Um novo mundo se aproxima – Análise do episódio 05

O quinto episódio da terceira temporada de The Mandalorian reúne, justifica e trabalha de forma maestral tudo que foi abordado até aqui nos episódios anteriores
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A primeira metade da temporada foi focada em pontos relativamente distantes um do outro, como o treinamento de Grogu e suas memórias, a redenção de Din Djarin e Bo-Katan e o perigo que um ex-imperial pode causar a uma república recém-formada. Já o último episódio conseguiu reunir todos esses pontos, ao mesmo tempo que projeta quais conflitos os personagens vão enfrentar daqui pra frente e ainda insere vestígios a respeito do futuro de outras produções da franquia.

De volta a Nevarro

A essa altura, o planeta já é uma parte tão importante da narrativa que se torna quase um personagem distinto, carregando consigo uma conjuntura complexa e desfechos quase imprevisíveis de um período para o outro. No início da temporada o planeta vive sua época de ascensão sendo um ponto comercial estratégico na orla exterior e, sob o comando de Greef Carga (Carl Weathers), dispensa qualquer relação com a Nova República por temer que um tipo de organização política como aquela acabe atrapalhando o caminho de independência de sua população.

O que descobrimos ser um erro, uma vez que a Nova República está estabelecida apenas há dez anos após a derrota do Império para a Aliança Rebelde e busca aliados para se fortalecer. É possível notar que a Nova República precisa de setores estratégicos para aumentar sua capacidade de defesa, ao passo que um planeta tão indefeso como Nevarro precisa de uma aliança militar para se defender de ataques e invasões até mesmo do próprio Império, que foi derrotado, mas não desapareceu, já que nem mesmo Moff Gideon (Giancarlo Esposito) foi levado para seu julgamento e agora está desaparecido pela galáxia e talvez retorne para completar seus planos.

Ao ver seu planeta ser invadido pelos piratas que apareceram no início da temporada e retornaram em busca de  vingança, Greef Carga solicita ajuda imediata da base militar da Nova República. A ajuda é negada, por um lado por falta de recursos básicos para conseguir se deslocar até o planeta, e por outro, devido a uma burocracia estatal que permite que apenas poucas pessoas em uma sala decidam a urgência de um cenário de guerra daquela proporção. Diante dessa falha da Nova República, os mandalorianos entram em ação para salvar o planeta.

Mandalorianos chegam para salvar Nevarro – LucasFilm/Reprodução

O passado está tentando dizer algo sobre o futuro

Surgindo como o mediador da situação, o Capitão Carson Teva (Paul Sun Hyung Lee) é um rebelde que lutou contra as forças do Império e, por compreender a urgência do assunto, busca de imediato uma resposta à invasão, resposta essa que dá luz a um novo caminho tanto para o povo de Navarro, como para quem irá se colocar na linha de frente para salvá-los. Teva entende também o perigo de se confiar em um ex-imperial com altos cargos de comando dentro da Nova República e mantém uma postura de desconfiança justificável em relação a Elia Kane. 

Para ele, a solução para o povo não pode estar atrelada a uma instituição que se mantém inerte em vista de uma situação de injustiça e com esse nível de delicadeza. Por ser um rebelde radicalizado pelos horrores do que o império pode produzir, Teva compreende que apenas atingir a raiz do problema vai fazer com que ele deixe de existir de fato, a burocracia estatal como garantia de segurança plena de uma população é uma farsa quando usada para mascarar esses mesmos problemas.

“Tem algo perigoso acontecendo lá fora. Todos esses eventos não são coincidência, e quando isso se tornar grande demais para agirem, talvez seja tarde demais. “ 

Capitão Teva alerta sobre o perigo do império ressurgir a partir da inércia dos dirigentes da Nova República


The Mandalorian já provou que sabe como trabalhar bem com elementos de outras mídias de Star Wars, seja por homenagear eventos de filmes anteriores ou até mesmo inserir personagens de outras produções dentro do contexto da série, como o caso da aparição de Ahsoka Tano, da unidade  R5-D4 e da própria Bo-Katan.  E, nesse episódio, isso acontece de uma forma muito sutil com a breve aparição de Zeb Orrelios, personagem que sai da animação Star Wars – Rebels e sugere de que forma vão surgir outros personagens da mesma animação em outras séries do universo. Como o caso de seus colegas de aventuras, Ezra BridgerSabine Wren, que serão  interpretados por Eman Esfandi e Natasha Liu, respectivamente, na vindoura série da  Ahsoka Tano, que tem estreia prevista para o segundo semestre de 2023. 

