- Com mais de 40 anos de Jornalismo, Cileide Alvesfala sobre carreira e política - 27 de abril de 2025
Cileide Alves iniciou sua carreira em 1984 e desde então passou pelo O Popular, onde foi editora-chefe por 5 anos, pela Rádio Interativa, pela Rádio CBN e pela TV Anhanguera. Se especializou na editoria política e hoje é comentarista de diversos veículos do Grupo Jaime Câmara.

Formou-se em Jornalismo pela Universidade Federal de Goiás (UFG) em 1984 e, desde o início da carreira, decidiu se especializar na editoria de política. No jornal O Popular, adquiriu grande experiência em redação, chegando ao cargo de editora-chefe até que decidiu sair do veículo em 2016, e mais recente voltou com uma coluna semanal sobre política. Também é Mestre em História pela UFG e autora da biografia “Iris Rezende – De líder estudantil a governador (1958/1983)”, resultado do seu mestrado.
Em entrevista, Cileide começou falando sobre porque escolheu jornalismo como profissão e seu interesse por política.
Tem algumas coisas que eu acho que nós já temos alguns talentos e aptidões, é difícil de explicar. Na minha infância, eu tinha muito acesso a livros por conta da minha mãe. Sempre tive essa aptidão com as palavras. Lembro de brincar com colegas de que era jornalista. Quando fui escolher a profissão, escolhi jornalismo. Quando entrei na universidade, foi em 1981, na redemocratização. Eu nem sabia sobre regime militar e ditadura, não se falava sobre isso, era proibido. Minha mãe sabia das coisas, mas tinha medo de falar. Na universidade, eu começo a descobrir o mundo da política, começaram as primeiras manifestações pedindo anistia, eleições diretas.
Perguntada sobre como foi viver o período da redemocratização, a jornalista contou que se engajou nos movimentos estudantis da época.
Me engajei nos movimentos estudantis, fui presidente do Centro Acadêmico de Jornalismo, numa época em que essas entidades tinham muita representatividade porque isso tinha ficado muito tempo proibido e existia uma ânsia de ter isso de volta. Foi um período muito efervescente, a Universidade foi muito efervescente. Com tudo isso, foi meio natural entrar para a editoria política. Eu descobri na prática o efeito que a política, ou a falta dela, tinha na vida da gente.

Relacionando a fala da jornalista com sua formação em História, Cileide foi perguntada sobre por que decidiu fazer um mestrado em História na UFG, em 2005.
É curioso porque nós jornalistas, ainda mais fazendo política, a gente vê a história acontecendo. Eu acompanhei, já como jornalista, o movimento das diretas já, a constituinte de 1988, a eleição do Collor e o impeachment dele. Tudo isso virou história.
Alves também contou que a decisão de fazer mestrado aconteceu porque ela queria escrever uma biografia sobre o ex-governador de Goiás Iris Rezende.
Quando o Iris Rezende perde as eleições para o governo do estado em 1998, de forma impressionante para o Marconi Perillo, continua o mandato de senador, mas perde a reeleição em 2002, eu olhei aquilo e pensei: a carreira do Iris acabou. Mas ele tinha uma grande capacidade de se reinventar, que passei a admirar. Em 2004, o Iris vira candidato e se elege prefeito de Goiânia, o que ninguém esperava. Eu fui entrevistá-lo dias antes da posse dele e ele contava muita história, desde o começo da vida dele até a carreira política. Ouvindo aquilo, eu pensei: quero escrever uma biografia do Iris, e meu marido, que é professor, me aconselhou a fazer um mestrado em cima disso e transformei isso num livro.

Cileide também falou um pouco sobre toda sua trajetória profissional no jornalismo e a importância de ser um profissional que sabe lidar com a mudança.
Eu tenho 40 anos de carreira e não penso em parar. Eu já me reinventei muito, eu começo como repórter de política [no O Popular], vou crescendo no jornal e viro editora-chefe, o cargo de jornalismo mais importante do estado. Posteriormente, eu saio do jornal num momento em que não estava bom para mim e vou trabalhar na rádio, primeiro Interativa e depois vou para a Sagres e para a CBN. Depois, o O Popular me chama de volta para ter uma coluna semanal no jornal e eu vou. Agora, esse ano, fui para a TV pela primeira vez, sendo comentarista fixa do Bom Dia Goiás na TV Anhanguera. O jornalismo que comecei em 1984 com o de hoje é absurdamente incomparável. E eu continuo aqui, é necessário adaptar.
A colunista de política também foi questionada quanto à imparcialidade no jornalismo, e diz que imparcialidade não é sobre ser isento.
Eu acho que tem que ter bom jornalismo. Você está me enxergando de um ponto de vista, e se você for relatar o que você está vendo, vai ser muito diferente do que está me vendo de outro lugar, mas não quer dizer que os dois mentem. É diferente de alguém mandar você escrever algo que você não está vendo. Isso é imparcialidade, parcial é você escrever favorecendo um lado. A regra sempre deve ser bom jornalismo.
Cileide Alves também falou sobre ser uma “Jornalista de Opinião” e diz que isso é novo no jornalismo.
Isso é novo no jornalismo, antes tinha-se muito a ideia de que o jornalismo deveria ser ‘insentão’. Hoje em dia, se tem muita informação e o leitor acaba querendo alguém que faça uma curadoria dessas informações e apresente um ponto de vista. Eu não gosto, dentro do jornalismo de opinião, das obviedades. É preciso agregar a opinião com o conhecimento.

