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No dia 27 de setembro de 2023, a Valve Corporation realizou o lançamento do Counter-Strike 2, a quinta grande atualização do jogo desde seu primeiro lançamento no ano de 1999. Desde o século passado, a dinâmica do game segue a mesma. Os confrontos se organizam em duas equipes, com 5 jogadores cada uma, divididos em contra-terroristas (CT) e terroristas (TR), ou simplesmente defesa e ataque respectivamente.
O objetivo dos atacantes seria plantar a bomba nos locais específicos demarcados em cada mapa, conhecidos como bomb sites, no qual cada mapa receberá duas posições com essa função, A e B, ou B1 e B2. Os CTs precisam defender os sites a fim de impedir que a bomba seja plantada, caso a defesa falhe, eles ainda terão 40 segundos para desarmar a bomba até a sua explosão. Se a mesma explodir, ponto para o time atacante, se desarmada, ponto para o time defensor.
Um jogo imortal?
Com uma dinâmica de jogo simples, o Counter-Strike se aprimorou ao longo dos anos e segue conquistando fãs e jogadores. Mas, como isso é possível? É comum no meio dos games a expressão, “esse jogo morreu”, ou seja, tal jogo é pouco praticado e comentado, não tem uma forte base de fãs, não é mais atualizado e não gera receita. ]
O percurso natural de todo jogo é exatamente este, entretanto isso não parece acontecer com o CS: são quase 25 anos de história e o game segue com as mesmas ideias. Para o jornalista Roque Marques, a beleza do Counter-Strike se encontra exatamente nessa mescla de simplicidade e complexidade.
Roque Marques, jornalista da Dust2 Brasil
“A beleza do CS é que ele atinge vários níveis de um jeito diferente. Quando você é criança e tem um primeiro contato, ele é um jogo de entendimento muito fácil, rapidamente se entende o que você pode fazer e o que não pode. Essa simplicidade chama muito a atenção e conquista muitos novos jogadores. Ao mesmo tempo que ele é muito complexo dependendo do nível que você jogar, sendo muito parecido com o futebol nesse sentido, o que explica um pouco essa popularidade. É um jogo muito simples, mas a beleza está na complexidade que não é vista logo de cara.”
O auge do Counter-Strike brasileiro
O CS foi um dos pioneiros no chamado esporte eletrônico ou e-sports, a partir dele muitos jovens deixaram de ver o jogo como mero divertimento casual e passaram a enxerga-lo como profissão. Isso se deve muito a ascensão das grandes organizações no início do século, aqui no Brasil as que mais se destacaram foram o mibr (segue em atividade) e o G3X (já não participa do cenário competitivo). Além dos grandes campeonatos da época, como a World Cyber Games (WCG), no qual se pagavam premiações consideráveis em um mercado ainda muito primitivo.
Com a proliferação das Lan Houses no país, o cenário profissional no Brasil se ascendeu rapidamente. Consequentemente, vieram conquistas e o nascimento de lendas, jogadores como Lincoln “fnx” Lau, Alexandre “gAuLeS” Borba, Raphael “cogu” Camargo, Renato “Nak” Nakano, entre tantos outros. Foram profissionais que venceram uma série de campeonatos mundiais, colocando o CS brasileiro no mapa. Trazendo para o CS:GO, a equipe mais vitoriosa e para muitos a melhor de toda a história foi o time brasileiro formado por: Gabriel “FalleN” Toledo, Fernando “fer” Alvarenga, Epitácio “TACO” de Melo, Marcelo “coldzera” David, Lincoln “fnx” Lau e posteriormente com João “felps” Vasconcellos. Conquistando o topo do mundo duas vezes seguidas no ano de 2016 e mais 8 campeonatos internacionais em 2017. Com todas as vitórias, o CS brasileiro ganhou muito prestígio e ficou marcado por seu estilo próprio. Em entrevista para o Flow Podcast, coldzera falou sobre a dominância imposta pelos brasileiros.
Marcelo “coldzera” David para o Flow Podcast
“No nosso segundo mundial, a gente treinou 140 mapas e vencemos 138. A gente sabia que ia ser diferente, a sensação era de que os outros times não teriam chance. Foi o que aconteceu, no campeonato inteiro nós só perdemos um mapa. O time era muito confiante, sabíamos que a gente estava a dois passos a frente de todo mundo. Esse foi de longe o campeonato mais fácil que a gente ganhou.”
