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Fundado em 2020, o programa aproxima pessoas dentro e fora do universo acadêmico com conversa descontraída, muita liberdade e acolhimento

Gravação de episódio do Fisikest (Foto: Fisikest)

Iniciado como um projeto para o PIBID — Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência —, o Fisikest foi idealizado por Jeovan Batista, aluno de licenciatura do curso de Física na Universidade Federal de Goiás. Hoje, transformado em projeto de extensão do Instituto de Física, conta com 13 membros efetivos, que participam na construção desse programa de conversas com as mais diversas personalidades da UFG, com episódios semanais nas principais plataformas de áudio.

Próximo ao Dia Nacional da Astronomia, comemorado 02 de dezembro, o Lab Notícias faz entrevista com o fundador desse projeto de extensão que fala sobre Ciência, sociedade e, principalmente, pessoas.

A CRIAÇÃO

LN: Do que se trata o Fisikest? De onde surgiu?

JEOVAN BATISTA: O Fisikest é um podcast criado em um contexto bem turbulento, complicado. Tinha acabado de entrar na faculdade, em 2020, ano da pandemia. Abriu o edital do PIBID, e eu me inscrevi, não tinha nada a perder. O Fisikest foi criado como um dos projetos para o programa. Estava eu, em quarentena, à toa. Não sabia o que era podcast. Um dia, resolvi pesquisar. Vi uma galera conversando, com uns assuntos aleatórios, microfones. Pensei: “Podcast deve ser isso aí”, e eu gostei.

É uma ideia legal, é gostoso ficar ouvindo as pessoas conversando. Eu percebi que não tinha muita coisa relacionada à Física, e seria bacana se tivesse. Fiquei com isso na mente por um tempo, até que um dia eu me perguntei: “Por que eu, então, não crio um podcast? Já que ninguém tem, eu crio um.”

Relembra Jeovan.

Logo vieram as barreiras e os desafios. “Como fazer? Não dá pra juntar a galera. Se for fazer, vai ter que ser remoto.” Essa foi uma certa vantagem, de início. Mas estudante, por definição, é quebrado. Como que eu ia conseguir o equipamento?

O INÍCIO

JEOVAN BATISTA: No PIBID, eu conheci um cara fantástico chamado Luiz Gonzaga, professor maravilhoso. Eu ouvia a galera comentar: “Se vocês precisarem de ajuda, conversem com o Luiz, ele ajuda quem pede”. Mandei mensagem pra ele explicando a ideia. Acabou que ele me ajudou: comprou um microfone, que chegou na minha casa. Fiquei muito feliz com a atitude dele, em ver como ele é uma pessoa que incentiva. Veio a parte estética. Eu tenho até hoje um papel com os rascunhos que eu fiz. Acabou que a ideia foi Fisikest. No início, seria Fisicast, mas o Fisikest, com K, remete à palavra “fisikê”, “natureza”, em grego.

Então começou um novo desafio: Com quem eu iria conversar? Eu não conhecia ninguém, não sabia o que fazer, então fui convidar o Luiz. A gente marcou, e no início foi um episódio de 30 minutos, só para aprender a fazer, para ver como era. Eu estava aprendendo tudo do zero: encontrei o Spotify e aprendi a postar, reaprendi a usar editores de imagem. Eu cortava tiras do podcast e divulgava no Grande Grupo de Pesquisa (GGP) — um público bem fechado, no início. Depois, tinha que gravar de novo. Resolvi chamar o pessoal de quem eu era mais próximo, do GGP, que o Luiz coordena. Aceitaram, e eu repeti todo o processo. E era complicado isso, porque dava uma certa vergonha. Mas eu comecei a ficar ousado. Lembro que, na época, eu era monitor do programa nacional Salvaguarda, que ajuda alunos a estudarem pelo Enem através do WhatsApp, e eu conheci o criador desse programa. Mandei mensagem: “Sou Jeovan, criei um podcast aqui na UFG, o que acha de participar?” Ele me respondeu prontamente, gostou da ideia. Acho que esse foi o quarto ou quinto episódio. No GGP, tinha um cara chamado Rainer, que trabalhava lá no Amazonas. Fui falar com ele, trouxe ele pro podcast, um cara do Observatório Nacional. Eu vi que dava certo, era divertido.

LN: E já havia um certo público te acompanhando?

Sim, era um público bem pequeno, mas tinha uma ou outra pessoa que gostava. Uma coisa que que começou como algo pra me divertir, já ter alguma pessoa que gosta? É incrível. Fui melhorando algumas coisas, Luiz foi dando algumas ideias.

O podcast começaria com uma frase: “conhecendo pessoas e histórias”. Porque as pessoas têm histórias. Você não imagina, até que você para pra ouvir, e você tem que valorizá-las. Tanto é que a frase inicial do podcast agora é: “Salve, livrojantes, sejam bem-vindos a mais uma edição do Fisikest, conhecendo pessoas e histórias

Comenta o fundador.

