Anne Mota fala sobre ‘Alice Júnior: Férias de Verão’ e obstáculos na carreira: ‘A gente precisa de protagonismo trans cada vez mais’

A atriz comentou sobre a sensação de voltar a protagonizar um filme e também sobre a falta de oportunidades para pessoas trans no audiovisual
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Anne Mota, 25 anos, se prepara para a sequência de ‘Alice Júnior’. Lançado em 2019, o filme conta a história de uma adolescente trans que se muda para o interior do Paraná devido ao trabalho de seu pai. Lá, Alice luta contra o preconceito na nova escola enquanto sonha em realizar seu maior sonho: dar o primeiro beijo.

O filme foi um sucesso entre os críticos de cinema, recebeu 21 prêmios e 5 menções honrosas em 55 seleções em festivais. Uma sequência, chamada ‘Alice Júnior: Férias de Verão’, foi anunciada há pouco e as gravações devem começar nesta semana.

A equipe do Lab Notícias entrou em contato com a atriz para conversar sobre a longa-metragem, a carreira e as dificuldades que pessoas trans sofrem no meio audiovisual.

Anne Mota com o visual de Alice Júnior (Foto: Reprodução/Instagram)

Lab Notícias (LN): Anne, você imaginava que chegaria onde está hoje, estrelando seu segundo filme enquanto protagonista?

Anne Mota: Não. Na verdade, não. Eu não penso onde eu posso chegar assim. Eu aspiro muito as coisas, sonho com muitas coisas, eu desejo muitas coisas, mas eu não fico pensando: ‘Aí, será que vai acontecer? Será que não vai acontecer?’. Então, eu tô muito feliz porque é um sonho realizado. Alice Júnior é um trabalho lindo, o roteiro tá lindo, o primeiro também já era perfeito, esse segundo tá mais perfeito ainda… Então, é um sonho realizado mas eu não imaginava que tudo isso poderia acontecer, né? E eu nem sei o que de repente vai acontecer porque o filme não foi lançado ainda. Não sei como vai ser essa recepção desse segundo filme… Não sei o que pode acontecer com termos de visibilidade, mas eu tô muito feliz já pelo processo que eu tô vivendo. 

Lab Notícias (LN): Quais obstáculos na carreira você enfrentou para chegar até aqui? Algum deles ainda faz presença? 

Anne Mota: Acho que o maior obstáculo que pessoas trans no audiovisual enfrentam é a falta de oportunidade mesmo. Com certeza, esse é o maior. Toda obra audiovisual que você vê, seja novela, série, filme, longa-metragem ou curta-metragem, você sempre vai ver pessoas cis nele, mas você não vê sempre pelo menos um ator ou atriz trans, né? Quando tem, é muita raridade. Por exemplo, em toda novela tem ator trans? Em toda série da Netflix ou qualquer obra? Qualquer streaming, no caso, tem ator trans? Mas ator cis? Sempre tem. Então a falta de oportunidade no mercado para a gente é um problema real. Quando tem oportunidade em uma determinada obra, é assim… Um milhão de pessoas trans no meio artístico disputando essa uma vaga. Então, é muito difícil. O problema que eu enfrentei desde que eu comecei minha carreira no audiovisual e enfrento até hoje é realmente a falta de oportunidade.

Lab Notícias (LN): Qual a sensação de voltar a contar a história de Alice Júnior novamente depois de anos? 

Anne Mota: Eu tô muito feliz porque agora a Alice tá diferente em vários aspectos. Ela não é mais adolescente, começa por aí. Ela não tem mais 16 anos como ela tinha no primeiro. Agora ela tem 22 anos. Então ela já tá adulta. Acho que o próprio nome do filme já indica muita coisa: ‘Alice Júnior: Férias de Verão’. Daí é verão, umas férias e muita loucura! O que é que se faz no verão? Onde é que é o verão da Alice? Então eu tô muito feliz de estar interpretando a Alice de novo. Muito mesmo. O trabalho tá lindo, a personagem tá maravilhosa, tá babadeiro o enredo da Alice do começo até o fim, tá muito incrível. É uma história do Luiz Bertazzo. E eu tô muito feliz! Já fiz outros trabalhos depois de Alice Júnior, mas Alice Júnior em específico é um trabalho que eu sou muito apaixonada.

Capa do caderno do roteiro de ‘Alice Júnior 2 – Férias de Verão’ (Foto: Reprodução/Instagram)

Lab Notícias (LN): Como anunciado, Alice Júnior 2 contará com alguns nomes e a mesma equipe do filme original. Como está sendo o reencontro com seus colegas?

