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Na Universidade Federal de Goiás desde 2012, o professor Ricardo Pavan está desde o seu ingresso na instituição à frente de vários projetos e laboratórios na Rádio Universitária da UFG. Ele se formou na Universidade do Vale do Rio dos Sinos em São Leopoldo, Rio Grande do Sul. Nessa mesma universidade cursou mestrado em 2002 e doutorado em 2011, atualmente, além de aulas na graduação no curso de jornalismo da UFG, Pavan também é docente na pós-graduação da UFG.
Nesta entrevista, o professor fala sobre a importância da rádio na formação dos alunos e sobre o futuro desse instrumento de formação importantíssimo para os discentes de jornalismo da UFG. A rádio que abriu suas portas para os discentes nos anos 1970, agora pode deixá-los de fora de sua programação.
Johnny – Conte a sua história com a Rádio Universitária. Como ela começou?
Ricardo Pavan – Bem, comecei na rádio em março de 2012. Como nesse meio tempo existe um período de licença e todo o problema da COVID-19, então na rotina e no espaço estou há 8 anos. Minha chegada foi meio no atropelo, cheguei meio sem conhecimento, a rádio passava por um período de transição, mas ainda estava bem estruturada e consolidada. Infelizmente, fomos perdendo isso aos poucos, não só a emissora mais a universidade inteira, perdemos algumas condições [financeiras] que tínhamos. Ainda acho muito relevante, minha experiencia tem sido muito significativa, essa dedicação de grande parte da minha vida acadêmica à radio universitária.
J – Qual a importância dos projetos de extensão da rádio na formação dos alunos?
RP – Não só dos projetos de extensão como dos laboratórios, que hoje existem como disciplina, mas no próximo PPC serão projetos de extensão. É de uma relevância maiúscula, não tenho dúvida de que essa experiência que eu vi nos projetos como: o Doutores da Bola, o Jornal das Seis, o Estação Esportiva, dentre outros que tivemos lá, sempre foram de extrema relevância. O Matéria-Prima, que tem quase trinta anos, embora eu nunca tenha conduzido este, sei que ele é super importante na grade da emissora, então os programas têm sido uma escola à parte para os alunos da UFG.
J – Quantos programas/projetos os alunos produzem?
RP – Eu não posso te dar certeza absoluta, pois outros professores podem estar à frente de outros projetos que eu não conheço, mas falando dos programas que eu coordeno e os da professora Flora, temos quatro programas na grade semanal, o Estação Esportiva, o Goiacast, o Matéria-Prima, e também o Doutores da Bola com transmissões ao vivo, são esses programas que os alunos têm atualmente na emissora.
J – Quais os dias e horários que esses programas/projetos que os alunos produzem vão ao ar?
RP – O Goiacast e o Estação Esportiva são diários, de segunda a sexta das 17:30hrs às 18hrs [o Goiacast das 17:30hrs às 17:45hrs e o Estação Esportiva das 17:45hrs às 18hrs] o Matéria-Prima vai ao ar no sábado às 9hrs da manhã, já o Doutores da Bola varia, esse programa tá em recesso por conta da Copa do Mundo e o término da temporada [esportiva], esse programa é mais variado, vai depender dos horários dos jogos, pode ser durante o fim de semana ou noites durante a semana, e por não ter um horário fixo essa programação foi transferida para o streaming dois [no site da emissora]
J – Como é a rotina dos alunos nesses projetos?
RP – Nos programas diários, das 14hrs às 18hrs, a produção é escalonada para os alunos, que atuam de acordo com a disponibilidade. Há uma certa dificuldade por conta do próprio PPC, pois existem muitas matérias obrigatórias na parte da tarde, mas mesmo assim sempre nesse horário existe um grupo de alunos que inclusive apresentam das 17h30 às 18h, por conta de estágios, alunos que precisam trabalhar atualmente como já tivemos uma condução facilitada desses dias de trabalho e atividades.
J – A participação nos laboratórios se torna um diferencial no mercado de trabalho?
RP – Não tenho dúvidas, de que sempre foi um acréscimo muito importante. Sinto isso nas procuras de ex-alunos que passaram pelo projeto, pedem uma declaração, um documento que comprove essa passagem, sei que o mercado gosta muito disso, dessa experiência na rádio universitária, e ela tem sido um diferencial, mais do que isso, é a formação mesmo que você enxerga depois. Por exemplo, na área do jornalismo esportivo, como eles ingressam no mercado de trabalho, é uma coisa bacana mesmo, é uma formação que permite, dá liberdade para o aluno criar, errar, e ao mesmo tempo ele sentir uma certa segurança emocional e intelectual para poder executar uma atividade no mercado de trabalho.
J – A rotina nos laboratórios tenta emular um ambiente profissional. Isso ajuda os alunos no mercado?