Perguntada sobre o cenário político atual, a ex-editora-chefe do O Popular falou sobre a grande distorção de responsabilidades que vem acontecendo entre os poderes da república desde a criação das emendas parlamentares impositivas, em 2015.
Todas as épocas têm problemas. Eu acho que estamos num círculo vicioso. Os parlamentares hoje querem governar quando deveriam legislar e, na prática, não legislam e atrapalham o executivo a governar. Essa lógica está totalmente errada, é uma usurpação do orçamento público. Eu entrevistei alguns prefeitos que dizem que não suportam mais isso. Eles não conseguem fazer nenhuma obra sem ter que ir atrás de um deputado pedir emenda, e quando vão atrás dos parlamentares, eles querem benefícios em troca, como apoio nas próximas eleições.
A jornalista ainda falou sobre como o jornalismo vem denunciando essa situação e o que pode ser feito.
O jornalismo não erra por omissão, o jornalismo vem denunciando a questão das emendas. Mas acho que ele erra em cobrir política só do ponto de vista do jogo de xadrez, falta cobertura sobre as políticas públicas. O Caiado fala que Goiás tem a melhor segurança pública do país, mas não fala o que ele fez, o que está por trás disso. A gente não cobre bem a educação, a saúde. E tem sido difícil cobrir porque as redações estão menores e os jornalistas sobrecarregados.
Ainda no campo da política, Cileide falou sobre como é ser uma jornalista de política mulher nos últimos 40 anos.
As coisas mudaram nos últimos 40 anos. As questões da mulher nunca foram relevantes nas redações. Nós mulheres tínhamos que aceitar muita coisa. As coisas melhoraram, mas ainda sim predomina a visão do homem, principalmente na política. O poder sempre foi masculino. Eu acho que o mundo continua muito masculinizado, apesar da melhora, ainda vejo muita violência contra a mulher, na essência as coisas não mudaram.
E expandiu seu relato para falar como foi liderar a maior redação de um jornal em Goiás por 5 anos.
A minha liderança como editora-chefe do O Popular foi construída na minha habilidade profissional. Eu não tinha outra credencial para apresentar que não seja a competência, eu era mulher e de uma família que não era da elite. A mulher tem que provar que é boa, o homem não, o mundo foi feito para ele. Eu me lembro muito da senadora Lúcia Vânia, que era tida como uma política cri-cri. Mas se ela não fosse, ela não tinha o espaço dela respeitado.

Perguntada, Cileide também falou da sua relação sentimental com o jornalismo e a profissão.
Eu sou muito passional com o jornalismo. Eu gosto do que faço, me realizo fazendo. Isso é fundamental. Nem todo mundo pode gostar do trabalho, mas se você tem a sorte de fazer o que gosta, é maravilhoso. Eu sou jornalista 24 horas por dia, fico o tempo todo com meu radar de jornalista ligado, fazendo conexões na minha cabeça, acho até que é um excesso.
Já no final da entrevista, Cileide Alves deu alguns conselhos para quem está começando agora no jornalismo e relembrou do relato de um professor.
Uma vez fiz uma especialização em São Paulo em que todos os professores eram da Universidade de Navarra, que era uma das melhores faculdades de jornalismo do mundo. Um desses professores contou que uma vez estava na redação do Washington Post, bem na época do escândalo do Watergate, e perguntou ao editor-chefe do jornal, o Ben Bradlee, o que ele diria para um estudante de jornalismo se dar bem na carreira. E o Ben respondeu o seguinte: eu diria para ele ler Shakespeare, porque jornalismo é sobre ser humano e ninguém conhece mais sobre o ser humano do que Shakespeare.
Ela completou falando sobre o que deve se valorizar na vida acadêmica de um jornalista e se títulos acadêmicos são importantes na profissão.
Eu estou dizendo isso porque acho que o jornalista precisa muito saber sobre a vida e sobre o ser humano. Para mim, a literatura, a filosofia, a sociologia, essas disciplinas são o mais importante do que você pode tirar da acadêmia. O mercado não valoriza tanto as especializações, mas se você tem um título, você se destaca dos outros também. Acho que um bom profissional tem que juntar tudo isso.
Por fim, Cileide falou que o jornalismo não é fácil, mas tem seus lados positivos, e destacou a tecnologia como um ponto positivo da profissão.
É preciso estar disposto a lutar muito, nenhuma profissão é fácil. O jornalismo está num processo muito grande de mudança, o jornalismo sempre remunerou mal, mas tem jornalistas e jornalistas. O jornalismo não é para enriquecer, mas pode te facilitar em algumas coisas. A parte boa é que a internet é um mundo muito amplo também para o jornalismo, existe muita possibilidade. Um exemplo disso é a inteligência artificial, que é uma ferramenta que os jornalistas precisam saber tirar proveito dela.