‘Lei não trata pessoas gestantes como capazes de tomar decisões sobre sua vida reprodutiva’: análises da Lei Anti-Aborto aprovada pela ALEGO

No Brasil apenas em 3 casos se tem a legalidade do aborto: quando se há risco à vida da mulher, com a anencefalia do feto ou quando a gestação advém de estupro. Mesmo sendo garantida a nível Federal, no Estado de Goiás foi aprovada uma lei para que a mulher altere sua opinião nesses casos e faça com que ela permaneça com a gestação.
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Aprovada no dia 11 de janeiro de 2024 pela Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, a Lei Nº 22.537 gerou comoção nas redes sociais goianas por instituir uma campanha de conscientização contra o aborto para as mulheres do Estado.

Tendo como um dos incisos a promoção de exame de ultrassom com os batimentos cardíacos do feto para a genitora, especialistas mulheres analisam, nessa reportagem, como essa medida pode ser considerada uma violência institucional misógina.

Sua proposta foi redigida pelo ex–deputado estadual Fred Rodrigues (Democracia Cristã) e assinada pelo Govenador do Estado de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil). Ao contrário do que foi divulgado em inúmeros canais de mídia, a legislação não obriga a gestante a fazer o ultrassom, mas ela foi escrita de forma a gerar dúvidas. Desse modo, deixo para você, leitor, um espelho para que se possa fazer sua interpretação:

  • Imagem apresenta a Lei Nº 22.537

Para analisar a Lei e seus desdobramentos, a seguir serão apresentadas três entrevistas: uma com a psicóloga Cida Alves, outra com a Presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB Goiás, Fabíola Ariadne e por fim uma com a cientista política Mariana Prandini. Dessa forma leitor, vamos compreender as implicações mentais e legislativas que os artigos e os incisos determinam.

Violêcia psicológica e tortura

Desde o ano de 1996 a psicóloga Cida Alves trabalha com o acompanhamento de mulheres que foram vítimas de estupro e que passariam pelo procedimento da contracepção de emergência. Nessa época, a pílula do dia seguinte estava sendo adotada como método contraceptivo e esse foi o primeiro serviço público de saúde mental para mulheres no Estado de Goiás.

Quando perguntada sobre sua opinão de especialista a respeito da Campanha de Conscientização Contra o Aborto, que culminou na aprovação da Lei, Cida responde:

Essa é uma lei que nos surpreendeu. Como que a gente não para de revitimizar as mulheres né?  Quando se acompanha esses casos na psicologia o contato é muito íntimo, então, talvez, coisas que elas não falariam para sua família, ali no serviço de atendimento elas falam, na psicologia né? Então, assim, a dor da violência é tremenda. Você veja que é uma lei que tem como autor um homem. Quem sancionou é um homem. E a gente precisa parar de interferir nas decisões das mulheres. Nenhuma mulher opta por uma interrupção de gravidez feliz. Normalmente é algo muito dramático que está acontecendo na vida delas e aqui nós temos na legislação que é prevista a interrupção da gravidez decorrente de estupro, da gravidez que implica em risco de morte para mãe e da gravidez de um feto anencéfalo, que não tem possibilidade de viver.

Seguindo essa linha de pensamento, a psicóloga compara o exame de ultrassom com os batimentos cardíacos do feto com um método de tortura:

Esse procedimento proposto se assemelha à prática de tortura, tal qual que a intenção da tortura é infringir ao ser humano a maior dor possível, seja dor física ou a dor psíquica, para obrigá-la a algo. No caso da tortura que, por exemplo, acontece às vezes nas delegacias ou aconteceu tanto nos porões da ditadura era para delatar companheiros né? Nesse caso, essa tortura funciona para quê? Para criar um sofrimento tão absurdo na mulher que ela mude a sua própria vontade. Quando a violência psicológica tem uma finalidade de obter algum resultado e é muito intensa ela é caracterizada como tortura. Só para você ter uma noção, a Organização Mundial da Saúde equipara o grau de determinadas violências psicológicas com a mesma situação de trauma de guerra.

