoras. A ideologia predominante pode mudar, mas o objetivo principal permanece o mesmo: maximizar lucro e poder, independente do que Zuckerberg tenha dito no passado para agradar o público de sua audiência no Senado. 

O usuário comum, que consome e interage diariamente com essas plataformas, mal percebe essas nuances. Talvez ele note um aumento de anúncios bizarros no Instagram, ou comece a receber conteúdo de perfis que nunca seguiu, mas que foram promovidos pelo algoritmo. No entanto, ele acredita que suas escolhas são espontâneas e não dedica muito pensamento a como esse algoritmo é realmente programado.

Aos poucos, essa influência sutil molda opiniões e comportamentos, que definem eventos importantes, como eleições em diversos países. A retórica de Musk sobre o direito de dizer o que se pensa — ainda que isso signifique atacar a existência do outro — torna-se normalizada. O discurso é repetido, amplificado e, por fim, idolatrado. Muitos começam a ver esses bilionários como defensores de sua liberdade, sem perceber que estão apenas servindo de peças em um tabuleiro cujas regras eles não controlam e pouco compreendem. 

A ignorância pode ser uma bênção para alguns, mas é também a maldição que nos levará a todos para o abismo. Enquanto nos distraímos com essas disputas superficiais, ainda que relevantes, um pequeno grupo acumula ainda mais riqueza e poder, sacrificando não apenas a dignidade de bilhões de pessoas, mas também a sustentabilidade de todo um planeta. Porque eles não se importam sobre nós. Apenas com o que representamos enquanto números, cliques e dados que perpetuam sua supremacia e a manutenção do status quo.

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