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O estudo “Consequências da Violação do Direito à Educação”, parceria da Fundação Roberto Marinho com o Insper, publicado em 14 de julho de 2020, calculou a perda social e econômica para os jovens e para o país, com a não conclusão da educação básica. Com base em dados da PNAD/IBGE de diferentes anos, a pesquisa produziu tabelas, gráficos e estatísticas que apresentam as consequências da evasão escolar no Brasil.
Os dados coletados mostram que a evasão escolar atinge mais de 500.000 jovens acima de 16 anos por ano. Logo, os números expõem um grave ferimento ao Art. 205 da Constituição, que diz que a educação é direito de todos e visa o pleno desenvolvimento do indivíduo, o preparando para o exercício da cidadania e sua qualificação para o mercado de trabalho.
“A desigualdade no sistema educacional afeta a inserção dos jovens no mercado de trabalho, a sua possibilidade de exercer sua cidadania de forma plena e, eventualmente, o próprio desenvolvimento econômico do país” (FRM, 2020)

Houve um considerável progresso no acesso à educação nos últimos 10 anos, resultando em uma maior participação de jovens no ensino superior. No entanto, existem diversos obstáculos a serem superados nessa área, e são as pessoas negras e com baixa renda que sofrem os impactos mais significativos.
O Atlas das Juventudes, que trabalha no processamento, atualização e sistematização das principais bases de dados do país, apresentou em seu relatório gráficos que evidenciam essa realidade:


As principais causas
Entre os principais motivos para a evasão escolar, os mais apontados nos dados do IBGE são : a necessidade de trabalhar (39,1%) e a falta de interesse (29,2%). Entre as mulheres, destaca-se ainda gravidez (23,8%) e afazeres domésticos (11,5%).
“Esses dois principais motivos somados alcançam cerca de 70% desses jovens, independentemente da região, e sugerem a necessidade de medidas que incentivem a permanência dos jovens na escola. A taxa de analfabetismo no país (6,6%) está em queda constante, atingindo quase à universalização do ensino. Mas elevar o nível de escolarização até a conclusão do ensino médio ainda parece ser um desafio”, explicou a analista da pesquisa Adriana Beringuy em entrevista para a Agência de Notícias do IBGE.
Esse foi o caso de Rafael Rodrigues, empreendedor de 19 anos que estudou todos os seus anos escolares em um colégio público próximo à sua casa. O jovem relatou que, ao se deparar com o ensino híbrido durante a pandemia, abandonou o ensino médio em seu último ano, devido a necessidade de trabalhar e pela escola não atender suas expectativas e necessidades.
“Acredito que o sistema educacional é muito falho na hora de preparar o estudante para a vida. Ele falha com pessoas que tem habilidades à serem desenvolvidas nos ramos artístico, esportivo ou do empreendedorismo, como é o meu caso”
– Rafael Rodrigues
Apesar do sucesso profissional e satisfação pessoal de Rafael com sua empresa de marketing digital, essa não é a sorte de milhares de jovens brasileiros que precisam sacrificar seus sonhos acadêmicos em prol da sobrevivência. O filme brasileiro “Que Horas Ela Volta?”, dirigido por Anna Muylaert, aborda de forma sensível e contundente a evasão escolar como resultado das desigualdades sociais no Brasil.
A pandemia foi também um avassalador agravante nos índices, pois dificultou o acesso à educação para muitos alunos, especialmente aqueles que não possuíam recursos tecnológicos adequados ou acesso à internet. Além de ter gerado significativos impactos econômicos e emocionais na vida de jovens estudantes. De acordo com a PNAD Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), cerca de 244 mil crianças e adolescentes entre 6 e 14 anos estavam fora da escola no segundo trimestre de 2021. Esse número representa um aumento de 171% em comparação a 2019, ao qual 90 mil crianças não estavam frequentando a escola.
As consequências
Os dados levantados pelo estudo “Consequências da Violação do Direito à Educação” mostram que a não conclusão da educação básica ocasiona uma perda de 3,2 anos de vida e 3,3 anos de vida saudável, fazendo que o valor da vida do jovem aos 25 anos seja R$131 mil menor do que seria caso concluísse a educação média. Essas perdas representam 6% do que poderia ser alcançado caso a educação básica fosse concluída.
A evasão escolar pode ter um impacto negativo na longevidade de uma pessoa de várias maneiras. A formação acadêmica desempenha um papel importante em futuras oportunidades dentro do mercado de trabalho, logo, à remuneração necessária para uma boa qualidade de vida. A falta de educação também pode afetar negativamente a capacidade de uma pessoa tomar decisões informadas sobre sua saúde, buscar atendimento médico quando necessário e adotar estilos de vida saudáveis.
Relacionado aos índices de longevidade, a evasão escolar pode desencadear comportamentos de risco, como o envolvimento em atividades criminosas e o uso de drogas. Dados do Atlas das Juventudes mostram que cada ano somado de escolaridade reduz em torno de 20% o risco de envolvimento em conflito armado. O filme brasileiro “Cidade de Deus”, dirigido por Fernando Meirelles, retrata a realidade dura e complexa da favela homônima no Rio de Janeiro. Nessa narrativa intensa, a evasão escolar emerge como um tema crucial, evidenciando personagens que, diante da falta de oportunidades e da influência do crime organizado, encontram-se tentados a abandonar os estudos.
Além de afetar diretamente a vida dos jovens que optam pela evasão escolar, o Brasil perde R$ 220 bilhões a cada ano por causa do abandono ao Ensino Médio. Dados mostram que a escolaridade média dos jovens que não concluem a educação básica é de 6,8 anos de estudo e o correspondente valor presente de sua remuneração do trabalho R$ 269 mil. Caso concluíssem a educação básica e alcançassem uma escolaridade de 11 anos de estudo, estima-se que o valor presente de sua remuneração do trabalho passaria a ser de R$ 427 mil.

