- Mulheres no Jornalismo Esportivo: entrevista com Beatriz Monna - 29 de abril de 2025
Formada pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás em 2020, Beatriz Monna é apresentadora, repórter e comentarista da TV Brasil Central há três anos. Com carisma, competência e paixão pelo esporte, ela vem conquistando seu espaço no Jornalismo Esportivo, uma área ainda predominantemente masculina. Beatriz compartilha a sua linda trajetória e fala sobre as dificuldades enfrentadas pelas mulheres nesse meio.

Foto: Roberto Correa
De onde surgiu o interesse pelo Jornalismo?
Bom, o meu interesse pelo jornalismo veio através da leitura e da escrita. Eu sempre gostei muito de escrever. Fui uma criança muito curiosa, no bom sentido, no sentido legal da palavra, de ter interesse em descobrir as coisas. Sempre gostei muito de jornal, sempre fui muito interessada mesmo, sabe?
E o meu interesse pelo jornalismo esportivo veio desde pequena, porque eu sempre gostei de futebol. O meu pai fez muita questão de incluir eu e a minha irmã nas idas ao estádio, cresci amando muito esse esporte.
Então, eu uni as paixões: a paixão pela escrita, o meu interesse, a minha curiosidade, com a minha paixão pelo futebol, e vi no jornalismo a profissão certa para que eu trabalhasse.
Como foi o começo da sua trajetória no Jornalismo Esportivo?
A minha trajetória no jornalismo esportivo começou na graduação, no estágio obrigatório que fiz na PUC-TV, lá eu escrevia para as redes sociais dos dois programas diários esportivos que tinha e tem até hoje, também fazia as coletivas, ia aos jogos, acompanhava o Humberto, que era o meu jornalista supervisor nas coletivas e também nos jogos. Então, o meu primeiro contato mesmo com jornalismo esportivo foi na PUC-TV.
O meu pai sempre incentivou, isso é algo muito legal, porque a gente sabe que o futebol ainda é predominantemente masculino, existe esse preconceito em relação à participação das mulheres nesse meio e eu sempre agradeci, agradeço até hoje ao meu pai. Ele nunca disse para mim, para minha irmã: “olha, esse espaço não é para vocês, vocês não vão me acompanhar´´, pelo contrário, ele sempre fez muita questão de incluir.
Ele teve duas filhas e sempre fez muita questão de levar, de apresentar a gente para o futebol, de colocar no nosso coração esse espírito de torcedor, de torcedora. Então a minha paixão pelo futebol começou através dele, vendo ele acompanhar, vendo a paixão dele, eu acabei me apaixonando também e quis seguir com o esporte, com o futebol na minha carreira, na minha profissão.
Você cobre jogos do Goianão, Copa do Brasil, Brasileirão, entre outros. O futebol é o esporte que você mais gosta de cobrir?
Olha, é o esporte que eu mais gosto de acompanhar e o que eu acompanho com mais frequência, estou sempre assistindo uma partida de futebol, acompanhando o meu time do coração. Então, é o que eu mais gosto de cobrir, o que tenho mais afinidade.
Mas eu tive uma grande surpresa com a Estoque Car, com a corrida, com o automobilismo. Eu gostei bastante, cobri três vezes, se eu não me engano, e foi uma experiência muito legal, foi muito bom mesmo. O automobilismo é muito distante da gente, né? De nós, goianos. Eu tive pouco contato com a Fórmula 1, não vi os grandes ídolos correndo, mas ter esse contato aqui foi muito bacana.
E também sou apaixonada por vôlei, cobri um evento com o Dante, que é um ídolo, e é muito legal estar próxima de grandes personalidades do esporte, que a gente cresce acompanhando, assistindo e torcendo.
E nesse embalo da paixão pelo futebol: o time do coração interfere de alguma forma quando você está cobrindo jogos dele?
Eu sempre ouvi que quando a gente começa a trabalhar com jornalismo esportivo, aprendemos a diferenciar e acabamos nos distanciando um pouco. Eu continuo torcendo, continuo acompanhando os jogos do meu time, mas assim, quando estou no campo, quando estou cobrindo, eu neutralizo o máximo possível o sentimento de torcedora para que eu consiga entregar com maestria o que estou fazendo, sem interferir. Então, tanto no campo, quanto no estúdio quando estou apresentando, comentando, deixo meu coração de lado e tento neutralizar o máximo possível para que eu não seja injusta, tanto com o meu time do coração, mas também com os outros times, porque quem tá acompanhando quer ver um comentário sério, profissional.