Sobre as consequências que esse trauma pode gerar, Cida exemplifica:

Existem mulheres que, com o impacto, cada uma vai viver de um jeito. A gente não pode colocar tudo no mesmo quadro, cada uma vai viver mais algumas, mas o grau de sofrimento é muito forte. […] Ela pode ter algo no plano do seu humor, ou então um quadro de depressão reativa, ela pode ter um quadro de ansiedade agudizada. Para além, ela pode desenvolver dificuldades na sua sexualidade ou bloqueios na gratificação sexual, bem como dificuldades no plano afetivo, ou seja, não desenvolver vínculos afetivos.Também pode ter excitabilidade exagerada, que é como se ela tivesse hiper acionada para qualquer situação, então ela tem dificuldade de dormir, dificuldade de descansar e isso pode complicar outros aspectos da saúde dela. Ela pode desenvolver pensamentos intrusivos com aquela lembrança recorrente da situação sofrida, o que eleva a ansiedade e eleva o cortisol. Com a elevação do cortisol pode-se gerar até alterações na função cerebral. 

Ela também apresenta dois casos de mulheres, acompanhadas psicologicamente por ela, que foram abusadas sexualmente e desenvolveram dores crônicas. Uma apresentou essas dores no coração e a outra no baixo ventre. Ambas chegaram a realizar cirurgias, pois nenhum exame detectava o que elas tinham. Quando feitas as cirurgias era descoberto que fisicamente não havia nada, apenas dores causadas pelos psicológicos traumatizados das vítimas.

Ademais, a psicóloga apresenta quais violências podem ser encontradas nessa legislação:

A propositura da Lei e do que ela representa é uma violência de estado e institucional (porque é o estado que está gerenciando essa política que vai ser implantada e porque ela fere todos os códigos de éticas profissionais). Além de ser uma violência de gênero tá? Porque impõe sobre a mulher o que ela deve fazer. A gente pode pegar o conceito mais sintético desse tipo de violência, que é você transformar as diferenças em desigualdades. É impor sobre um que é constituído como subalterno à vontade do outro. Então nós temos um conglomerado de violências interpeladas sobre a mulher nessa propositura de Lei.

Cida, que também tem formação educacional, opina a respeito das propostas de palestras para crianças e adolecentes contidas na legislação:

Ninguém quer que aconteça um aborto. Mas o que a gente quer realmente? Reduzir o número de aborto no nosso país. […] Então o que que precisa fazer a longo prazo? O que realmente funcionou para reduzir o número de gravidez na adolescência e gravidez indesejada nos outros países? Educação Sexual. É desde de muito cedo fortalecer afetivamente as crianças, do que que é o corpo, por que que o corpo tem certas reações. Já existem estudos que mostram que os países que adotaram a educação sexual, como a França, os adolescentes adiam a iniciação sexual. Quanto mais você entende o seu corpo, quanto mais você entende o que você está sentindo, menos vulnerável você fica a pressões, por exemplo de um namorado ou do conjunto da sociedade para que você inicie mais cedo. Quanto mais tranquilo você tá em relação ao seu próprio corpo e a essa energia vital tão maravilhosa que a sexualidade, mais equilibrado você tá para fazer seus projetos de vida. É o meio mais eficiente para você, inclusive, organizar sua própria sexualidade, planejar e entender quando é o momento para iniciar, quando iniciar quais métodos contraceptivos você vai utilizar. […] Alguns grupos ainda tem muita dificuldade de entender isso e se não conversa sobre gera preconceitos e informações imprecisas que podem levar a uma gravidez indesejada. […] Se ele (autor da Lei) realmente quisesse fazer um trabalho sério seguiria as indicações da Organização Mundial de Saúde, promovendo Educação Sexual, acompanhamento e acesso aos métodos contraceptivos

Inconstitucionalidade

A presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB Goiás, Fabíola Ariadne explicou quesitos legislativos em sua entrevista. O órgão do qual ela faz parte tem como dever comunicar a diretoria da OAB sobre quaisquer violações que dizem a respeito à mulher. Com isso, o CMA entende que a Lei Nº 22.537 apresenta inconstitucionalidade material porque:

Ela viola diversos princípios constitucionais, como o da dignidade humana (art. 1º, I); a cidadania (art. 1º, III); a liberdade (art. 5º, caput CF); a proibição de tortura ou o tratamento desumano e degradante (art. 5º, caput e III, CF); a saúde e o planejamento familiar das mulheres (arts. 6º, caput e 226, § 7º, CF) e os direitos sexuais e reprodutivos (art. 6º CF). Desrepeita, também, tratados internacionais em que o Brasil é signatário como a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (ONU, 1979) e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (OEA, 1994). 