RP – Acredito que sim. É muito importante essa responsabilidade, o comprometimento, o senso de equipe, questões éticas, de relacionamento. Gosto de reforçar isso, a pontualidade, assiduidade, começar a estabelecer alguns pactos éticos, algumas ideias que tragam um resultado positivo, assertivo para atividade posterior desse aluno. Todos os critérios, essa relação que existe, de equipe, de produção, improviso, socialização, autoavaliação. Existe uma série de questões que o aluno vive nos laboratórios, que acrescentam muito a eles, que criam uma maturidade neles, para eles entrarem no mercado de trabalho de maneira mais adequada e segura.
J – A rádio vai passar a ser de frequência FM a partir do ano que vem, por conta disso a direção da rádio já declarou que pretende remover os alunos da grade de programação, o argumento seria um suposto aumento de competitividade. Você acredita que esse ganho realmente existirá? Uma rádio não comercial deveria ter esse tipo de pensamento central?
RP – Primeiro, é uma perda lastimável para as duas frentes, tanto alunos quanto a rádio, uma vez que os alunos estão na grade da rádio desde pelo menos os anos 1970. Não faria nenhum sentido tirar os alunos da grade de programação, tem que haver esse cuidado, essa negociação, se espera um bom senso tanto da parte dos gestores (da rádio), quanto da parte pedagógica e profissional para que a coisa continue funcionando. Quanto à competitividade, eu não vejo problema, por exemplo na emissora conseguir recursos, sejam eles privados ou públicos, acho até relevante ter alguma gestão, algum financeiro, uma vez que, hoje ela não tem nenhum orçamento, se tornando uma coisa sem muito sentido, sem muito espaço, sem muito significado.
A rádio acabou perdendo muito, nesses anos, eu percebo que até pela desimportância do rádio no passar dos anos, a frequência AM defasou, é algo fora dos padrões, ruim de ouvir, a programação clássica que também não faz sentido nesse tipo de frequência. Passar para FM é excelente, acho ótimo, acho que realmente ela (diretoria) vai ter que repensar muito. Isso parte de uma discussão dos gestores, da Reitoria, dos alunos, discutir isso com a comunidade universitária, o que se quer para a rádio da UFG, pois hoje não vejo um norte, não vejo algo claro como um: “olha, essa programação vai ser assim”, e ela ter uma programação mais autêntica, que olhe para Goiás e deixe de ser algo pasteurizado que hoje é o que mais se ouve na rádio universitária.
J – Na resposta anterior você disse que a mudança na programação da rádio não tem um objetivo claro, mas no que já foi anunciado, os alunos estão perdendo esse espaço. Isso de alguma forma é benéfico?
RP – Não. Isso é uma medida autoritária, tomada sem discussão. Como professor, meu sentimento é o mesmo dos alunos, de estar vivendo esse presente forte. Amanhã posso não estar lá, pode ser outro professor estando à frente do projeto. Agora os alunos, precisam ser mantidos. É um laboratório importantíssimo, de um aprendizado muito grande, a rádio adquire uma relevância muito maior ao abrir esse espaço para os alunos, a gente vê hoje rádios burocratizadas, rádios fechadas, sem utilidade, muitas rádios universitárias aparecem puramente por concessão, pois não abrem espaço para os alunos, sem diálogo com a comunidade acadêmica, isso é péssimo.
Essa coisa de manter os alunos tem que ser levado em conta, os alunos têm que bater o pé e exigir esse espaço, embora eu tenha oito, dez anos na rádio eu não sei se amanhã eu estou lá, ou coisa assim. Mas os projetos, eles não podem sair, precisam ter uma sequência, isso é fundamental para emissora e para o curso de jornalismo da FIC, UFG.
J – é possível mensurar a perda de qualidade na formação dos futuros jornalistas formados na UFG, caso essa ideia prossiga da forma que está?
RP – Eu não sei se é possível mensurar, mas a perda de qualidade seria enorme. Eu não acredito que essa perda se concretize, acredito que haverá conversas, pois simplesmente não pode se estabelecer isso, pelo contrário: a direção deveria convidar os alunos para discutir a nova programação da rádio, chamar também a comunidade, tirar desse lugar errado de “não vai haver laboratórios”, como vem se comentando.
É uma perda muito grande para a formação, ela é uma escola à parte, e não existe na universidade um outro espaço que ofereça tantas possibilidades quanto a rádio universitária, uma coisa diária, que traz o frisson da produção, da apresentação ao vivo, das transmissões, isso só o rádio permite, não temos outro espaço parra isso, não podemos de forma alguma perder esse espaço, até porque o próximo PPC prevê apenas uma disciplina de rádio, prevendo esse espaço de laboratório, de projeto, para instigar essa formação para quem tem interesse na área do áudio. Sei que muitos alunos não têm esse interesse, alguns tem interesse na área gráfica e outras áreas, mas para quem tem interesse nas mídias eletrônica, tem que ter essa experiencia, tem que passar pela rádio.
Nota do repórter: informações indicam que as discussões seriam sobre a forma com que os alunos continuariam fazendo seus programas, e não sobre a existência desses programas.