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Médico e professor, Wesley Flávio compartilha um pouco da sua rotina como médico de família, além de destrinchar mais de sua área de atuação na medicina
A Medicina de Família e Comunidade (MFC) é uma área da medicina que se encarrega de fazer o primeiro contato com o paciente, de uma maneira mais íntima e focada na individualidade de cada vida que passa pelo consultório — de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a medicina preventiva é capaz de tratar de até 85% dos casos de problemas de saúde. Essa vertente da saúde iniciou-se no Brasil em 1974, à época ainda como um projeto regional na cidade de Porto Alegre, e a prática gerou resultados positivos a ponto de, em 1986, o Conselho Nacional de Medicina reconhecer essa especialidade médica e dar espaço para a realização do primeiro Congresso Brasileiro de MFC.
E para entender melhor o dia a dia dos profissionais, o médico Wesley Flávio, 29 anos, médico formado pela UnB, especializado em Medicina de Família e Comunidade e professor universitário pela UniCEUB, diz como é sua rotina dentro dos postos de saúde e fala mais sobre essa categoria que vem crescendo ano após ano.
Wesley Flávio / Fonte: acervo pessoal
Como você apresentaria a sua área — Medicina da Família — para alguém que não conhece do assunto?
Wesley Flávio: A medicina de família e comunidade (também conhecida como MFC) é uma especialidade médica como todas as demais, seja ginecologia, neurologia, cirurgia geral, entre outras. Mas diferente dessas especialidades que focam em alguns tipos de doença (psiquiatria lidando com doenças mentais, cardiologia tratando doenças cardiovasculares), ou ainda especialidades que atendem certos grupos etários (pediatria com atendimento a crianças e geriatria se especializando em cuidar de idosos), a MFC atende todas as populações. Dessa forma, somos especialistas em pessoas, independente de qual for a queixa que ela traga pra a consulta, sem distinção de credo, cor, raça, orientação sexual e etc. Assim, nossa especialidade é fundamental para o funcionamento adequado de qualquer sistema de saúde, tanto na rede pública quanto na rede privada.
Por que escolheu se especializar nessa área?
Wesley Flávio: Quando terminei a faculdade, tinha o desejo de fazer uma residência médica (especialização em uma determinada área). Contudo, gostava um pouco de todas as áreas da medicina e ficava desanimado, pensando que talvez atenderia somente uma condição específica, e não era isso o que eu queria. Além disso, gostaria de uma rotina sem plantões e um pouco mais controlada, que me permitisse ter uma boa vida fora da medicina. O fato da residência em MFC durar dois anos também me facilitou essa escolha, porque não queria fazer uma residência muito longa (de cinco a seis anos, como são muitas outras). Juntando isso tudo, eu fiz a aposta na MFC, ainda sem muito conhecer como era a rotina e o mercado de trabalho, e foi uma decisão muito acertada pra mim! Não me vejo fazendo outra coisa atualmente.
Pelo contato que você já teve com as demais especializações, quais as principais diferenças delas com a medicina familiar?
Wesley Flávio: essa pergunta passa um pouquinho por coisas que já comentei anteriormente. Mas um outro ponto interessante de comentar é que, na minha área, geralmente estamos na atenção primária à saúde, ou seja, é o primeiro contato do paciente com o sistema de saúde (geralmente em unidades básicas de saúde, ou UBS, os famosos “postinhos”). Dessa forma, nos encontramos na ponta da lança. Para se ter uma ideia da dimensão do desafio, pensando na rede pública e no SUS (Sistema Único de Saúde), o médico de família, de um modo geral, trabalha na porta de entrada de um dos maiores sistemas públicos do mundo, necessitando atender infinitas possibilidades de demanda. Já as outras especialidades atendem em outros níveis de atenção (geralmente em hospitais, emergências e ambulatórios), com seus desafios próprios também.
Como é o cotidiano nos postos de saúde?
Wesley Flávio: o dia a dia no posto de saúde é bastante corrido. Temos uma série de atribuições e metas para cumprir. Os atendimentos (consultas) compõem grande parte do nosso tempo, porém fazemos outras coisas. Temos reuniões de equipe para ajustar processos de trabalho com todos ali na unidade, fazemos visitas domiciliares e resolvemos demandas burocráticas, por exemplo. No meu caso, que sou preceptor [de residência], também discuto casos com os alunos e ajudo na formação de internos de medicina e residentes (quem está se especializando). O tempo voa com tanta coisa para fazer!
Wesley Flávio / Fonte: acervo pessoal
Como funciona a divisão de afazeres dentro de um postinho de saúde?
Wesley Flávio: A divisão de tarefas se orienta principalmente devido às categorias profissionais. O gestor na unidade, junto com seu auxiliar administrativo, tem a função de garantir o pleno funcionamento da unidade e sua manutenção, além de garantir que enfermeiros, odontologistas, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, médicos e muito mais tenham como fazer suas consultas e procedimentos da melhor maneira possível. Os técnicos geralmente participam do acolhimento, triagem dos pacientes e aplicação de medicações; o farmacêutico disponibiliza os remédios; a equipe da limpeza tem a função de deixar tudo limpo e organizado; a segurança garante a organização e seguridade de todos que frequentam a UBS e por aí vai. Contudo, algumas atribuições são de campo comum entre todos os integrantes, como participar ativamente do processo de trabalho, organização da unidade e acolher os pacientes, por exemplo.
A interação com os pacientes é diferente para um médico de família?
Wesley Flávio: A interação dos pacientes com o médico de família e comunidade é única, porque nós acompanhamos os pacientes ao longo de toda a sua vida. Já fiz o pré-natal de uma paciente, depois atendo o pós-parto e faço as consultas da criança que nasceu, e digo que casos assim são muito comuns. Nós nos vinculamos com as famílias e conhecemos com profundidade nossa população. Ter essa proximidade é fundamental para ofertarmos um cuidado em saúde mais individualizado e resolutivo, e esse é um dos diferenciais da nossa especialidade (os outros especialistas muitas vezes vão ter encontros breves com os pacientes, não tendo tanta oportunidade para aprofundar nas relações).
Como é a infraestrutura fornecida para você trabalhar?
Wesley Flávio: Em termos de infraestrutura, temos uma heterogeneidade muito grande. Muitas vezes os médicos de família e a equipe da unidade básica não dispõem de infraestrutura ideal para seu trabalho, às vezes, sem conforto e espaço físico suficiente. Já trabalhei em locais mais precários, porém minhas condições de trabalho atuais são muito boas. Temos que avançar muito nesse aspecto, pois impacta diretamente no nosso trabalho.
Achei muito interessante saber como funciona As Ubs e tb como é na prática a especialidade de médico da família.