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Entrevista com Antônio Pereira, jornalista especializado em agronegócios, um dos pioneiros da indústria no Brasil. É também criador e apresentador do programa de TV e rádio “TV Agro” há 24 anos. O programa é atualmente exibido pela emissora TV Serra Dourada.

Durante a conversa, Antônio oferece seus conselhos às gerações futuras de jornalistas.

Lab Notícias: O senhor é um veterano da indústria do jornalismo em agro, sendo um dos primeiros do país, reconhecido por seu trabalho nacionalmente. Desde o início você pretendia cobrir pautas relacionadas ao agronegócio ou isso foi algo que descobriu durante seus anos de profissão?

Antônio Pereira: É assim, eu cheguei em Goiás em 1970, quando eu saí de São Paulo, eu sou paulista. Quando eu terminei o exército, eu vim para cá. Nesse ano, meu sonho era fazer arquitetura, eu era apaixonado, fissurado. Prestei na Católica. Quando eu passei, o meu pai veio de São Paulo para cá para ver uns negócios que ele tinha aqui em Goiânia e ele disse: ‘Eu não tenho condição de pagar a sua faculdade. ‘Cê’ me desculpa, mas eu não tenho’. Bom, não tem, não tem.

Mudei de curso, fui para Matemática e Física na Católica. Estudando a noite e trabalhando de dia, e terminei o curso. Mas eu sempre gostei do agro, de ensinar as pessoas, sempre. E eu pensei: ‘P*ta! Goiás, você só vê vaca, só vê lavoura, não vê nada diferente. Que merda isso aqui’. Aí eu percebi: está aí um negócio para mim, eu mostrar ‘pro’ goiano aquilo que ele está vendo mas não sabe. Na área do agro não tem ninguém. Ninguém é assim. Especializado no agro, não tem.

Basicamente não tinha notícia. Então o que que eu fazia? Eu particularmente. Eu ia a uma fazenda, pegava um gravador ou então uma filmadora desse tamanho, que naquela época não era tudo digital, era filme mesmo e eu ia contar a história daquele pecuarista, o que que ele estava fazendo que estava dando o resultado certo.

Como o senhor disse, você se aproveitou da falta de cobertura em agro e da necessidade dos moradores da região de saberem mais sobre suas lavouras e acabou fazendo seu nicho. Dessa forma, o senhor acha que o profissional de jornalismo deveria focar mais em se especializar?

Demais! Demais! Porque quando você se forma é tudo muito surreal. E aí você pega o seu diploma e cai no mundo. Aí você cai lá, você vai acompanhando o repórter na rua e você vai fazer matéria de polícia, política, vai fazer o quê? É buraco na rua, não tem asfalto, vai entrevistar um político… Fica assim uma coisa ‘meio tatu com cobra’, sabe? Muita coisa.

Eu resolvi…. Eu sempre achei que o jornalismo tinha que ser segmentado. Eu acho que tem que ter o ‘cara’ jornalista especializado na área de medicina, na área de política, na área de economia, na área qualquer. Não é que eu não tenha condição de pegar um microfone ou fazer uma pauta e entrevistar um político ou um acidente, para mim não tem problema nenhum. Só que eu me identifico mais com o agro e eu fui em nível nacional, em nível nacional, um dos três primeiros jornalistas especializados em agro do país. Que pegou e falou: ‘daqui eu não saio’.

Antônio, você apresenta a TV Agro aqui na TV Serra Dourada desde a fundação da empresa, sendo um dos maiores nomes do jornalismo em agro do país, é de se esperar que o senhor tenha recebido várias propostas de emprego, se me permite a pergunta, o que faz com que você permaneça aqui após todos esses anos?

Se você se contentar com um trabalho mediano, com um salário de cinco ou seis mil, sua vida acabou, sua vida acabou aí, você se acomoda e nunca mais se alavanca, agora ter uma coisa que é sua, que é própria, isso faz uma diferença. Uma coisa, eu não sou funcionário da empresa, viu? Não, nunca fui. A TV me dá o espaço, me dá o cinegrafista e o resto tudo por minha conta. A TV paga o cinegrafista, agora para escrever tudo isso aqui que você está vendo, sou eu que faço, eu não tenho funcionário. Sou eu que faço tudo, os roteiros e entrevistas, sou tudo eu. Eu tenho um programa em 12 emissoras de rádio. Eu faço um texto que serve para o rádio, por isso que quando vem gente aqui eu falo: “Ó não fala do gráfico que a gente está vendo, explica o gráfico sem falar que está vendo um gráfico”. E aí o mesmo áudio que sai daqui vai para lá. É uma tarefa a menos, a linguagem que eu uso é como se eu estivesse fazendo um programa de rádio e nessa brincadeira já tem vinte e tantos anos.

