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Rapper Djonga no Goiás Tattoo Festival 2022
Foto: Luanna Marques

Se temos que apropriação cultural é apoderar-se de elementos de uma cultura, então podemos dizer que foi isso que a organização do Rep Festival tentou fazer recentemente: lucrar em cima da paixão que as pessoas têm pelo que a cultura hip hop representa.

Considerado o maior evento de rap do Brasil, o Rep Festival entregou em 2023 a sua 4ª edição. Com três palcos simultâneos e 100 atrações confirmadas, o festival ganhou destaque no cenário da música, muito disso por causa de sua estrutura e artistas selecionados.

Mas o que explica mobilizar um público fã de rap para um evento que tem na line up a cantora Luísa Sonza? Como se não bastasse o fato da artista não fazer parte do estilo musical ao qual o festival se dedica – Luísa é uma cantora pop –, no ano de 2019 a mesma cometeu o crime de racismo contra a advogada Isabel Macedo de Jesus e pagará indenização pela ação.

Fica complicado ordenar o que é mais revoltante nessa situação: nomes como Don L e Clara Lima que não foram sequer convidados para o evento; cantora pop e com crime de racismo nas costas confirmada; ou ingressos absurdamente caros. Fica a dúvida: Será que os organizadores de fato escutam rap nacional e apreciam a cultura hip hop?

Falando em retorno financeiro – afinal, não podemos fingir que este não é um tópico relevante – o público tende a movimentar mais eventos que têm artistas com grandes números em plataformas digitais e maior visibilidade, o que resulta em ingressos com valor elevado e inacessíveis para as pessoas que moram em comunidades, às quais a maior parte dos rappers se direciona nas letras.

Rappers underground não rendem tanto lucro em comparação com o “hip hop mainstream”, que são aqueles que estão sempre no topo do Spotify, em alta no Youtube e aparecem até em rede nacional, como L7nnon e Filipe Ret, mas que não tem como “marca” o grito da favela como, por exemplo, Kmilla CDD e MC Marechal.

A problemática dos ingressos caros que resultam em um público mais elitista não é de agora. Em entrevista ao Podcast Flow, o rapper DK47 fala sobre a importância da mensagem furar a bolha e chegar tanto nas comunidades quanto na elite.

“O rap chega tanto em quem não tem noção do que acontece nas favelas, quanto em quem mora na favela e não tem noção do que acontece na política, pois muitas vezes essa pessoa trabalha 12h por dia, preocupada em fazer dinheiro para se alimentar e sobreviver”, comenta DK47.

Ainda na conversa, DK sugere que seria interessante que os próprios artistas da cena tivessem a iniciativa de organizar festivais desse tipo. O acesso aos cantores seria mais fácil, teríamos a inclusão de nomes que são esquecidos por grandes organizações e o lucro poderia retornar para a comunidade.

A ideia foi colocada em prática. O rapper Orochi, dono da gravadora Mainstreet Records, anunciou oficialmente o primeiro Mainstreet Festival. O evento acontecerá no dia 05 de maio de 2023 no Rio Centro, localizado no Rio de Janeiro. Entretanto, na line up, apenas artistas que fazem parte da gravadora, modesta presença de mulheres, sem artistas menores em termos de expressão e o preço do ingresso também não agradou.

Ainda em 2022, quando foi divulgada a line up do Rep Festival, a repercussão negativa em cima do nome de Luísa Sonza fez com que a organização voltasse atrás e substituísse a cantora pelo rapper Don L.

A cobrança por um festival com a presença de mais mulheres e rappers underground está acontecendo. Representatividade não é um favor, é uma forma de demonstrar respeito a cultura e ideais do hip hop. Entretanto, da mesma forma que os organizadores precisam se mobilizar com atenção, cientes de que não é “qualquer artista” que serve, essa cobrança precisa sair das redes sociais e ser compatível com os comportamentos do público.

É necessária uma mudança na estrutura, se não, novamente teremos nomes como Luísa Sonza preenchendo os lugares de Flora Matos, Tasha e Tracie, NINA, Budah, Kmila CDD, Mc Luanna, Dalsin, Sant e ADL. E assim, a favela não vence.

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