Anne Mota: Achei incrível! Eu amo a Thaís, que interpreta a Viviane. Ela é hiper, mega, ultra, super, todos os adjetivos possíveis, engraçada. Me faz rir horrores! Fala cada coisa! Nos ensaios eu já caí no chão de tanto rir. Ela é muito engraçada. Eu juro a você! Essa garota é incrível. Eu amei reencontrar o Igor, que interpreta o Lino. A gente saiu juntos várias vezes já. A Surya, que interpreta a Taísa… Tá sendo um processo muito legal, incrível mesmo de reencontrar o pessoal, de verdade. Tá sendo um babado também reencontrar a equipe! Todo mundo realmente ficou muito próximo no primeiro filme. 

Lab Notícias (LN): Lembro que, quando tinha 14 anos, assisti ao primeiro filme e tive uma sensação de realização ao perceber que histórias que envolvem pessoas LGBTQIAPN+ não precisam ser necessariamente ligadas à tragédia e rejeição parental, mas também podem ser leves, felizes e divertidas. Nesse sentido, ao seu ver, qual o peso de mais filmes como Alice Júnior? 

Anne Mota: Eu acho que é mega necessário. A gente precisa de protagonismo trans cada vez mais para que percebam o talento dos atores e das atrizes trans, pra gente ter mais oportunidade no audiovisual, para que nossas histórias sejam contadas, para que histórias de crianças e adolescentes trans tenham visibilidade e para que a gente tenha mais oportunidade no audiovisual. Eu acho que contar mais histórias de protagonismo trans é extremamente interessante para toda a população. Assim, por várias justificativas, por vários argumentos, sendo vários deles, por exemplo: a audiência não é composta só por pessoas cis, né? Pessoas trans também assistem filmes, também vão pro cinema, também assinam streamings… Então, pessoas trans também querem se ver nessas obras. As pessoas trans que assistem também querem estar ali dentro, querem se ver ali dentro. E a outra coisa é que as pessoas cis que assistem também precisam saber que nós existimos, que nós estamos ali, que nos podemos ocupar esse lugar, que nos vamos ocupar esse lugar. 

O público pode assistir ao primeiro filme de Alice Júnior através das plataformas indicadas na imagem (Foto: Reprodução/Instagram)

Lab Notícias (LN): Ainda quanto à representatividade, sabemos que pessoas trans, em grande maioria, sofrem com a ausência de oportunidades também na arte. Sendo assim, qual a importância da luta contra o chamado “transfake”? 

Anne Mota: É urgente. É uma luta extremamente necessária. Eu estava falando nas últimas entrevistas que a gente melhorou muito, que nós avançamos muito… Só que assim, eu não vou citar nenhum nome porque eu também não quero ser prejudicada, mas a gente teve literalmente um filme que acabou lançar, tá percorrendo vários festivais de cinema do Brasil e o protagonista está fazendo uma pessoa trans, mas ele é uma pessoa trans? Não, é transfake. Ou seja, o personagem principal é transfake. A gente pensa que a gente tá avançando, que a gente tá dando vários passos pra frente, só que a gente dá dez para trás. Acho que as pessoas precisam parar de uma vez por todas de normalizar atores cis interpretando pessoas trans. Nós já não temos oportunidade no audiovisual… Por que vocês vão tirar as poucas que nós temos? Se em algum momento da nossa existência no planeta Terra, pessoas cis e pessoas trans estiverem em pé de igualdade, principalmente no audiovisual, em outros meios também, claro, mas tô falando especificamente do audiovisual, aí assim a gente pode discutir atores cis interpretando pessoas trans, mas enquanto a gente não tá com oportunidades iguais, por quê vocês querem tirar nossa oportunidade? Por que vocês querem que a gente obedeça vocês? Por que vocês querem que a gente seja inferior a vocês? Não faz sentido. É transfóbico e ponto.

Lab Notícias (LN): Há algum spoiler sobre o novo filme que poderia nos contar?

Anne Mota: O máximo que eu posso contar é que todos os personagens são adultos, todos estão na casa dos 20. O filme vai se passar na Ilha do Mel, então é uma ilha daqui de Curitiba. Ela é adulta, Ilha do Mel, personagens antigos voltam: Lino, Vivi, Taísa, Bruno, Jean e Marisa. E temos personagens novos! Temos um total de cinco personagens trans! Antes só tinha eu, agora temos cinco no total. Então, tá babado essa parte!

Lab Notícias (LN): Teria algo a mais que você gostaria de acrescentar ou pontuar?

Anne Mota: Me sigam no Instagram! Eu tô sempre atualizando as coisas por lá e contando muitas novidades do filme por lá! 

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