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Isabella Lima
Foto: Pixabay

O Ensino Médio por si só é uma fase de dúvidas e instabilidade. Essa situação em conjunto com as mudanças de formato que o ensino brasileiro está vivendo transformam o futuro em uma incógnita. O novo ensino médio, como é chamado, é resultado da alteração da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBI) por meio da Lei 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Previsto para entrar em vigor no ano 2022, a medida se encontra atualmente suspensa.

A reformulação tinha por objetivo superar a evasão escolar e os baixos índices de aprendizado que atingiam em especial os últimos anos da educação básica. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) realizada pelo IBGE no terceiro trimestre de 2021, mostrou que 4,4% dos jovens na faixa etária dos 15 a 17 anos estavam fora da escola, o equivalente a 407,4 mil pessoas.

As alterações podem ser resumidas em três grandes mudanças: primeira, no novo modelo o estudante passaria a poder escolher parte das disciplinas que cursaria. Segundo, a carga horária mínima aumentaria de 2.400 para 3.000 horas. Sendo 1.800 horas destinadas para as matérias comuns e obrigatórias estabelecidas pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e 1.200 horas destinadas ao itinerário formativo. E por último, haveria um olhar mais voltado ao mercado de trabalho, com a possibilidade de ainda durante os anos finais da educação básica o aluno cursar uma formação técnica.

Para exemplificar de uma forma simples, pode se dizer que existem dois caminhos, o primeiro é o “velho” ensino médio, onde todos alunos seguiam juntos pela mesma estrada. O percurso estava todo delimitado desde o início e os participantes levavam uma média de 2.400 horas para concluir. Ao final, todos haviam visto as mesma paisagens, que cada um lembraria com maior ou menor intensidade.

O segundo caminho é o novo ensino médio, onde os alunos, após caminharem por um tempo todos juntos, no ensino fundamental, chegam em uma encruzilhada. Nesse ponto, cada um pode escolher entre cinco opções: Linguagens e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências da natureza e suas Tecnologias; Ciências Humanas e Sociais Aplicadas; Formação Técnica e Profissional.

Todas as opções têm algumas paisagens iguais e outras específicas do caminho escolhido. O resultado é que ao fim de 3.000 horas os alunos se encontram com experiências e conhecimentos diferentes entre si. Alguns até mesmo já possuem qualificação técnica e estão aptos a ingressar no mercado de trabalho.

À primeira vista não há dúvidas quanto a segunda opção ser a mais atraente. A liberdade de escolher o que mais lhe agrada e melhor se adapta aos interesses individuais parecem alcançar o objetivo inicial que é garantir que o maior número de pessoas conclua o ensino básico. A ideia da atualização do ensino brasileiro é bem-vinda e necessária, mas persiste a dúvida se esse é o melhor modelo a se adotar.

Por um lado as mudanças são amplamente combatidas por entidades estudantis, sindicatos de professores e movimentos sociais. Por outro, são elogiadas por organizações estudantis como o Conselho Nacional dos Secretários da Educação (Consed), a Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep) e a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen).

O argumento dos apoiadores gira em torno da reversão da evasão escolar, maior identificação nos alunos com as matérias estudadas, e o aumento da formação técnica, além de outros pontos válidos e que devem estar em pauta. No entanto, a busca por melhorias esbarra na realidade díspar dentro do conjunto que forma o sistema educacional brasileiro.

A implementação gradual do modelo que vinha acontecendo há cerca de um ano foi interrompida no mês de abril deste ano. Mesmo breve, o período foi suficiente para mostrar disparidades não levadas em consideração na proposta. Enquanto as escolas particulares vinham se adequando bem, as escolas públicas enfrentam preocupações quanto a pouca capacidade financeira, infraestrutura, e falta de formação adequada dos professores.

Em diversas instituições de ensino público devido à falta de estrutura só foram ofertadas algumas das cinco opções optativas previstas. Logo, na prática, ao invés de ampliar as possibilidades de escolha dos estudantes da rede pública, o novo ensino médio, na verdade, as limita. Visto, a obrigação do aluno escolher entre opções disponíveis, que talvez não sejam do seu interesse, ao mesmo tempo que lhes priva o acesso a outras áreas de conhecimento.

O resultado não poderia ser outro além da desigualdade na formação entre estudantes ricos e estudantes pobres. Pois, enquanto um grupo teria todas as opções de caminhos livres e asfaltadas, livres para a escolha, o outro encontraria trajetos bloqueados e com buracos por toda a estrada.

O novo modelo já começou equivocado ao ser instituído sem debates suficientes com a sociedade. Em meio a todas as dúvidas e incertezas é possível vislumbrar que se a reformulação do ensino brasileiro não for melhor planejada, dentro das possibilidades existentes, o futuro da nova geração será baseado no retrocesso.

O processo de reestruturação encontra-se em meio a uma a consulta pública aberta para participação de todos os brasileiros, e com o fim inicialmente previsto para o dia 6 de junho. Os dados levantados serão analisados pela Secretaria de Articulação Intersetorial e com os Sistemas de Ensino (Sase), e enviados ao Ministro da Educação, Camilo Santana.

A pesquisa deve se tornar um guia para a formulação de novas propostas de reforma, e a esperança é que se encontre um terceiro caminho que seja acessível a todos.

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