O impacto da ‘vida perfeita’ dos influenciadores digitais nas redes sociais

Com o avanço das redes sociais, surge a profissão de influencer digital, e com ela a potencialização dos níveis de insegurança e comparação na vida dos usuários
Tempo de leitura: 9 min
THAYNNA BORGES SILVA

A primeira rede social conhecida mundialmente até os dias de hoje é o Facebook, e foi criada em 2004. Os reels, stories, tweets, status do whatsapp, e outras ferramentas hoje usadas em larga escala, tiveram seu pontapé inicial graças a criação de Mark Zuckerberg. 

O Brasil, fazendo jus ao título de penta, ficou em quinto lugar no ranking de países com mais usuários de internet do mundo, com 165 milhões, de acordo com pesquisa realizada pela empresa Statista, no ano de 2022. Em dezembro de 2022, a plataforma Mobile Time, juntamente com a Opinion Box, observaram em sua pesquisa que o Instagram está presente em 92% dos celulares brasileiros, e é o aplicativo em que 35% mais passam seu tempo do dia. 

Foto: Thaynná Borges

Apesar de apresentarem diversos impactos positivos na vida do usuário, como conexão com amigos e familiares, entretenimento, networking, etc. as redes sociais também apresentam um lado conflituoso, e podem ser usadas como mecanismo de regulação emocional. Isto é, cotidianamente apresentamos picos de instabilidade emocional – em uma manhã estou bem, mas na noite estou triste, ou em um dia estou ansiosa e no outro mais tranquila – e ao usarmos as redes sociais como ferramenta para suprir essas emoções ou pensamentos negativos, estando em um período de vulnerabilidade, podemos nos deparar com consequências muito negativas na saúde e no bem-estar, como: comparação, vícios, distorção de imagens, perda da habilidade de se conectar e lidar com emoções, utilizar o celular para escapar da realidade e outros problemas associados. 

Ícaro Carneiro, de 19 anos, relata que por mais que não ceda totalmente à pressão das redes sociais, existe uma parte que acaba não resistindo, mesmo que por poucos segundos.

“Na minha viagem, em alguns momentos me ocorreu o pensamento de que eu deveria tirar alguma foto para poder postar, mas acabei não dando ouvidos porque de qualquer forma eu já tinha postado foto na praia e as pessoas iam pensar ‘ele só vive na praia’ então resolvi não tirar. 

Crianças e redes sociais

Esse pensamento não é exclusivo, e na realidade está sempre presente na cabeça de vários usuários. A dúvida se é aesthetic (estético) o suficiente, ou qual filtro usar para melhorar a foto, está presente tanto na cabeça de jovens, quanto, infelizmente, de crianças. De acordo com entrevistas do site de notícias Mobile Time e a empresa de soluções de pesquisas Opinion Box, do ano de 2020, o Youtube é a rede social mais usada por crianças de 0 a 12 anos, estando presente no celular de 69% dos usuários, seguido por Whatsapp (47%). O TikTok e Instagram estão presente em, respectivamente, 36% e 26% dos celulares dos usuários.

Em entrevista ao LabNotícias, P. V, de 10 anos de idade, divide sua opinião e vivência nas redes. 

“É muito estranho porque eu sempre tive medo de ser julgada no Instagram, TikTok ou no Twitter. Eu já deixei de postar foto porque meus amigos me disseram que eu estava feia, ou então que não seria aesthetic o suficiente. Tem também a comparação com os influencers: eu não sigo muitos, mas já me comparei demais, principalmente meu corpo. Eu sentia que ele era feio só porque eu não tinha um igual ao delas. No twitter às vezes me dá receio de comentar alguma coisa e as pessoas não gostarem e virem discutir comigo. Agora eu já não sou mais tão assim, mas ainda me sinto insegura ao postar uma foto e com medo de alguém me criticar nos comentários.

Vinícius, de 15 anos, também compartilha sua experiência nas redes sociais, onde está presente desde os 10 anos de idade.

“Eu já me comparei muito. O corpo de um influenciador que eu queria ter, a decoração do quarto, as roupas que ele comprava, etc. Já cheguei a querer renovar todo meu guarda roupa para parecer mais com o dos influencers que eu acompanhava, e até cheguei a comprar um Iphone para poder melhorar as fotos. Eu me sinto triste porque ainda sou muito novo – tanto que estou tentando diminuir meu tempo de uso – mas me sinto muito inseguro ao postar alguma foto, storie ou algo no TikTok. 

A comparação e o consumo são atividades que, infelizmente, são sempre incentivadas seja de modo consciente – como ao ver um influenciador recomendar um produto, ou hábito, com frequência e decidir seguir as dicas – ou então de modo inconsciente – quando apenas por estar presente em um ambiente você acaba adquirindo novos comportamentos sem se quer analisar eles, como o caso de adquirir um novo um sotaque porque se mudou para outra região.