Por isso que eu falo, não precisa buscar uma coisa que está lá em cima. Para buscar o que está lá em cima, você precisa ter uma escada, e às vezes você não tem essa escada, então fica matutando o que você precisa para ter essa escada. É assim que é a vida. E nunca, nunca, desista. ‘Ah, está muito difícil’. Se você desistir uma, duas, três vezes – pode escrever – sua vida não vai para frente, porque você não é um batalhador. Vocês que estão fazendo jornalismo, medicina, o que for, têm que buscar coisa nova. Pular fora da caixa.

O senhor disse que pratica o jornalismo desde a década de setenta. Tendo isso em mente, poderia falar um pouco sobre como era a profissão naquela época, dos desafios para se cobrir uma matéria e como as coisas são diferentes hoje em dia?

Nossa! Imagina a dificuldade para você fazer uma matéria, para você ter assunto em 1970, vocês não sonhavam nem em nascer. Acho que os pais de vocês talvez nem eram casados ainda. Então desde aquela época a dificuldade que a gente tinha ‘pra’ fazer uma ligação com um frigorífico, por exemplo, era enorme, não tinha frigorífico em Goiás só no Mato Grosso e em São Paulo ‘procê’ ver. Então, era muito difícil, muito, e você tinha que ser, assim, um cara muito estudioso do tema pra poder passar aquilo ‘pras’ pessoas.

Então imagine você começar a fazer TV e rádio na década de 1970, é uma história complicada. ‘Cês’ não viram, que hoje tem essas porcarias aí. Hoje, você aperta o botão aqui e sabe o mundo inteiro. ‘Ah eu quero falar de milho’. Está aí.  Então eu falei comigo mesmo: ‘eu vou, eu vou brigar. Eu vou nessa área que não tem ninguém’. Eu trabalhei de 1970 até 1995 na maior dificuldade e aí, as coisas foram para melhores, o telefone você já tinha mais facilidade para telefonar, eu já tinha o Telex, ‘cê’ sabe o que é Telex? [Não]. Telex é um aparelho, tipo uma máquina de escrever, que conversava com o mundo inteiro. Então você digitava e ali no lugar onde bate, onde fica o papel, saía uma fita toda furadinha, toda furadinha, que era um código universal que todo mundo que mexia com Telex e pegava aquilo, olhava os buraquinhos e sabia interpretar o que ‘tava’ escrito. Olha que loucura. Hoje, meu Deus do céu, hoje é a coisa mais besta do mundo você fazer jornalismo. Agora você tem que saber diferenciar o que é o certo e o que é errado. Do que é o correto e do que é feito. Aí que está o time. 

Para encerrar, Antônio, você poderia falar um pouco da sua trajetória, de como chegou até onde está hoje?

Eu fiz meu nome acompanhando todas as tecnologias de fora que eu sabia que chegariam aqui, tudo de comunicação da Europa e dos Estados Unidos, eu acompanhava e sabia mexer. Aí um dia minha mulher falou: ‘Antônio, você precisa fazer um curso de mestrado. Cê vai fazer, vai fazer, vai fazer’! E aí no ano de 1998, eu fiz a prova para mestrado e passei. Na época da minha tese, estava muito em pauta a melhoria de alimentação do rebanho, e eu sabia que a cana-de-açúcar era muito boa para o gado, então eu fiz sobre ALIMENTAÇÃO PARA BOVINOS ATRAVÉS DA CANA DE AÇÚCAR: VIÁVEL, ECONÔMICA E ECOLOGICAMENTE CORRETA. Esse era o título da minha dissertação. Fiz, passei. Fui convidado para fazer o doutorado na UFG mas aí não tinha condição mais, era muita coisa.

No ano 1998, eu lancei o canal TV Agro, o canal TV agro era – vamos dizer assim – na época, era internet. E o quê que eu fazia na Internet, eu virava para as pessoas e perguntava: ‘Ah, o senhor é pecuarista? (Sou). Tem celular? (Tenho). Eu posso mandar por e-mail algumas coisas para você’? E aí eu fui pegando, fui pegando e peguei o e-mail de todo mundo que eu conhecia e eu mandava as notícias assim, por e-mail. Hoje, o Canal TV Agro é o segundo maior canal de agronomia do Brasil. Então o esforço é muito importante, estude, trabalhe. Tem que sair e namorar? Sim, mas trabalhe muito. Olha onde eu comecei e onde eu estou agora.

Muito obrigado por nos receber, Antônio. Foi um prazer conversar com você.

Ah, quê isso! O prazer foi meu! E só mais uma coisa, não precisa me chamar de Antônio, meus amigos me chamam de ‘Botina’, onde quer que eu vá, eu estou calçando elas. Obrigado, até mais.

One thought on “Veterano do Jornalismo em Agro, Antônio Pereira destaca a importância de inovar para o sucesso na profissão: ‘A gente tem que buscar coisa nova. Pular fora da caixa’”

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