‘Sou só um rostinho bonito, eles dizem’: Ananda Leonel comenta sobre as mulheres no cenário de games

Editora, produtora, jornalista e streamer nas horas vagas, Ananda fala sobre como é difícil trabalhar em áreas predominantemente masculinas
nov 1, 2023 , , ,
Tempo de leitura: 5 min
Ananda Leonel no GeekVerse Festival. (Imagem: Reprodução/Ananda Leonel)

O cenário de e-sports está alcançando cada vez mais espaço na sociedade, mas um cenário predominantemente masculino. As mulheres tentam conquistar seu espaço, mas vindo de uma sociedade patriarcal machista é um desafio no dia a dia delas. Ananda que há anos trabalha com isso, conta sua experiência sendo a primeira colunista mulher no Goiás de games.

Como começou a sua carreira no cenário de jogos? Como foi o processo de chegar aonde você está hoje? O Aperta o Play foi criado do zero. Eu mesma desenvolvi o roteiro e produzi as reportagens, pois convencer um veículo de comunicação a comprar essa ideia foi muito trabalhoso. Não foi fácil. Basicamente, eu criei um projeto completo para mostrar o esforço que eu estava fazendo. Quando consegui espaço para o programa de jogos na TV aberta, foi uma conquista significativa. Vou ser bem honesta, não é fácil ser mulher e trabalhar com jogos. As pessoas olham para mim e dizem que eu sou apenas um rostinho bonito, que não sou capaz de liderar um projeto desse tamanho. Isso desmotiva, fiquei chateada, pois eu tentava pegar referências na área mas não achava porque elas não existiam.  Não existe uma jornalista em Goiás que trabalha com games, a gente não tinha coluna de games, não tinha nada, 2 anos com o programa no ar, me tornei a primeira colunista de mulheres do Goiás.

Como foi participar do GeekVerse Festival? Tem algum trabalho que você se sente mais confortável fazendo? Acho que todo trabalho sempre vai ser uma experiência, um desafio. Meu TCC foi sobre a cobertura jornalística de esportes sobre o Goiás, pois fui a primeira apresentadora a comandar campeonatos. Eu confesso que amo todos os trabalhos que faço, porque gosto muito de comentar, principalmente se for Valorant. Gosto de aprofundar em tudo que está em cima do palco, de fazer perguntas técnicas e de entender tudo no jogo. Estou apresentando o concurso de cosplay da Copa Goiânia, o que é sempre gratificante. Eu topo tudo, sempre digo que sou uma eterna aprendiz, pois não sei de tudo e nunca saberei. O GeekVerse foi gratificante, já apresentei Fifa, o que foi meu maior desafio. Já fui obrigada a cobrir futebol, então tinha um conhecimento básico, mas durante três meses antes do campeonato, joguei para aprimorar meus conhecimentos sobre o assunto. Faço isso sempre que me apresentam alguma proposta relacionada a um jogo que não conheço muito.

Como você lida com o fato de ser uma das únicas jornalistas gamers em Goiás e como incentiva outras mulheres a trabalhar neste nicho? Eu tenho uma parceria com a Primetek e estamos criando um projeto para realizar o primeiro campeonato feminino em Goiás. É muito difícil encontrar mulheres, então queremos mostrar que existem espaços para elas. Eu quero mais mulheres aparecendo na tela. Quando se trata de mulheres, as coisas sempre são mais burocráticas e sinto isso em todas as vertentes em que trabalho. Sempre que falo sobre trazer mais mulheres, já ouvi comentários como “Ah, mas ela é magrinha?” ou “Ela faz dancinha de TikTok?”. Eu respondo que a pessoa tem conhecimento do assunto, porque não perguntam sobre sua bagagem de conhecimento e currículo e sim sobre suas características físicas.

Você enfrentou alguma situação específica de ataque machista, seja durante o trabalho ou nos momentos de lazer? Houve uma situação em uma negociação em que recusei um trabalho, não vou citar nomes, mas faz alguns anos. Em nenhum momento me perguntaram sobre meu currículo ou experiência. A primeira coisa que o contratante falou foi sobre minha roupa. Isso foi um problema para mim. Fiquei pensando por que ele se importava com isso em vez de outras questões relevantes. A galera que trabalho até hoje, Primetek, Copa Goiânia, sempre fui muito respeitada, me trataram super bem, então o cenário está mudando bastante, foi essa questão específica. Eles confundem nossa educação com outras coisas, tem que impor respeito, a gente vai ter que ser mais séria, para perceber que é meu trabalho. 

Como você lida com a competitividade no meio das transmissões de jogos e como busca reconhecimento sendo mulher? Se olharmos para os cinco streamers mais assistidos do Brasil, provavelmente não haverá uma mulher entre eles. Infelizmente, é uma realidade que não podemos ignorar, e parece que a cultura ainda valoriza mais o universo masculino. Existe uma questão histórica por trás disso, uma coisa do patriarcado, desde os primórdios dos jogos. Infelizmente as mulheres não são vistas da mesma forma, com o mesmo respeito que os homens têm. Claro, hoje temos nosso espaço e as coisas estão mudando, graças às diversas mulheres incríveis que abriram as portas. O cenário hoje é outro, mas ainda não vejo a mesma proporção. Confesso que pensei várias vezes se voltaria ou não para a Twitch. No início, é difícil manter a constância. No entanto, tento levar a minha comunidade das redes sociais para acompanhar minhas transmissões e eles acabam indicando para outros amigos. A comunidade gamer apoia muito as pessoas, especialmente as mulheres.

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