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ANA PAULA PENHA
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No século XIX, com o desenvolvimento de tecnologias e o vasto alcance informacional, houve um grande aumento da desinformação. Esse fato se confirma ao relembrar a disseminação de ‘fake news’, principalmente das pautas políticas e de saúde, durante a pandemia da COVID-19, um momento em que os jornalistas e os meios de comunicação tiveram um papel crucial para manter a população em alerta.

Os dados disponibilizados pelo Instituto Locomotiva reforçam a gravidade do problema: cerca de 90% da população brasileira já foi vítima de conteúdo falso e 62% dizem saber diferenciar informações falsas e verdadeiras. Além disso, um levantamento feito pela Propmark revela que 59% da população brasileira consome notícias por meio de aplicativos e redes sociais, plataformas em que a desinformação se mostra constante.

Fonte: PIXABAY

A partir desse vasto alcance de inverdades, entramos em contato com a repórter política e ex membro do projeto OJU e ABRAJI (Associação brasileira de jornalismo investigativo), Elisama Ximenes, para esclarecer dúvidas referentes a disseminação de notícias falsas na política, seus impactos e como checá-las.

Quais são os impactos da desinformação na política e como ela tem afetado a democracia?

Desde 2018 a desinformação é o principal fator das eleições e isso continua ainda hoje. Na política ela tem como principal objetivo destruir reputações, o que fica muito caro para quem é candidato, político ou alguma outra figura importante. É um impacto que não tem volta. Por mais que tenhamos a iniciativa de checagem, a informação dificilmente tem um impacto maior que a desinformação. Existem iniciativas do Google, para que a verificação tenha mais alcance, mas infelizmente não tem jeito, porque a desinformação tem como aliada o viés de confirmação. Se eu penso algo, e aquela desinformação confirma isso, apesar das provas, não vou acreditar que aquilo é falso. Então, é uma praga muito difícil de combater no mesmo volume com que foi propagada.

De acordo com pesquisas feitas pelo instituto locomotiva, 62% das pessoas dizem saber diferenciar informações falsas e verdadeiras a partir de critérios pessoais. Sendo assim, quais são os critérios que levam você a checar os fatos de uma notícia política?

É muito complicada essa questão, porque as vezes pensamos que é fácil identificar o óbvio, mas sinceramente eu mesma já cai em ‘Fake News’. Hoje em dia tem muita informação e somos acostumados a ler apenas o título, e quando abrimos a notícia é algo totalmente diferente. Então é muito complicado, as pessoas realmente têm essa convicção de que conseguem diferenciar essas notícias.

Nós, jornalistas, temos que ter critérios bem objetivos. Eu gosto bastante do método Comprova que é um método muito objetivo, cauteloso e criterioso, porque exige que mais de uma pessoa faça a verificação daquela notícia e haja uma apuração mútua. A checagem não pode ter erro, se isso acontece ela perde a credibilidade. Então é importante que seja feita com tempo, cuidado e transparência, revelando cada passo que levou a confirmação da falsidade ou veracidade daquela notícia.

Então quando chega uma notícia vocês buscam checar todas, não só aquelas que parecem obviamente falsas?

Um dos critérios dentro do Comprova e do OJU é ver aquilo que está viralizando, porque pode ter notícias que não tem vasto alcance ou viralização, então o fato de verificá-la pode levar ela a se tornar viral, é um risco. Isso é algo presente no Comprova e no OJU, e eu também defendo essa ideia, que é tomar cuidado para não dar mais visibilidade para ‘Fake News’ que não tiveram um alcance tão significativo.

Atualmente vemos a grande influência das redes sociais na sociedade, essas redes de alguma forma auxiliam na checagem de fatos ou apenas prejudicam?

Não penso que seja tão maniqueísta, porque é nas redes sociais que a desinformação ganha alcance, mas é também por meio delas que conseguimos verificar essas informações.

Quais são os desafios para desmentir informações polarizadas, como saúde e política?

O desafio é esse de lidar com o viés de confirmação. Em grupos de família, no Whatsapp, muitas vezes tem debate, principalmente em época de eleição, por conta da polarização. Por exemplo, uma tia divulga uma desinformação e, mesmo sendo rebatida com provas de que aquilo é falso, a tia não vai acreditar, porque ela quer que aquilo seja verdade, pois confirma o que ela acredita. Então, para mim, esse é o principal desafio. Por mais que façamos um trabalho objetivo e criterioso, não há
garantia de que as pessoas vão acreditar. O jornalismo, hoje, enfrenta uma crise de credibilidade nesse sentido.

A sua colocação coincidentemente se encaixa com a nossa próxima pergunta. Você acha que a checagem de fatos pode salvar/auxiliar o jornalismo político em tempos de crise de credibilidade?

Não penso que tudo esteja perdido para que seja salvo, mas a checagem de fatos é uma estratégia para combater a desinformação e pode sim ajudar o jornalismo em meio a essa crise de credibilidade no qual estamos passando atualmente.

Que dicas você daria para um cidadão identificar notícias falsas sobre política?

A dica que posso dar é de sempre duvidar e nunca presumir que aquilo é verdade. É importante buscar o máximo de indícios de veracidade daquele determinado assunto.

Essa entrevista vai ser lida por muitos alunos que estão ingressando no curso de jornalismo. Você quer deixar alguma mensagem ou conselho para os estudantes que queiram entrar nessas duas áreas (checagem de fatos e política)?

Um conselho que gostaria de deixar é de ter muito compromisso com a informação e ter muito apego com o seu nome, porque se você divulga o errado acaba descredibilizando o seu próprio nome, então é importante termos esse apego. Eu pessoalmente sofro muito com erros, mas é necessário passarmos por isso, porque o nosso compromisso como jornalista é com a verdade. Nós temos que ter responsabilidade e sobretudo ética para trabalhar nessa área, para não acabar sendo levado por algum viés que possa descredibilizar o nosso trabalho.

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