O futebol é muito passional, né? Então a gente tem que ser o mais racional possível para que isso não interfira na entrega do trabalho.
Teve algum momento, na sua caminhada no jornalismo esportivo, que ficou na memória ou guardado no seu coração?
Olha, eu vou falar dois acontecimentos. O primeiro foi durante o estágio, quando eu fui participar de uma primeira cobertura de jogo, não ao vivo, como são as transmissões do Campeonato Goiano, mas de ter o primeiro contato com uma coletiva de imprensa, de estar próxima dos jogadores, dos técnicos, de quem faz tudo aquilo acontecer, pra mim foi muito marcante. E ali nesse meu primeiro contato, eu tive mesmo a certeza de que era isso que eu queria pra sempre. Eu não esqueço da sensação, fiquei em êxtase, foi uma sensação muito boa.
E o segundo foi a minha primeira transmissão do Campeonato Goiano, na TV Brasil Central, e já ao vivo, como repórter de campo. Foi muito importante pra mim, porque eu não tinha experiência com isso, eu cobria os jogos mas era gravado, não era ao vivo, eu não tinha tido essa experiência ainda. E o ao vivo mexe muito com a gente, né? É diferente, não tem como, e eu brinco que eu caí de paraquedas, porque eu não tinha tido essa experiência e falaram: ´´Não, quem vai é você, Beatriz.´´. Eu já trabalhava aqui na TV Brasil Central há um ano, apresentando os programas esportivos como repórter, mas como eu te disse, essa experiência do ao vivo em campo eu ainda não tinha. E fiquei com muito medo, muito medo mesmo, na primeira transmissão, aquele frio na barriga, é um frio na barriga que dizem que a gente tem que sentir sempre, né? Porque a partir do momento que não sentir mais tem alguma coisa errada. Então, é um frio na barriga que eu sinto até hoje, já fiz a minha terceira participação no Campeonato Goiano, e até hoje eu sinto essa sensação, esse nervosismo, mas é um nervosismo muito bom. Então foram dois episódios que me marcaram muito.
Você sente que há uma diferença no espaço e credibilidade que jornalistas esportivas têm em comparação aos homens?
Bom, na TV Brasil Central eu não sinto isso, que eu tenho menos credibilidade, eu acabei de contar, né? Que quando surgiu o projeto para cobrir o Goianão, eu sinto que assim, eles poderiam ter escolhido outra pessoa, eu era inexperiente ainda naquele meio ali, porém eu fui escolhida, eles viram potencial, eles acreditaram em mim. Por parte dos meus colegas eu também não sinto essa diferenciação, pelo contrário, eles estão sempre me dando muito espaço e acreditando muito em mim, eu acho isso muito bacana.
Mas agora assim, nesse universo existe. Por exemplo, em algumas transmissões, eu fazia as reportagens com o Pedro Henrique Rabello, e sentia que às vezes havia uma diferença de tratamento por parte de alguns assessores de clubes, que traziam a folha dos relacionados, da escalação do jogo, para ele e não traziam para mim, então assim, meio que ignoravam a minha presença ali, sabe? Cumprimentavam ele, não me cumprimentavam. Às vezes, em coletiva também, quando eu ia perguntar, era diferente a resposta, o jeito de falar, de quando era com ele. Então isso acontece, e é triste que ainda aconteça. É um sexismo, é um machismo, é uma coisa que existe ali ainda. A gente ouve piadinhas no estádio, eu ouço alguns comentários, porque o nosso programa é interativo, né? A gente lê os comentários dos telespectadores falando sobre aparência, sobre algumas coisas que não falam, não fazem esses comentários com os homens, né? Mas comigo isso acontece.
É algo que eu queria que mudasse, porque às vezes as pessoas falam sobre a minha aparência, mas eu queria que elas falassem mais sobre o meu trabalho, a minha entrega, o meu comentário, a minha opinião, entende? E eu vejo isso acontecer com muitas colegas, tentar ao máximo se neutralizar para não ser percebida, porque não queremos que a nossa imagem fale mais do que aquilo que a gente está entregando, que é o nosso trabalho. Então, é um desafio também que a gente precisa passar, além de todo o preconceito, claro. Eu sinto muito também que aqui, no programa, e até mesmo durante as transmissões no Campeonato Goiano, eu tenho que estar sempre me reafirmando, e tentar errar o mínimo possível, porque sei que qualquer pequeno erro que eu cometer, qualquer coisinha, vão falar que é porque sou mulher. Sei que é muito fácil pensarem: “Ah, essa menina está aí só porque é mais um rostinho bonito na TV.´´ Eu, inclusive, já ouvi um comentário desse, sabe? E é muito triste, isso magoa muito, porque sei da minha dedicação, dos meus estudos, do quanto faço e o quanto fiz para estar onde estou.