FalleN, o capitão desse lendário time, afirmou em um episódio também no Flow Podcast sobre a forma vanguardista que a Luminosity Gaming jogava, se destacando dos demais e empilhando uma série de troféus.
Gabriel “Fallen” Toledo para o Flow Podcast
“A gente inventou como ser jogado o CS a partir daquele momento, tanto que fomos o melhor time do mundo em 2016 e 2017. Nós conseguimos entrar com uma filosofia de jogo que encaixava muito no nosso time. A gente tinha o coldzera, que acabou se tornando o melhor jogador do mundo. O fer, um jogador muito agressivo e extremamente difícil de se jogar contra, até o adversário entender como jogar contra ele, o round já tinha sido vencido. O fnx, que era um jogador já de muita experiência e tinha uma capacidade enorme de ganhar rounds sozinho, seja contra 2 ou 3 jogadores, ele isolava muito bem cada briga e era muito criativo. Ainda tinha o TACO, que sempre entrava na frente, se doava pro time e não tinha problema em morrer, fazendo a função mais ingrata do jogo.”
A queda do CS brasileiro
Trazendo para a atualidade, depois da era gloriosa nos anos de 2016 e 2017, o Brasil nunca mais esteve no topo do Counter-Strike mundial. O time da SK se desmantelou, e mesmo com uma série de tentativas nenhum time brasileiro chegou ao topo novamente. O Brasil foi pioneiro em muitos conceitos táticos do Counter-Strike, formando um estilo próprio. Para Roque Marques, esse estilo acabou se perdendo com o tempo e hoje já não existe mais.
“Acredito que isso se perdeu muito com o tempo. Desde a pandemia pra cá, nós temos times que sabem fazer tudo muito bem. Então não tem mais um estilo que muda tudo. Antes disso nós tivemos essas eras muito bem definidas, e o Brasil foi uma delas. Era um jogo muito lento, mas com várias nuances. Eles de fato ditaram tendências. Hoje o Brasil já não tem muito isso, mas no mundo todo eu não vejo uma região ou um time que possui um estilo muito diferente.”
Desde então muitos times seguem nessa tentativa de voltar ao estrelato. Hoje, o principal time brasileiro é a Furia, formado por Gabriel “FalleN” Toledo, Andrei “arT” Piovezan, Marcelo “chelo” Cespedes, Kaike “KSCERATO” Cerato, Yuri “yuurih” Santos. Uma equipe constante, com bons nomes, mas que nunca foi campeã do mundo. Além deles, o cenário hoje conta com muitos times profissionais relevantes nacionais, como o MIBR, paiN, Imperial, Legacy, entre outros. Cada um deles com jogadores únicos e um objetivo em comum: voltar ao topo.
A geração de jogadores não é ruim, mas o cenário profissional está cada vez mais apertado. Muitos se perguntam se um dia o Brasil voltará ao topo, para Roque hoje em dia está muito mais difícil de chegar nesse almejado primeiro lugar.
“Pelo tamanho do esporte, hoje nós temos mais times preparados em condição mais simples do que a nossa para fazer as coisas acontecerem. Lá fora, o jogador já nasce naquele ambiente muito competitivo. Com 13, 14 anos eles já jogam com os melhores do mundo e nós estamos sempre correndo atrás. Talvez uma forma de conseguirmos voltar ao topo, seria ser uma vanguarda como fomos com a SK, o que é muito difícil e ninguém sabe exatamente como fazer isso.
O Counter-Strike brasileiro passou por seus altos e baixos, com crises e glórias o Brasil segue revelando talentos com potencial para chegar ao lugar mais alto do pódio. Talvez essa seja a grande magia que envolve o game, são dos lugares mais improváveis que surgem os maiores heróis, são os rounds mais impossíveis que fazem o narrador perder a voz.
Ninguém sabe qual será o próximo grande time brasileiro a fazer história, nem se haverá um. Mas o esporte não para, segue buscando novas histórias para serem contadas.