Fui chamar gente de fora. Comecei a conversar com as entidades do Instituto de Física. Teve duas que foram muito importantes; a primeira foi o Diretório Acadêmico, que na época era coordenado pela Larissa, que sempre apoiou o projeto. Ela desenvolveu um gosto [pelo Fisikest] que nem eu tinha, então eu não poderia desapontar. O programa era semanal — ainda é —, só que eu fazia tudo sozinho. Lembro que conversei com o pessoal, falei que era difícil, que não sabia se ia aguentar por muito tempo. Então a Larissa deu a ideia de transformar o Fisikest em um projeto de extensão. Fizemos o processo, levou um tempo, mas deu certo.

A outra entidade estudantil foi o Gheeck Jr. Tinha o Marcos, Marcos Sales, e ele me mandou um vídeo do Julius, de “Todo Mundo Odeia O Chris”, naquele discurso dele: “E se Marther Luther King tivesse desistido?” E assim eu continuei, fomos avançando. Daí pra frente, o podcast se tornou um projeto de extensão. Logo teve um colega que queria participar comigo, o David. Às vezes. ele participava do programa, mas basicamente era só eu. Depois entrou o Gabriel na história. Éramos esse trio. Começamos a dividir o trabalho, aliviou um pouquinho. Começamos a divulgar mais, fazer as coisas, e era mais divertido, porque não era mais algo só meu.

Foi com o cadastramento como trabalho de extensão que tivemos que esquematizar nosso podcast. Começamos a refletir: é um podcast voltado para o mundo, natural e artificial, com conversas livres, tranquilas, agradáveis, com o intuito de promover a Ciência. Uma coisa que percebemos é que não tem muito contato entre as entidades, então por que não fazermos essa mediação?

Vamos pegar a galera de História e colocar pra conversar com a galera da Física, pegar a galera de Letras e colocar pra conversar com a galera de História, juntar todo mundo. Vamos criar um ambiente onde as pessoas possam conversar, interagir, conversar sobre Ciência, e além disso, vamos pegar pessoas de fora da Universidade para conversar aqui dentro, pessoas daqui de dentro pra conversar lá fora.

A gente já fez isso algumas vezes, conversando com estudantes das escolas estaduais. Foi maravilhoso. Como o Luiz fala, eu falo: Começamos a fazer bagunça! A bagunça te ajuda a ver coisas que antes você não via, a fazer coisas que você não faria. Foi-se criando uma identidade do podcast. Uma das bagunças que a gente fez foi colocar o coordenador de licenciatura em Física pra tocar violão no podcast. Ninguém nunca imaginaria isso, nem ele. Eu disse, “Renato, traz seu violão pra tocar aqui no podcast!”, e ele disse, “É claro! Eu tô aqui há mais de vinte anos, nunca trouxe meu violão pro instituto”. Isso foi incrível. O sentimento de nós termos possibilitado isso acontecer é incrível.

Mais pessoas foram se interessando, foram agregando, fomos delegando funções. Criamos uma equipe de marketing, publicidade e propaganda, parte de administração, de gravação de podcast também. A ideia é cada um fazer o que gosta e colaborar com o que gosta. Faz o que você gosta e você vai fazer com mais alegria, melhor.

OS ENTREVISTADORES

LN: Como vocês planejam quem vai fazer as entrevistas?

JEOVAN BATISTA: Normalmente, somos eu e o Gabriel. Não tem uma regra. Quem quiser participar, participa. Eu apresento porque eu gosto, tenho disponibilidade, junto o útil ao agradável. Tem gente que quer e não consegue, tem vergonha. Eu sou meio uma exceção. Sou meio tímido, meio isolado, mas adoro conversar com as pessoas. E tá com vergonha? Vai com vergonha! Já fiz isso demais! Quer pautar um podcast? Pauta! Quer gravar com alguém um dia? Grava! Só tenha a vontade. Se você não tiver vontade, não correr atrás, não dá. 

OS CONVIDADOS

LN: E em relação aos entrevistados, como vocês escolhem quem vai falar na semana?

JEOVAN BATISTA: Varia de momento para momento. Às vezes, estamos na semana da Astronomia, comemorando algum evento astronômico, por exemplo, e chamamos alguém que tenha relação com a área. Se a educação está em alta na mídia, vamos chamar alguém pra conversar sobre a educação. Mas nem sempre é relacionado ao momento. Às vezes, queremos só fazer a bagunça! Não precisa ter propósito. Às vezes chamamos colegas de curso para conhecermos, para conhecermos as histórias deles.

A MIGRAÇÃO PARA O PRESENCIAL

LN: Você estava falando sobre o podcast ter sido criado durante a pandemia, em tempo de quarentena, com tudo virtual. Como foi a volta para o presencial? Ou melhor, a ida para o presencial?

