Rafaela Ferreira é graduada em Jornalismo pela Universidade Federal de Goiás (UFG), mestranda em Comunicação pela Universidade de Brasília (UNB), ex-foca do Estadão, e membra do Coletivo de Jornalismo Compartilhado Magnífica Mundi (UFG). Atuou como Repórter de 2023 até 2025, com passagens pelo Jornal Opção, Estadão e Brasil de fato, atualmente atuando como assessora de comunicação do Ministério de Igualdade Racial (MIR).
Nessa entrevista buscamos ouvir sobre a atuação de Rafaela Ferreira no jornalismo social, e a importância desse Jornalismo para a realidade política brasileira. A entrevistada também fala sobre o futuro dessa área de atuação, levando em consideração os novos mecanismos de propagação da informação.

O que te motivou a atuar no jornalismo social?
Quando eu entrei no curso, conheci a Magnífica Mundi, que trabalha com o jornalismo compartilhado, e foi ela que me apresentou outra oportunidade além do jornalismo hegemônico tradicional, como conhecemos. Já gostava de trabalhar com movimentos sociais, mas a Magnífica me deu um novo olhar sobre como trabalhar o jornalismo.
Foi totalmente por causa da Magnífica, que mostrou esse jornalismo compartilhado. Já atuei também como assessora da Campanha Contra Violência no Campo, como parceira voluntária Magnífica com MST Goiás, então essa formação da FIC na UFG foi responsável por essa paixão no Jornalismo Social.
Como alguém que começou a atuar em Goiás, muito ligada à essa questão agrária, quais são os desafios para dar visibilidade a esses movimentos sociais rurais em um estado cuja propaganda é voltada ao agronegócio?
É um trabalho muito árduo, pois esse tipo de Jornalismo está ligado ao jornalismo independente, que raramente recebe financiamento do Estado, e nosso estado é ruralista, muito ligado ao agronegócio. Esse tipo de cobertura vem de um financiamento próprio, ainda muito caquético, ou proveniente de movimentos sindicais, que estão muito ligados à essa produção.
Então o principal desafio é financeiro, principalmente em Goiás, que por consequência acaba sendo pouco consumido, onde quem produz é quem ouve. O desafio também é pessoal, é cansativo, mas é um esforço.
Você acha que exista alguma saída para popularizar esse Jornalismo e tornar ele mais acessível para a população?
Desde 2023 entramos em uma gestão nova, onde a SECOM (Secretaria de Comunicação Social) injetou mais investimentos em veículos independentes. Acaba que a saída é direta, é necessário investimento do Estado. No Brasil temos a Comunicação Pública Nacional, a EBC muito ligada ao Governo Federal, a ABC em Goiás, que é ligada ao Governador, e por consequência ao Agronegócio.
Mas a saída é construir uma rede fortalecida com os movimentos sociais, construir um diálogo muito aberto, mapear esses movimentos, pois. A melhor saída é o diálogo, estar bem alinhado com os movimentos sociais. Para o jornalismo social essa é a saída, uma articulação ampla.
Levando em consideração a polarização política e a propagação das fake news, quais foram os principais desafios durante sua atuação como repórter no Brasil de Fato??
Estamos enfrentando uma onda conservadora desde 2016, de disseminação de notícias falsas muito intensas, muito perceptível com a eleição do Trump, do Bolsonaro, e fenômeno muito fortalecido com o uso das IAs. O principal desafio é não depender somente da checagem de fatos, uma vez que a informação muitas vezes já foi propagada e só é checado se ela é verdadeira ou não. Eu estudo desinformação propagada especialmente pela extrema direita em relação às mudanças climáticas, então entender como esses atores funcionam ainda é um desafio.
Estudos já revelam que conservadores e a extrema direita estão mais ligados à propagação de fake news e desinformação, então o desafio é encontrar uma forma de ter mais voz, saber como a extrema direita funciona, para tentar derrubar por dentro. Também existem reportagens da Intercept que dizem como essas notícias falsas são financiadas pela extrema direita, e mundialmente pelos Estados Unidos, e também no funcionamento das IAs, pois são máquinas que também possuem ideologia política. Então nosso desafio, contra a disseminação das fake news, também é compreender esse jogo da extrema direita, que também vem de uma base de investimentos monetários.
Somos dependentes dessas tecnologias atualmente, então mesmo nesse cenário é muito importante a participação dos movimentos sociais nessas tecnologias e redes-sociais, entender o algoritmo, como ocorre esse financiamento. Como não há o dinheiro, é necessário fazer de uma forma orgânica, se apropriando dessas tecnologias, conversando com a sociedade civil de uma maneira mais sólida.
Na sua atuação como repórter, foram cobertos diversos protestos e ações sindicalistas. Qual a importância de dar atenção à pluralidade de vozes ao produzir coberturas acerca da luta de classes?
Ao trabalhar com movimento sindical, é percebido que ele ainda é encabeçado por homens, que ocupam predominantemente cargos altos. Então esse é o desafio no movimento sindical, cobrir uma pluralidade que não seja só masculina. Durante minha atuação no Brasil de Fato, uma política editorial era a de dar prioridade às vozes femininas ao cobrir essas pautas, garantindo uma pluralidade.
Esses movimentos estão muito abertos ao jornalismo social, mas o desafio é garantir a pluralidade de vozes. Isso também vem muito do repórter, que deve buscar diversas fontes ao cobrir alguma pauta. É preciso enxergar os “dois lados”, atendendo à visão deles, mesmo que o jornal possua uma linha editorial clara, para evitar cair em um jornalismo declaratório.

Além da sua atuação como repórter, atualmente você atua como coordenadora e assessora na Secretaria de políticas e ações afirmativas (SEPAR) e do Ministério da Igualdade Racial (MIR). Qual é a importância da comunicação social para a visibilidade, e garantia de direitos a grupos minorizados?
O que eu faço no ministério é comunicação pública, a base da comunicação. Uma comunicação gratuita, que tem o objetivo de atingir a sociedade civil de uma maneira mais ampla. O Ministério da Igualdade Racial foi criado em 2023 no governo Lula, e por consequência eles têm o desafio financeiro, sendo um ministério novo e com menor investimento público. Essa comunicação é de ampla importância, pois é dela que sai as políticas públicas, as políticas de ações afirmativas, tendo um papel muito fundamental de transmitir o que está acontecendo e atingir a população.
Infelizmente no Brasil não se consomem com frequência as produções feitas nos portais dos ministérios, sendo consumido de forma terceirizada por meio da imprensa tradicional. Disso surge o papel da imprensa, de não reforçar o papel de somente uma pessoa. A comunicação social é importante pois é dela que os veículos conseguem essas informações e visibilidade.
Quais são as adaptações necessárias para o comunicação social nas redes, em uma realidade onde o algoritmo impede a visibilidade de ideias plurais?
Os algoritmos se sustentam muito por elementos que não vão fazer parte da comunicação pública. Eles se alimentam muito do discurso de ódio, favorecendo publicações que estimulam a violência e a propagação desse discurso. As mídias sociais usam muito disso.
Para o jornalismo compartilhado é difícil adentrar nessa lógica, pela falta de recursos é necessário entrar nesse meio de forma mais orgânica. O desafio da comunicação pública é fazer cada vez mais postagens que estimulem o diálogo, porque as mídias sociais são muito características por esse elemento. Se não houver interatividade, o acesso é prejudicado. No Governo atual, essa comunicação consegue ser suprida de uma maneira boa, e é necessário ocupar também esses espaços.