Os digitais influencers

Com o espaço que as redes sociais foram conquistando na vida dos usuários, surge a comercialização das redes com os anúncios presentes, e também uma profissão para as pessoas que trabalham com a internet: o digital influencer. Tendo como pioneiros dessa profissão o youtuber Felipe Neto e a blogueira Camila Coelho, atualmente existem até cursos profissionalizantes para quem deseja seguir na ‘carreira’ como, por exemplo, o curso online oferecido pela Escola Britânica de Artes Criativas e Tecnologia, a EBAC. 

A estudante de economia e psicologia, Maria Nogueira Maia (@maria_nmaia), que conta com mais de 70 mil seguidores no Instagram, compartilha vídeos que encorajam o público a seguirem sua melhor versão, através de dicas de hábitos saudáveis e algumas reflexões. Em entrevista ao LabNotícias, Maria compartilha que todo seu conteúdo é pensado para ajudar o público: 

“Penso muito no que publico. Tenho cuidado de colocar alertas de possíveis gatilhos, e não compartilhar conteúdos que podem causar comportamentos danosos, como comparações excessivas.

O impacto das redes não é unilateral: no fim das contas, tanto os seguidores quanto os influencers estão sujeitos à comparação e a receber comentários negativos – onde os influenciadores, por terem alcance maior, acabam recebendo uma onda maior de comentários danosos. Em relação à experiência negativa da internet, Maria Nogueira comenta que recebe muitos comentários e críticas sobre seu corpo: 

“Tendo engordado, emagrecido, nunca será o suficiente para todos. É muito fácil criticar algo que vemos online! Já me senti muito insegura, mas eu faço terapia, e me lembro sempre de que nada daquilo me define! O que as pessoas veem é apenas uma fração minúscula da minha vida, não a minha verdade e a opinião dos outros reflete mais a realidade deles do que a minha.

Reprodução: Instagram @maria_nmaia

O que psicologia diz à respeito?

Graduado em Psicologia pela UNIP – DF (2016), Felipe Natan Alves tem pós-graduação em psicoterapia cognitivo comportamental e é dono do perfil Psicopydia (@psicopydia) onde posta conteúdos sobre comportamento e psicologia. Em entrevista ao LabNotícias, Felipe comenta a respeito do impacto das redes sociais na vida dos usuários, e dicas para reduzir o uso do celular. 

É seguro afirmar que as redes sociais têm relação com o surgimento de problemas psicológicos?

Felipe: É difícil apontar uma única causa para o surgimento de um transtorno psicológico, mas podemos dizer que potencializa: digamos que temos uma pessoa com ansiedade social e, para fugir de uma situação de interação social, ela pode encontrar como refúgio o celular ou alguma rede social. Se ela consegue aliviar a ansiedade ao usar o celular, ela vai querer usar o dispositivo para regular essa emoção e fugir cada vez mais do contato presencial, potencializando o transtorno.

Por estarem em uma fase mais influenciável, qual o impacto que as redes sociais causam nas crianças e adolescentes? 

Felipe: Pode haver um impacto muito negativo na aprendizagem, mas não só. Nosso cérebro é uma máquina de fazer comparações e as redes sociais potencializam isso no sentido negativo: se eu sempre vejo pessoas que conhecem mais sobre um assunto do que eu, tem uma vida perfeita, ou é uma pessoa tão feliz, isso vai ter impacto no meu bem-estar. Quando a gente sente que está sendo excluído de um grupo digital, ou então quando recebemos menos likes em uma foto do que estamos acostumados, isso vai desencadear emoções desagradáveis. Na criança, quando ela está inserida desde nova no ‘social’, esses impactos vão ser maiores no desenvolvimento emocional.

Quais os impactos em quem trabalha com as redes sociais? 

Felipe: Existe um termo chamado Efeito Observador: se eu sinto que estou sendo observado, eu não vou me comportar como normalmente agiria. Portanto, se eu tenho vários seguidores, além de gerar um desgaste por ter que produzir muita coisa, tem também a falta de autenticidade ao ter que cumprir uma demanda do que as pessoas querem consumir, o que me impede de postar algo que eu queira apenas porque não é o que aquele seguidor vai querer ver ou a imagem que eu quero passar. Além de também todo o estresse por ter que ficar constantemente conectado, e os comentários que se pode receber.

Qual sua recomendação em relação ao uso das redes sociais? 

Felipe: Para mudar esse comportamento, é necessário mais que apenas a força de vontade, eu preciso mapear esse hábito, identificar o que eu ganho com aquilo, e também atualizar o valor de recompensa. Então seriam três passos:  

1) Afastar-se do celular em alguns momentos específicos, como trabalho, e se não puder, dificultar ao máximo o acesso a essa rede, como desligar as notificações.

2)  Perceber em quais situações eu uso mais o meu celular. Qual a razão para usar o celular agora? É por que estou querendo ter um momento de tranquilidade, ou é por que estou me sentindo mal com alguma coisa? 

3) Refletir sobre a possibilidade de uma ‘Bigger Better Offer’, ou seja, a possibilidade de ter uma oferta maior e melhor para substituir o comportamento de utilizar o celular, como ligar para um amigo, tomar um banho quente, ler um livro, etc. 

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