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Talita Prudente

Esperto em cada minutagem, longa faz críticas de forma lúdica ao sistema que criou a própria boneca: patriarcal, consumista e perfeccionista.

O ¨hype¨ de Barbie não se justificará só pelo marketing estrategicamente bem feito pela Warner Bros . Estreado este mês, o filme dirigido pela americana Greta Gerwin e estrelado por Margot Robie e Ryan Gosling cumpre o que promete e não decepciona os fãs. O longa é uma das produções mais esperadas dos últimos tempos, acumulou 90% de aprovação no Rotten Tomatoes e já conquistou corações e mentes.

Além de usar e abusar do universo cor-de-rosa da boneca mais famosa do mundo, a narrativa surpreende ao abordar de forma crítica e bem-humorada pautas contemporâneas como feminismo, empoderamento, ditadura da beleza e consumo. Ou seja, o teor sátiro do filme, diferente do esperado, foi certeiro e envolvente.

Essa abordagem é contraditória, já que estamos imersos em motivos capitalistas para assistir ao filme, que inclusive acompanha a queda na arrecadação da Mattel com seu produto carro chefe. Coincidência? Não. Resgate de marca. Mas no momento vamos nos concentrar na qualidade do longa pois a jornalista militante que vos escreve está descansada.

Barbielândia

No filme, Barbie e Ken (elemento inicialmente sem muita importância pois é apenas o Ken¨ ), passam por uma jornada de autodescoberta, questionando seus propósitos e enfrentando uma crise existencial. Todos na Barbielândia, o mundo dominado pelas bonecas, acreditavam na utopia de que os problemas no mundo real haviam sido resolvidos com a invenção das diferentes Barbies, porém, descobrem que na verdade nada é perfeito com os humanos.

A virada de chave inicia quando a Barbie Esterioptipada, protagonizada por Margot Robie, começa a ter pensamentos sobre morte e o sentido da vida. A partir daí, a rotina na Barbielândia desanda e a boneca percebe defeitos no seu corpo.

Para investigar e resolver esses problemas, Barbie atravessa o portal para o mundo real, acompanhada por Ken. A protagonista se choca com a inversão de papéis entre homens e mulheres e como a empresa que a criou lucra em cima de meninas. Já Ken se deslumbra com o patriarcado e o poder sobe à sua cabeça, tramando uma rebelião na sua cidade mágica.

Durante a aventura caótica e espiritualizada para ¨salvar a Barbielândia¨, Barbie percebe os impactos negativos de seu esteriótipo (magra, branca e de olhos claros), mas também o quanto faz parte da memória de várias gerações.

Ao lado de novas amizades, a boneca acaba promovendo uma verdadeira aula de como dar voz às mulheres e resistir à opressões e injustiças machistas. Afinal, assim como a Barbie, as mulheres podem ser quem elas quiserem. E o Ken? Greta Gerwing deixa claro que a solução em relação aos homens não é tão simples, mas abre espaço para possibilidades.

Destaques e faltas

Poderoso

Barbie propõe críticas profundas mas que são fáceis de serem interpretadas, até mesmo por uma criança. O público não precisa ter lido livros sobre feminismo, estudado a história do patriarcado ou ter escutado podcasts sobre sociologia para entender a mensagem do longa. Isso é um alívio!

Que os amantes de filmes cult e os chatos haters da cultura pop que me desculpem, mas que delícia assistir uma produção inteligente e fácil de digerir! Por mais filmes que tragam à tona discussões sociais atualizadas de forma acessível e orgânica. Esse poder transformador a cultura pop tem em mãos.

Atores

A atuação impecável de todo o elenco já era previsível, disso ninguém duvida. Acontece que Ryan Gosling entregou tudo e mais pouco. Ele performa uma verdadeira caricatura, bem exagerada, da masculinidade. Se você tiver uma masculidade frágil pode sair irritado e ofendido do cinema (essa é a piada, risos).

Também precisamos enaltecer a dedicação de Ariana Greenblatt para interpretar Sasha, filha da personagem Gloria (America Ferrera). Ariana tem 15 anos e convenceu total no papel da adolescente frustrada com a vida, que odeia rosa, madura até demais para a idade e com o sarcasmo nas alturas.

Dance, dance!

Outro destaque vai para a trilha sonora que quase me tirou da cadeira para dançar no meio do filme. Com faixas de astros do pop como Nicki Minaj, Karol G, Tame Impala e Dua Lipa, a trilha inteira gruda na cabeça e você entende por que as músicas viralizaram no Tik Tok e no Instagram. Cheguei da estreia ouvindo Barbie World e Dance The Night em looping.

Agora uma curiosidade que talvez explique o sucesso sonoro do filme: toda o projeto da trilha de Barbie foi conduzido pelo produtor executivo Mark Ronson (famoso por sucessos como Valerie, de Amy Winehouse, e Uptown Funk, de Bruno Mars).

Dose negativa

Depois de apresentar os destaques, vamos à crítica negativa…Sim, uma única crítica. Cuidado pois aqui vai um spoiler. No final do longa, a Barbie Esteriotipada se torna humana mas infelizmente há poucas cenas desse momento.

A cena da Barbie na ginecologista é no mínimo extraordinária e seria interessante saciar melhor a vontade do espectador em ver a vida como humana no cotidiano da personagem. Não tenho certeza se a Mattel já pensa em um Barbie pt.2, mas o ponto é que temos um vácuo narrativo ao final do filme.

Barbiezada

Quem foi na estreia e gostou bateu palma, quem não gostou teve que aceitar ser engolido pelo mar rosa na saída do cinema. No fim das contas, o filme é um entretenimento que conseguiu unir tribos e gerações do mundo todo como há tempos o cinema americano não fazia.

Essa moda toda em torno da Barbie vai passar, igual qualquer tendência, mas a nostalgia, o sentimento de pertencimento e o esclarecimento em torno de pautas feministas que o filme provocou vai ficar para sempre grudado nas pessoas que o assistiram, principalmente em meninas e mulheres.

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