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Todo jornalista esportivo sonha em um dia cobrir um grande evento mundial. Seja ele a Olímpiadas, a Copa do Mundo ou os Jogos Pan-Americanos. A oportunidade e realização de trabalhar num lugar como esse que atrai os olhos do mundo inteiro é comum nas pessoas que trabalham ou irão trabalhar na área.
Você trabalhou em diversos eventos esportivos, cobriu Copa do Mundo, Olimpíadas. Qual é a maior dificuldade de você ir para um evento como esse e brigar por espaços com outras grandes redes de comunicação? Você briga por espaço? Como é que é essa vivência que o público não vê?
R: Seja atrás de uma informação, seja pelo espaço numa entrevista coletiva, a gente briga sempre com os grandes veículos. Não são todos os veículos que podem ir pra Copa do Mundo. Os veículos precisam pagar para estar nesses eventos. Os direitos são relativamente altos, você paga por direitos, paga por espaços. A partir do momento que você adquire os direitos é pago um valor, vou falar valores aleatórios, você paga 500 mil para transmitir a Copa do Mundo, os Jogos Olímpicos, você pode transmitir de onde você está. Para transmitir de um estádio? É mais um valor. Se eu não tenho direito, não posso fazer uma narração da televisão, não posso usar um áudio do evento, “ah o Neymar deu entrevista” não posso ir lá pegar a entrevista da Globo, do SBT ou da Record ou de alguma outra rádio que comprou direitos e usar, não, isso eu estaria me apropriando de algo que não é meu. Alguém pagou por aquele conteúdo. Então, a primeira coisa que você tem que fazer é comprar o direito. A partir dos direitos você começa a comprar uma posição no estádio, uma posição no centro de imprensa, acesso a sala de coletiva, a zona mista e é cobrado um outro valor à parte para estar dentro desses locais. Tudo é negócio. A FIFA ganha muito dinheiro com ingressos, patrocinadores, e também muito dinheiro com isso. E também, qualquer “coisinha” que você queira, você paga. Para você ter uma lixeira no seu centro de imprensa, você precisa comprar a lixeira que está dentro do caderno de opções da FIFA. A primeira coisa necessária a fazer quando se pensa em transmitir um evento internacional – fala se de Copa, Olimpíadas, Copa América, Panamericano, tudo se cobra direito – é pagar por esses direitos e a partir disso entender quanto que isso vai custar. É um investimento muito alto e às vezes você consegue o retorno quando você consegue muitos anunciantes. Às vezes você não consegue o retorno porque você não conseguiu trazer muitos anunciantes, mas existe algo que é até difícil de calcular, a sua marca estar numa Copa do Mundo. Existe um valor que agrega por muitos anos, a rádio Sagres fez a Copa do Mundo, isso sem dúvida nenhuma traz um status, vira uma referência.
Qual a diferença de você cobrir um grande evento esportivo como esses que citamos para um jogo de Campeonato Brasileiro, por exemplo? Um evento de menor porte?
R: A diferença é muito gritante e começa do patamar de importância do evento, e passa pela sua organização. Um jogo de Campeonato Brasileiro é sim organizado, tem suas regras, suas diretrizes, seus protocolos, o repórter pode fazer isso, ele não pode fazer aquilo, tem tudo isso, mas nos Jogos Olímpicos, por exemplo, existe uma organização maior até para valorizar quem paga. Eu estou pagando, eu tenho que enxergar o meu microfone, ele precisa ser bom, estar funcionando perfeitamente, não pode dar problema, na zona mista meu lugar precisa estar ali… Não existe concorrência com veículos que não pagaram direitos, até porque eles nem entram nos estádios, nem entram nos centros de imprensa. A organização é muito maior, o critério. As regras são bem mais definidas do que eventos que não tem o pagamento de direitos.
O que você falaria para quem tá começando? Para alguém que estaria indo para sua primeira cobertura internacional?
R: Olha, quem sonha em fazer uma Copa do Mundo, sonha fazer os Jogos Olímpicos e está começando agora na faculdade, aprenda o inglês. É importantíssimo. Os responsáveis pelos eventos não possuem essa preocupação “eu preciso falar português porque vem veiculos de Portugal, do Brasil”, “eu tenho que aprender a falar espanhol porque tem emissora da Argentina, de Honduras, do México, do Paraguai” Não, o inglês é um padrão do COI (Comitê Olímpico Internacional) e da FIFA. 95% das pessoas que estão nesses eventos organizando falam o inglês. É bom para você se comunicar. Você fala português? Ok, você vai entrevistar o jogador, o atleta brasileiro. Mas poxa, tá passando ali o Mbappe e eu não vou fazer nenhuma pergunta porque ele não entende português? Esses grandes eventos você tem oportunidade de entrevistar essas personalidades, porém elas falam outros idiomas, o inglês a maioria compreende, então é importantíssimo se preparar para esse tipo de evento. Comprar seu espaço ali é caro, estando naquele lugar é preciso aproveitar de todas as formas.