Pararelo a isso, a Lei também apresenta inconstitucionalidade formal, segundo a advogada:

Mesmo considerando que a saúde é um assunto de competência legislativa compartilhada entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, acreditamos que as autoridades locais não têm o poder de aprovar leis que restrinjam o acesso à saúde, especialmente quando garantido por legislação federal, mas apenas no sentido de expandi-lo. Portanto, a lei contestada viola o princípio federativo no contexto das competências legislativas estabelecidas pela Constituição, uma vez que não existe um “interesse local” que justifique a regulamentação do assunto, considerando que o aborto é uma questão de interesse nacional.

Também é válido ressaltar que a lei apresenta contrariedades que violam leis federais:

Além disso, as leis locais (estaduais ou municipais) não podem disciplinar um tema regulamentado por lei federal de maneira contraditória. O inc. V do art. 3º, por exemplo, coloca expressamente a vida do nascituro como prioridade em relação à vida da mulher, indo contra a legislação federal. A lei diz expressamente que em uma situação de possibilidade do aborto legal, a prioridade é a manutenção da vida do feto. Porém, a lei federal, ao prever o aborto legal no art. 128 do Código Penal (caso a gravidez coloque em risco a vida da gestante ou tenha sido resultado de estupro, e, também, em caso de anencefalia, diante do julgamento da arguição de descumprimento de preceito fundamental 54) a prioridade é a vida da mulher. 

Sobre as propostas de palestras para crianças e adolecentes, Fabíola explica que ela também viola princípios legislativos federais:

Entendemos, também, que a lei afronta a Lei de diretrizes e bases da educação nacional (LDB). Aborto não é tema dessa lei, não há previsão legal para expor crianças e adolescentes a esse tipo de proselitismo, expõe elas a conteúdo inadequado e sem previsão curricular.

A lei foi denunciada por esses motivos para a OAB Goiás, de modo que a Advogada, junto a sua comissão, realizaram o ofício para o conselho seccional da OAB, que pode autorizar o ingresso da ação de inconstitucionalidade. No presente momento a CMA está fazendo um parecer para fundamentar esse pedido.

Para além, a advogada também cita as violências que as mulheres se tornam vulneráveis com a Lei Nº 22.537:

Acrescento ainda que a Comissão entende que essa lei abre brechas para a prática de violência institucional, psicológica e moral contra mulheres em completo estado de vulnerabilidade. Esta legislação violenta a mulher ao estimular que ela ouça o coração de um feto resultante de uma violência sexual vivida; violenta ao propor que a mulher ouça e tenha que escolher entre a batida de seu próprio coração ou a do feto; violenta quando incentiva que ela ouça os batimentos de um feto que ela sabe que vai parar de bater quando nascer,o que provoca intenso sofrimento.

Quando questionada sobre os termos “garantir” e “assim que possível” presentes no inciso VI, se eles determinam ou não a obrigatoriedade do exame, Fabíola respondeu:

Nós não podemos nos afastar da realidade para analisar esse “garantir” e o “assim que possível”. Há pouquíssimos hospitais públicos no Brasil que oferecem o aborto legal. Vamos supor que um médico invoque a objeção de consciência (é a recusa em realizar determinada ação que contrarie os ditames da própria consciência) para a gestante, para que ela ouça ou veja o ultrassom. Essa categoria de leis provoca deficiências sistêmicas no apoio médico às meninas e mulheres que foram vítimas de violência sexual. Essas deficiências incluem a falta de uniformidade no protocolo médico. A elaboração de documentos, como os mencionados anteriormente, gera confusão entre as equipes de saúde e desorganiza os protocolos nas instituições. Além disso, há diferenciação nos protocolos entre os estados e, muitas vezes, incluem procedimentos ilegais, sem evidência científica, como no caso das restrições ilegais aos procedimentos com base na idade gestacional.

