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Cético ou não, chegará o momento em que você se verá no limiar entre a fé e o racionalismo científico. Talvez isso seja um pouco óbvio, mas quando vivemos esse limite o engasgo é maior do que parece. Sou uma pessoa de fé, daquelas que acredita em múltiplas religiões, deuses, entidades, energias, cristais, tarot, e tudo que o jovem místico gosta. Mas também sou do método científico, da dialética, do óbvio, da justiça e da realidade social. Fui ao encontro do limite da fé diversas vezes e, em uma experiência muito específica, ficou claro que jamais vamos encontrar uma resposta para o equilíbrio entre crença e teses.
O mês é novembro, o ano 2022. Após uma crise de Burnout (Síndrome do Esgotamento Profissional ), decido passar alguns dias em uma comunidade hippie na Chapada dos Veadeiros. A região em Goiás, perto de Brasília, é famosa pela natureza exuberante, cachoeiras, turismo ecológico, eventos alternativos e outros cenários ¨good vibes¨. Estar em contato com pessoas incríveis na natureza e todo o contexto da Chapada é renovador, uma delícia, mas não tira a importância de aproveitar experiências com inteligência.
Passamos dias incríveis nessa comunidade, com direito a comidas veganas, oficinas de arte e música, lago de argila, nudismo, trilhas, música, acampamento…Um processo intenso de autoconhecimento e desintoxicação do frenesi da cidade grande. Em um desses dias subimos o morro para apreciar o pôr do sol e realizar a ¨Medicina do Cacau¨, ritual ancestral que consiste em derreter o cacau e ingeri-lô para aproveitar os benefícios do fruto para na saúde física e psicológica. Não bebi nada de cacau, até por que sou alérgica, mas estava entregue ao momento.
Todos em volta da fogueira, em cima da rocha de meteorito, numa altitude considerável, rodeados por árvores. De repente começa uma tempestade arrebatadora, com chuva, raios e relâmpagos. O grupo de mais ou menos vinte pessoas poderia ser atingido por raios a qualquer momento. Segundo a ciência é lógico, racional, se abrigar de uma tempestade de raios. Estava à noite, escuro, e tudo que eu queria era descer daquele morro e voltar para a casa central. Mas parece que eu era a única que tinha preocupações com as leis da física alí. O pessoal queria mesmo era sorrir, viver a tempestade, continuar com as cantigas da roda e celebrar o amor em volta do fogo.
Não teve jeito, o pânico atacou, estava naquela situação de se correr o bicho pega e se ficar o bicho come. O jeito foi apelar para a fé totalmente. Enquanto todos se abraçavam e cantavam eu fiquei apertando a mão do meu ex-namorado, deitada em uma canga, fazendo todas as preces que já havia aprendido na minha vida, principalmente o Salmo 91. Dizem que o Salmo 91 é o mais poderoso da Bíblia. Também apelei para seres elementares da mata, fadas, duendes, e tudo que tinha direito. Era a ciência e a fé batendo de frente, ao vivo e a cores.
A tempestade não passou, as trovoadas ficavam cada vez mais fortes. Tinha certeza de que a morte chegaria e seria eletrocutada. Porém, percebi que acima de nós o céu estava limpo. Como mágica um pequeno círculo de céu limpo se abriu sob o grupo. A chuva e os raios caíam, mas não acima de nós. Na hora eu não queria explicação científica para aquilo. Só agradeci. Os porquês científicos e religiosos estavam muito misturados. Na maioria das vezes é assim. Fé na fé, e fé na ciência.