A Internet e o streaming como novas formas de cobertura esportiva
Como você vê a internet, canais independentes, nessas transmissões e coberturas? É uma concorrência a TV consolidada? Existe espaço para os dois segmentos? Qual sua avaliação?
R: Que é uma concorrência é. Se a Globo tinha 90% da audiência no jogo da seleção, em um jogo de Copa do Mundo, ela não está mais sozinha. Vai ter 89%, 85%, 80% dependendo da qualidade do streaming. Os números apresentados pelo Casimiro por conta da Copa do Mundo foram números relevantes, isso vem da qualidade da transmissão dele, a imagem é o mesmo padrão da Globo que são imagens geradas pela FIFA, não existe aquilo de “meu camêra é bom”, as imagens são as mesmas para quem pagou os direitos. E eu vejo como muito legal, muito importante esse tipo de movimento, as opções do streaming, da TV Cabo, da TV aberta. É também um caminho sem volta e evidentemente que a televisão vai se adaptando a isso. A Globo está se adaptando, talvez ela veja que não seja tão interessante transmitir todos os jogos. Aí ela vai escolher jogos e vai pagar menos por isso, evidentemente. Nisso abre espaço para quem pode transmitir todos os jogos e tem espaço na grade, porque às vezes um jogo Japão e Paraguai, por mais que seja uma Copa do Mundo não vai dar a mesma audiência do que transmitir uma novela, um seriado, um filme e a Globo pensa isso, obviamente. Logo, essa opção do streaming é fantástica e claro que as grandes emissoras estão se adaptando a isso.
Jornalistas – como o André Hernan, por exemplo – indo de grandes emissoras para a internet e fazendo trabalhos independentes. Como você enxerga esse movimento? É uma nova tendência?
R: Já pensou se a gente tivesse só a Globo? Só Bandeirantes? Só a Record? Só o SBT? Apenas essas emissoras não conseguem absorver tanto material humano. Quanto mais espaço para que outros veículos possam estar transmitindo jogos, competições, seja Olimpíadas, Copa do Mundo, campeonatos mundiais e sul-americanos, melhor. A Globo tem Copa do Brasil, Copa Libertadores, que a Paramount e a ESPN também possuem, o SBT tem sul-americana, existe uma diversificação dos conteúdos em várias plataformas, em televisão aberta, fechada e streaming e é natural que os profissionais eles migrem para isso, às vezes o André não tivesse – por mais que eu gosto muito dele, ele tem muita qualidade – mais espaço por lá, mas tem em outros lugares. Tem espaço para todo mundo, antes era mais difícil, imagina o número de profissionais que ficaram pelo caminho que não conseguiram avançar, que desistiram e foram para outros segmentos por falta de oportunidade. Eu brinco com os meninos aqui que são mais novos, antigamente nós tínhamos dois jogos de futebol por semana, e quando a Bandeirantes trouxe o Campeonato Italiano foi fantástico, e era um jogo só por semana. Tinha o Maradona, o Careca, o Platini, era o maior barato. Hoje a gente consegue assistir todos os jogos do Campeonato Italiano, do Inglês, do Espanhol, do Holândes, do Português, qual jogo no mundo hoje não é transmitido? Partidas da 3ª divisão do Campeonato Goiano são transmitidas, e com isso precisamos de mais narradores, comentaristas, repórteres e para nós da comunicação isso é fantástico.
Charlie, você que esteve em Santiago há pouco, você enxerga esse Jogos Pan-Americanos um pouco escondido do público, por ser transmitido apenas pela internet? E isso demonstra a força da TV aberta?
R: Casemiro com o projeto é legal, o streaming tá crescendo para vários segmentos, no YouTube, com influenciadores, tudo isso faz parte e eu acho super necessário e importante esse crescimento, mas a gente tem que entender que TV aberta tem um alcance, uma penetração gigantesca que o streaming vai demorar muito tempo e talvez nunca chegue próximo a esse alcance da TV aberta. TV aberta é TV aberta, sabe?! E quando digo isso não é diminuindo o streaming, e sim potencializando o alcance da TV aberta, porque nós estamos falando de um país com mais de 200 milhões de habitantes, não é todo mundo que tem o hábito de conectar a sua televisão ao YouTube. Então, a gente ainda tem a TV aberta como uma uma uma fonte de divulgação muito forte é claro que sim a Globo transmitindo, o SporTV, a ESPN, a Record, o SBT certamente a gente teria uma visibilidade maior para o evento. Eu concordo com você, o evento tá meio que escondido pouca gente tá falando, para a gente que milita na crônica esportiva é claro que a gente tá lendo toda hora, tá vendo, tá tendo o conhecimento, mas nós somos do esporte o público no geral, ele tá ficando órfão da competição muito por conta da falta da TV aberta. Se ano que vem – isso não vai acontecer porque a Globo já tem os direitos – as Olímpiadas não fosse transmitidas na TV aberta, o seu impacto seria bem menor aqui para nós.