Pessoas gestantes

A professora da Universidade Federal de Goiás Mariana Prandini, com doutorado em Ciência Política pela New School for Social Research (EUA) e com especialidades em saúde pública, direito e teoria jurídica e política feminista, concedeu uma entrevista sobre sua análise da Lei anti-aborto.

Segundo Mariana, que também acredita que a lei é, antes de mais nada, incosntitucional, ela viola inúmeros diretos de mulheres, meninas e pessoas gestantes, pois:

A lei fere o direito de acesso à saúde, o direito a não discriminação, o direito a um tratamento digno, o direito não ser tratado de forma de degradante ou cruel. Entendo que dispositivos dessa lei, inclusive, poderiam até configurar uma forma de tortura e violência psicológica. Então ali ela claramente é inconstitucional, mas mais do que isso, ela é uma lei que não trata mulheres, meninas e pessoas gestantes como pessoas capazes de tomar suas decisões sobre a sua vida reprodutiva. Então é uma lei que também desrespeita as pessoas, que não as tratam como iguais no contexto da nossa comunidade política.

A cientista política também afirma que não é uma lei que traz nada de novo. De acordo com ela, nos Estados Unidos os movimentos anti–aborto também estão ensaiando uma tramitação de leis com conteúdos próximos a essa que foi aprovada no Estado de Goiás. O objetivo geral é impor barreias e reduzir de forma significativa, mas gradual, o direito de acesso a tal procedimento, que é aprovado por lei em alguns Estados do país norte-americano.

Mariana, acha interessante e questiona a retórica que essas legislações apresentam:

Como de várias outras, é uma retórica que tenta, pelo menos de forma aparente, dizer que está fazendo algo para proteger, né? Então a legislação tem certos termos e palavras que parecem que é uma legislação protetiva. “Proteger as mulheres, as meninas do aborto inseguro, assegurar que elas saibam, ou dê acesso à informação, quanto as consequências de um aborto ilegal”. Quando na verdade o que ela faz é aprofundar ainda mais um contexto de injustiça reprodutiva, que já existe no nosso Brasil. Primeiro em função da criminalização do aborto, que é a principal causa de abortos inseguros. Não é insegurança do procedimento, mas a lei penal. É a lei penal que coloca as pessoas em risco e o fato de que mesmo naquela situação de garantias em lei, as pessoas vão ser submetidas a tratamento cruel, violento, a tratamento de má ou de baixa qualidade, que muitas vezes acontecem nos serviços de saúde como vários relatos já registrados, documentados por pesquisas na área que apontam isso.

Fazendo uma análise do cenário político goiano, a cientista política diz que a Lei Nº 22.537 reflete o conservadorismo e o movimento anti genêro do Estado de Goiás. Segundo ela, no Brasil esse movimento é organizado, financiado, com muita visibilidade e estratégias e a pauta anti-aborto é a principal a ser debatida dentro dele.

Para além, Prandini considera que o Estado de Goiás é um foco, sendo extremamente relevante na produção de conteúdos e atores do movimento, podendo ser considerado, inclusive, como um laboratório de tais ideologias. Ela comprova seu ponto com o exemplo da legislação que impediria que o conteúdo de gênero fosse lecionados nas escolas.

É um movimento conservador, que não apenas pretende desfazer as conquistas de muitos direitos das mulheres, da população LGBTQIA+, dos direitos das crianças e adolescentes, mas que também tem uma clara intenção de disputar o conteúdo jurídico, o sentido dos direitos e produzir um mundo conservador, em que o binarismo de gênero seja a regra né? Seja a compreensão e que seja restituída essa ideia de que existem apenas homens e mulheres, no sentido biológico, natural, e que seriam os homens e as mulheres reais, segundo esse ideal conservador anti genêro. Isso através de restituição de “papéis muito marcados, definidos, complementares” para esses seres que viriam só na forma de homens e mulheres, desconhecendo todas as outras configurações familiares que não seja a família seja cis heterossexual e assim por diante. Acho que essa Lei anti aborto entra nesse grande pacote.