Acha que o ambiente do jornalismo esportivo tem mudado com o tempo?
Eu vejo no jornalismo esportivo, no jornalismo de um modo geral, como as transmissões estão ganhando uma abrangência muito grande com os streamings, por exemplo.
Antes era muito fechado, tinha uma emissora de TV que transmitia os jogos e é isso. Hoje o jornalismo esportivo está muito mais dinâmico, diversificado, interativo. A gente vê influências na apresentação de programas, nas reportagens. Estamos vendo aí, não sei se eu posso citar, mas a Cazé TV, que explodiu nos streamings, transmitindo as Olimpíadas, Copa do Mundo, e agora transmitindo Campeonato Brasileiro. Tem também o Fred na apresentação do Globo Esporte, tudo bem que ele é jornalista, mas ele se consolidou como influencer. E as transmissões estão cada vez mais interativas. Na Série B, até o Kawai transmitindo jogos. Então, essa diversidade de meios para acompanhar uma transmissão, mostra que está sendo cada vez menos quadrado, engessado. Estamos caminhando para uma coisa muito mais diversificada, interativa, muito mais ampla, e eu acredito que vai seguir sendo assim.
E tem alguma mudança que você ainda acha necessária nesse meio?
Olha, boa pergunta. É isso, é o que eu já vejo que está acontecendo, que é se tornar mais democrático, mais acessível para todo mundo, para que todos consigam acompanhar, consigam ter acesso. Até mesmo, acho que isso podia partir muito também dos clubes. Vejo que alguns, às vezes limitam muito o acesso de nós jornalistas, essa interação da imprensa com os clubes podia ser melhor, pode ser melhor, porque sendo melhor essa comunicação, a informação também para o torcedor vai ser mais ampla.
O Evandro, que trabalha comigo e é um jornalista que eu acompanho muito, por causa do meu pai que sempre acompanhou ele, fala como antes esse acesso e essa interação era muito boa, era muito melhor, e nisso a gente retrocedeu. Agora está tudo mais fechado, é muito difícil a gente ter a informação, buscar essa informação na fonte. Então acredito que isso podia melhorar, ser mais democrático, porque sendo, a gente entrega o melhor para o público e para o torcedor, as informações do time do coração.
Tem alguma jornalista (ou figura feminina) que te inspira?
Eu vou falar duas jornalistas esportivas. A Thaís Freitas, que trabalha comigo na TV Brasil Central, e para mim sempre foi uma referência. E gosto muito também da Ana Thaís Matos, comentarista na Rede Globo, acompanho muito ela e seu trabalho, admiro muito a coragem dela, porque sempre falou muito abertamente sobre vários tabus no futebol, até mesmo sobre a participação da mulher nesse mundo, nesse universo que até hoje é considerado muito masculino. E ela fala muito bem sobre todas essas quebras, sabe? E sobre o espaço que a mulher tem ganhado.
Para finalizarmos, que conselho você daria para outras mulheres que querem entrar nessa área esportiva?
Bom, acreditar. Acredite sempre em você, nunca deixe que digam que esse espaço não é seu, porque é sim. Não é um universo que tem que ser considerado masculino pra sempre. E eu vejo que o mundo esportivo está ganhando cada vez mais mulheres, e isso é muito bom. Ouvir uma mulher narrando um jogo de futebol, uma árbitra apitando, mulheres na bancada de comentaristas, esse espaço é sim para nós.
Então sempre acredite e nunca deixe que ninguém diga que esse espaço não é pra gente, porque é.
É claro que assim como qualquer homem, precisamos estar sempre bem informadas, estudar bastante, isso é muito importante. Estudar, ficar por dentro de tudo que acontece o máximo possível, e ter em mente que é possível e que esse espaço é sim seu. Estou falando pra mulheres aqui, esse espaço é nosso e nós temos que ocupá-lo, pois somos capazes.

Foto: Alan Deyvid
Meu Deus, que entrevista divertida e interessante, faz muito tempo que não leio algo que má faça ficar presa assim como aqui. Maravilhoso 😘❤️