JEOVAN BATISTA: Ah, essa história é legal! Estávamos indo bem no online, que de certa forma é mais fácil. Você perde um pouco do contato, mas ganha na parte técnica: é mais barato, mais rápido. Estávamos acostumados. Quando vimos que íamos voltar ao presencial, pensamos em todas as possibilidades possíveis. O primeiro desafio foi o local para gravar. A gente conversou com o Luiz, e acabamos usando a sala dele, que é a sala atual. Eu medi tudo, fomos organizando. Deu certo, mas às vezes ainda lembro com nostalgia de gravar em casa, no meu quarto, vendo minha foto no computador. Além de que a maior vantagem de gravar online é conversar com pessoas de qualquer lugar.

LN: Vocês conseguem mesclar o presencial com o virtual, de vez em quando, para conversar com alguém de outras cidades e estados, ou estão 100% presenciais?

JEOVAN BATISTA: Atualmente, está presencial, mas eu falo pra galera: “Olha, de vez em quando não custa fazermos virtual, para conversar com gente que não está tão próximo, e pra lembrar da nossa história”. Se a gente veio do online, por que vamos abandoná-lo? 

Esses tempos atrás, inclusive, gravavamos eu e um menininho de Minas Gerais, de 11 anos. Foi bom porque eu lembrei do passado. Aliás, esse menino gosta muito de Astronomia, então eu pensei: “Tenho contato com todos os clubes de Astronomia de Goiás. O que custa eu fazer uma surpresa para ele?” Chamei o presidente da Gunstar, o Cleiton. Ele [o menino] ficou super alegre, super, super empolgado. Isso não tem preço. Ele não vai esquecer. Maravilhas do online. Não quero perder esse tipo de coisa.

A APROXIMAÇÃO DA CIÊNCIA COM A POPULAÇÃO

LN: Conversamos com o Clube de Astronomia Cecília Payne, cerca de duas semanas atrás, e um dos pontos que eles comentaram foi que o clube de astronomia é muito bom, porque vão em escolas, fazendo apresentações, e ligam a Ciência às pessoas, quando muitas vezes não existe essa oportunidade do público se aproximar de uma forma mais simples. Qual é a importância do Fisikest nesse âmbito?

JEOVAN BATISTA: Talvez eu seja uma pessoa meio suspeita pra falar, mas a ideia é você poder disseminar as informações que estão aqui dentro para as pessoas, para que não fique restrito aqui. Isso é um problema: coisas desenvolvidas aqui ficam aqui, pouca coisa sai. A extensão é a maneira com que a Universidade retorna o investimento que a sociedade faz nela. A gente pega, por vezes, assuntos bem complexos e conversamos de uma maneira tranquila, divertida, em uma linguagem acessível, para despertar o interesse, não só de maneira acadêmica. De Academia já basta a gente. Quem está lá fora não precisa disso. Pegamos um professor e mostramos o trabalho dele. O legal é que misturamos isso com a história das pessoas; a pessoa faz isso porque tem um motivo. Tanto é que a “ordem” do podcast é uma caminhada: primeiro a história da pessoa, depois por que ela chegou ali, e daí você fala o que ela faz, e a gente vai conversando. Às vezes, eu pergunto sobre coisas que eu já sei, porque as pessoas podem não saber. Por mais que eu esteja lá, conversando, a conversa não é só pra mim. Perguntamos coisas que as pessoas não têm a oportunidade de perguntar. Quando que uma pessoa de escola pública vai poder conversar com um professor da Universidade? A gente faz esse intermédio. Ajudamos nesse sentido, de popularizar o conhecimento, o acesso, e tornar mais legal, mais atrativo, descontraído.

A Ciência tende a ser séria, tende a repelir, e a ideia é mostrar: “Olha minha história, sou exatamente igual a você, com as mesmas capacidades, então se eu posso, você também pode.”

LN: A gente sabe que falta muito estímulo à Ciência em escolas, por parte da sociedade, do governo. O Fisikest acaba sendo um estímulo para as pessoas, então?

JEOVAN BATISTA: Isso! Uma das ideias é criar esse ambiente para as pessoas se aproximarem e interagirem. Às vezes, se perguntam:  “Onde eu vou falar?”. Fala aqui, no Fisikest! Você tem espaço para falar, para ser ouvido! Uma coisa que eu percebi desde o início é que as pessoas adoram ser ouvidas, adoram falar. Mesmo os mais tímidos só precisam de um incentivo, de alguém que escute. 

LN: Como você acha que a Ciência pode impactar a vida de uma pessoa, e qual o papel do Fisikest nesse impacto?

JEOVAN BATISTA: A Ciência te eleva a não ficar muito dependente de crenças. Se você não tem conhecimento, você fica refém de seus medos. A Ciência te liberta quando ela dá esse conhecimento. A Ciência liberta as pessoas. Assim como o podcast me ajudou muito — no difícil período de pandemia —, já ouvi muitos relatos de pessoas falando “Eu adoro participar disso, adoro fazer isso”. Um colega disse: “Olha, só estou na Física por causa do podcast. Ele me ajuda, me motiva”. Então, mais do que compartilhar conhecimento e integrar pessoas e lugares, a gente cria um ambiente de acolhimento. Criamos uma comunidade em que possam se sentir bem.

O PODCAST

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