Sobre os pontos negativos a respeito da saúde pública que essa lei representa, a cientista política fala:

Então acho que os pontos negativos são, o primeiro: instituir uma série de requisitos para prestação do serviço de saúde, que já faz com que esse serviço não seja compassivo, centrado na pessoa, de acolhimento, que é o que deve ser o serviço de aborto legal. E o segundo ponto é que as pessoas vão ter medo né? Se a gente tá criando uma infraestrutura institucional, que está disseminando a ideia de que o aborto é errado, de que o aborto é imoral, de que o aborto é arriscado e de que mesmo nessas situações legais você não deveria buscar o serviço, as pessoas não vão buscar. Isso faz com que as pessoas recorram à clandestinidade.

De acordo com Mariana, abortos clandestinos não são sinônimos de abortos inseguros:

Hoje, principalmente com a tecnologia dos remédios, da medicação, do aborto como medicamentos, o aborto clandestino ele pode ser um aborto seguro, ele pode ser um aborto cuidado, ele pode ser um aborto tranquilo, um aborto com alto nível de qualidade. Mas nem sempre é assim, porque a gente sabe que se tem uma série de barreiras sociais no Brasil e eu diria que uma das principais se deve justamente a barreira de classe, em que muitas pessoas não podem pagar para ter um aborto clandestino seguro e cuidado.

Uma das falas do ex–deputado é a seguinte:”a mulher quer ter direito sobre o próprio corpo, mas quem determina o direito do corpo do bebê?”. Marina analisa essa frase para com os Direitos Humanos e com bases jurídicas:

Acho que essa é uma fala recorrente, que nega não só a mulher, mas a todos os corpos que gestam. Acho que é muito importante a gente ressaltar isso. Se por um lado a fala do deputado nega a mulher o status de sujeito de direitos, comparando a mulher ao “bebê”, colocando no mesmo status jurídico e na mesma hierarquia jurídica, por outro lado é uma fala também que invisibiliza e que nega a existência de corpos que gestam e que não são corpos de mulheres. Então acho que a gente tem duas violências que são perpetradas aí. Uma violência contra todas aquelas pessoas que se identificam como mulheres, cujo status jurídico é comparado ao status do feto e coloca-se direitos e proteções desses corpos no mesmo nível de proteção ao feto. E por outro lado existe também a negação da própria existência de todos os outros corpos que gestam, de pessoas trans masculinas, de pessoas não binárias, de todos os outros corpos gestantes que não se identificam como mulheres e portanto, também, podem passar pela experiência do aborto. 

Ademais, a cientista política acrescenta:

A teoria feminista e a teoria transfeminista são antídotos contra falas como essas, que negam a mulheres, a crianças e a pessoas que gestam o status de sujeitos completos, sujeito integral, sujeitos de direito, de participantes iguais na vida comunitária, na nossa comunidade política. Porque, segundo o nosso ordenamento jurídico, o feto não é um sujeito de direito, o feto não tem personalidade jurídica. O que existe é uma expectativa de direito e por isso não é possível a gente admitir falas como essas, que vão dizer que existe uma igualdade. Falas que tratam os corpos gestantes apenas como receptáculos, como carregadores de uma possível vida futura. 

Fred Rodrigues

O ex–deputado Frederico Rodrigues do partido Democracia Cristã, propôs esse texto em agosto de 2023. Por conta disso, a data do Dia Estadual de Conscientização Contra o Aborto seria realizado em 8 de agosto. Ele teve seu mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral em dezembro de 2023 por pendência na prestação de contas na sua eleição para Vereador de Goiânia no ano de 2020.

A reportagem tentou inúmeros contatos com Fred para analisar todos os lados dessa lei, investigando os estudos que levaram a sua formação, bem como indagando os termos utilizados. Entretanto, até a data de publicação e atualização dessa reportagem, não foi recebida nenhuma resposta.

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