“O tamanho dessa perda pode ser melhor captado considerando-se diferentes parâmetros: equivale a dois terços do gasto público anual com a educação básica de mais de 40 milhões de estudantes; 3,3% do PIB nacional e mais de quatro vezes o custo total por estudante referente a uma trajetória regular de 14 anos de educação”, evidencia o estudo.
Outros números apontados pelo Atlas das Juventudes mostram que:
• Se os adultos tivessem apenas mais dois anos de escolaridade, 60 milhões de pessoas seriam retiradas da pobreza
• Cada ano adicional de escolaridade aumenta o crescimento médio anual do produto interno bruto (PIB) em 0,37%
• Cada dólar investido em um ano adicional nos anos médios de escolaridade gera mais de US$ 5 em ganhos brutos adicionais em países de baixa renda e US$ 2,5 em países de renda média-baixa
Políticas e medidas de Intervenção
Considerando a evasão escolar como um assunto de interesse coletivo e com impacto social e econômico do país, muitas ações já foram realizadas no âmbito nacional. Dentre as políticas de sucesso que podem ser destacadas, estão o Prouni e o Pnaes.
• Programa Universidade para Todos (Prouni) – lei n° 11.096, de 13 de janeiro de 2005: concede bolsas de estudo integrais e parciais em instituições de ensino superior privadas para estudantes brasileiros de baixa renda. O objetivo é democratizar o acesso à educação superior, ampliar vagas, estimular o processo de inclusão social e, indiretamente, contribuir para a geração de trabalho e renda aos jovens. As instituições de ensino participantes recebem isenção de alguns tributos federais.
• Programa Nacional de Assistência Estudantil (Pnaes) – decreto n° 7.234, de 19 de julho de 2010: destinado a democratizar o acesso e a permanência de estudantes de baixa renda em cursos de graduação presencial das instituições federais de ensino superior. O objetivo é reduzir as taxas de evasão e retenção, minimizar os efeitos das desigualdades sociais e regionais na permanência e conclusão da educação superior e elevar as taxas de diplomação.
“Os governos devem abraçar sua obrigação constitucional de construir sistemas de educação sólidos que forneçam educação de qualidade em diferentes níveis educacionais. Os cidadãos devem permanecer engajados e demandar dos governos. Mas o mais importante: jovens devem, e irão, desempenhar um grande papel em garantir que esforços sejam canalizados de forma articulada e tangível, seja através de ONGs, de negócios sustentáveis, de iniciativas sociais e outras plataformas para oferecer educação de qualidade de modo a construir um futuro seguro e próspero para a próxima geração.” Considerou Gideon Olanrewaju, da Global Partnership for Education, como medidas de intervenção.
Uma síntese de evidências realizadas pela CODEPLAN apontou como intervenções acessíveis à realidade brasileira e efetivas :
1. Promover espaços de diálogo e acesso à informação, como comitês escolares protagonizados por pais e/ou responsáveis para fiscalizar o orçamento, qualidade do ensino e frequência escolar. Reuniões frequentes entre pais/responsáveis e professores para abordar dificuldades dos alunos e propor soluções. Ambientes de diálogo com estudantes para informar sobre carreiras, salários e ingresso no ensino superior.
2. Melhorar condições de acesso e permanência na escola, incluindo segurança alimentar, saúde e higiene. Garantir acesso a material e uniforme escolar, melhorar a mobilidade até a escola e a infraestrutura das escolas. A oferta de merenda escolar, por exemplo, pode aumentar a frequência e o aprendizado dos alunos.
3. Oferecer programas de transferência de renda que exigem frequência escolar, alimentação adequada e vacinação atualizada. Esses programas envolvem repasses regulares de recursos monetários para famílias em condição de pobreza, com o dinheiro depositado em nome da mulher responsável pela família e critérios de acesso que consideram a presença de filhos/gestantes.
Cássia Dutra, graduada em Letras e Pedagogia pela USP e professora da Instituição Mackenzie, aponta a participação familiar no desempenho escolar dos jovens como um cuidado eficaz na prevenção . “Eu sempre digo que o segredo do bom desempenho escolar é um tripé: escola, família e estudante. Se a família não faz sua parte de cobrar e fornecer condições para que o aluno se desenvolva, a escola não conseguirá sozinha. A escola tenta envolver a família no processo dando todas as informações sobre as atividades, fazendo reuniões de pais e mestres, chamando para comunicar possíveis comportamentos que fogem da normalidade. Mas infelizmente muitos pais não se envolvem ou não dão atenção ao que a escola aponta em relação aos desvios comportamentais.”