Como o endividamento brasileiro sustenta a economia do País

O aumento da Taxa Selic, relacionado à continuidade da inflação alimentícia, enche o bolso do exportador e faz o brasileiro médio passar fome
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Tayná Freitas
Sede do Banco Central (BC) em Brasília, capital federal. Imagem: reprodução.

Desde os tempos de Collor no poder, a inflação se tornou palavra constante no vocabulário brasileiro. Com dados que chegaram a registrar altas de 82,39% no mês, a população nacional foi educada na prática a manter o olho no preço dos produtos. Com a crise das commodities, dados inflacionários passaram a fazer parte intrínseca de todo telejornal e veículo de informação, e no início do mês, a situação não foi diferente. Durante entrevista para rádios da Bahia, o presidente da república Luiz Inácio “Lula” da Silva soltou a frase “se tá caro, não compra”, o que rendeu assunto para polêmica.

Apesar da fala atravessada, o presidente do Brasil se refere a nada mais, nada menos, que o efeito esperado da Taxa Selic, a ferramenta principal do Banco Central (BC) no controle inflacionário. Lula criticou a manobra econômica do BC, liderado por Gabriel Galípolo, de aumentar a taxa Selic, mas sua orientação é justamente o grande objetivo dos juros: abaixar o consumo.

Afinal, a Taxa Selic é, como o próprio BC explica

“A taxa básica de juros da economia, que influencia outras taxas de juros do país, como taxas de empréstimos, financiamentos e aplicações financeiras. É o principal instrumento de política monetária utilizado pelo Banco Central (BC) para controlar a inflação.”

Em termos simplificados, se a inflação está alta, a Selic sobe para reduzir o efeito inflacionário sobre os preços do consumidor, os quais são medidos pelo IBGE por meio do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Na prática, o sonho econômico dá certo: o brasileiro vê que os juros estão altos, deixa de consumir, e os produtores diminuem o valor. Mas a “mão invisível” da economia não regula nada, e apenas faz aquilo que o grupo musical As Meninas falaram lá em 1999, no hit Xibom Bombom: o de cima sobe e o de baixo desce.

O que está acontecendo na realidade é que a taxa de juros já está alta, com o valor atual de 13,25% ao ano, e com previsão confirmada em ata do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC para aumento de 1% em reunião marcada para março. Com a Selic chegando a elevados 14,25% no primeiro trimestre do ano, o aumento faz com que o brasileiro se endivide mais, já que as taxas de crédito em empréstimos e cartões aumentam. 

O grande problema é que o brasileiro já está endividado. Pesquisa da Quaest divulgada domingo (16/2) revela que 77% da classe baixa e 76% da classe média admitem estar em dívidas, e se o IPCA de janeiro for indicativo de algo, é que café não vai ser a única coisa a pesar no bolso da nação.

O boletim publicado em 11 de fevereiro pelo IBGE mostrou desaceleração do IPCA para 0,16%, em comparação com os 0,52% de dezembro. No entanto, o grupo de Transporte pulou para uma aceleração de 1,30%, enquanto o grupo de Alimentos e bebidas registrou o quinto aumento consecutivo, chegando à alta de 0,96%. Nessa seção, o setor de alimentação no domicílio sofreu aumento de 1,09%, com destaques para a cenoura (36,14%), o tomate (20,27%) e o café moído (8,56%).

Então, se mesmo com o aumento da taxa Selic em busca do suposto controle inflacionário, os alimentos básicos continuam subindo de preço e se tornando inviáveis para compra, o conselho presidencial de “se está caro, não compra” sai às custas da alimentação e nutrição básica do brasileiro. Independente de Lula ou de Galípolo, não é o cidadão médio que se beneficia com essa mudança. O resultado é o uso do cartão de crédito, que o faz se afundar em mais dívidas para comprar um simples pacote de café, que chegou a custar R$48,57 o quilo em novembro, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic).

Quem realmente tira proveito de toda essa situação é o exportador nacional e o importador estrangeiro. Com a alta na Selic, o endividamento da população se aprofunda, mas o real se valoriza, pois os juros de retorno e o controle inflacionário são elementos atrativos e confiáveis para o investidor externo. A taxa básica em alta, aliada aos resultados negativos do dólar na balança comercial após anúncios de protecionismo e juros no governo Trump nos EUA, fizeram o Real ser a segunda moeda mais valorizada (5,6%) no mundo no mês de janeiro, atrás somente do rublo russo (6,8%).

E como já falamos aqui no Lab Notícias, o papel do Brasil no esquema mundial é fornecer commodities — ou seja, exportar. Não coincidentemente, essa é a atividade mais aquecida e lucrativa do País no momento.

O que podemos tirar disso tudo é que, com a promessa de aumento da Taxa Selic, o mais atrativo para o País é o estrangeiro, atrair o de fora e exportar o que é nosso. A máxima usada na música do baiano Igor Kannario “Tudo Nosso e Nada Deles”, na verdade, é o oposto. Com a situação atual da política monetária no Brasil, resta dizer que é tudo deles (estrangeiros) e nada nosso (brasileiros). Enquanto o brasileiro conta moedas para decidir entre a xícara de café ou a passagem para ir trabalhar, o grande empresário enche o bolso com o endividamento da população.

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