Capitão Teva conversa com Zeb Orrelios – LucasFilm/Reprodução

The Mandalorian

Desde a sua primeira temporada, conhecemos Din Djarin como protagonista da série, mas a verdade é que o título em inglês dá espaço para questionar esse protagonismo, uma vez que o artigo definido “The” em inglês é invariável em gênero e número, ao contrário do que acontece em português. Nesse sentido, é interessante pensar que The Mandalorian pode ser absolutamente qualquer um dos mandalorianos. E é isso o que acontece nessa temporada, Bo-Katan é a protagonista da vez, o espaço que a personagem tem dentro das linhas narrativas não são apenas demonstração de sua força, mas sim, uma forma direta de contar parte de sua história. 

Nesse episódio, Bo lidera os Mandalorianos em mais uma missão de extrema importância para o clã. Ao atender a solicitação do Capitão Teva e salvar Nevarro da invasão dos piratas, a personagem vai consagrar o futuro de seu povo e decidir junto a eles que precisam de um novo lar, precisam sair das sombras e estabelecer um ponto de recomeço para o povo de Mandalore. Nevarro será esse lar e a profecia dará mais um passo adiante rumo ao seu cumprimento.

Bo-Katan lidera os Filhos do Olho – LucasFilm/Reprodução

A relação de Bo com a doutrina mudou radicalmente ao longo dessa temporada, indo de uma transgressora que não acreditava na profecia a uma líder indispensável para os mandalorianos remanescentes. A maneira como ela demonstra respeito pela mitologia por ouvir o que a Armeira tem a dizer revela como as nuances da personagem a tornam um ponto fundamental para a história.  Bo não está junto ao clã por conveniência e seu interesse pelo Mitosauro não é apenas uma curiosidade de quem viu a criatura pessoalmente, se restava dúvidas que Bo seria responsável por cumprir a profecia, esse episódio sana todas elas, confirmando que é dela o dever de reunir o seu povo. 

O trigo e o joio 

Ao solicitar que Bo removesse seu capacete, a Armeira entende que apenas quem esteve entre os Mandalorianos sem fé conseguiria tocá-los de maneira mais sensível. Afinal, nada como um ex-ateísta para ser um religioso fiel, livre de qualquer irracionalidade em relação a seus dogmas e nada como um ex-crente para ser um bom ateu, uma vez que seus dogmas morreram e agora o seu lugar de não crença é apenas um detalhe pequeno em sua vida. 

Bo-Katan é recebida pelos mandaloriamos após conversar com a Armeria
LucasFilm/Reprodução

Bo esteve dos dois lados da moeda e se envolveu profundamente entre os mandalorianos em setores que nem mesmo Din esteve. Ela nasceu em uma família que pertencia à realeza de Mandalore,  serviu a Death Watch por um período e lutou até mesmo do lado dos Rebeldes. Sua relação com a profecia agora é mais profunda do que nunca, e a Armeira sabe que para que a profecia se cumpra será necessário tolerar os outros mandalorianos que não pertencem ao clã dos Filhos do Olho. 

Em entrevista, Jon Favreau deu mais detalhes a respeito da Armeira: dentro da série, ela funciona como um guia espiritual, um xamã que leva o protagonista rumo à sua jornada sem interferir nesse processo. Embora os mandalorianos tenham seus guerreiros e líderes políticos, o papel do armeiro é um título transmitido por gerações para atuar como um pilar espiritual para a comunidade, e ver como a Armeira tem sua importância cada vez melhor explorada na série tem sido uma experiência de fato interessante. 

Armeira durante reunião dos mandalorianos
LucasFilm/Reprodução

Esse texto foi produzido pela equipe do Correio Cultural, de autoria de Fábio Prado e revisão de Hayane Bonfim e João Vitor de Jesus.

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