Talento Vs Dinheiro: o papel do elitismo na Fórmula 1

Esporte dos ricos: contra ou a favor da volta de brasileiros na categoria ?
Tempo de leitura: 11 min
Ana Karoline Nascimento

Desde a saída de Felipe Massa em 2017, não tivemos nenhum representante na categoria mais importante do automobilismo. E olha que nesse esporte, o Brasil escreveu vários nomes conhecidos: Ayrton Senna, Nelson Piquet, Emerson Fittipaldi e mais uma turma enorme de brasileiros que fizeram histórias tanto em títulos, quanto nas corridas.

Para quem não está por dentro da história, o Brasil é considerado o terceiro país com maior número de títulos na competição (campeonato de pilotos e construtores). Ao todo, nosso país levantou 8 troféus, ficando atrás somente da Alemanha que tem 12 troféus, e a líder disparada no ranking mundial da categoria: o Reino Unido que conquistou 20 títulos para os britânicos.

Veja abaixo quem são os brasileiros que conquistaram títulos na Fórmula 1: 

Emerson Fittipaldi 

  • 1972: Lotus (Reino Unido);
  • 1974: Mclaren (Reino Unido).
Créditos: Brian Spurlock via Getty Images

Nelson Piquet 

  • 1981: Brabham (Reino Unido):
  • 1983: Brabham (Reino Unido):
  • 1987: Williams (Reino Unido).
Créditos: Bob Thomas via Getty Images

Ayrton Senna

  • 1988: Mclaren (Reino Unido);
  • 1990: Mclaren (Reino Unido);
  • 1991: Mclaren (Reino Unido).
Créditos: Pascal Rondeau via Getty Images

O último brasileiro que comemorou o título mundial, por 30 segundos, foi Felipe Massa, quando corria pela Ferrari. Na ocasião, estava disputando o campeonato de 2008 com Lewis Hamilton. Para Felipe se consagrar campeão naquele ano, o britânico tinha que terminar em sexto ou sétimo no Grande Prêmio de Interlagos. 

No finalzinho da prova, Hamilton terminou na quinta colocação e levou o título por 1 ponto de diferença. Essa é considerada a maior decepção para os brasileiros na categoria. 

Não pense que para estar na disputa por uma vaga em algumas dessas equipes, os brasileiros não passaram por alguns perrengues na vida. Para ser um campeão, é preciso ter a mentalidade de ganhar ou perder nos momentos certos da vida.  

Para ter noção, hoje em dia é considerado impossível um brasileiro entrar na F1. Imagina o que Senna, Piquet ou Fittipaldi passaram para chegar ao esporte e se tornar Campeões. Existe toda uma trajetória e para chegar ao topo, exige-se muitos sacrifícios. 

E como dizia Ayrton Senna: “No que diz respeito ao empenho, ao compromisso, ao esforço, à dedicação, não existe meio-termo. Ou você faz uma coisa bem feita, ou não faz”. 

MERCADO DE PILOTOS EM 2023

O mercado de pilotos na fórmula 1 é bem diferente de como funciona no futebol. Nesse esporte, as equipes gostam de jogar pelas regras da competição, mas entenda o seguinte: no futebol, quando um jogador assina um contrato ele tem que cumpri-lo até o fim; já no automobilismo, tanto a equipe quanto o piloto pode encerrar sua parceria ainda se o contrato é válido.  

Após Sebastian Vettel anunciar sua aposentadoria na Fórmula 1 o mercado ficou bastante movimentado. Com isso, para temporada 2023, a Aston Martin, Alpine, Alpha Tauri, Williams e a Haas eram algumas das equipes que não havia definido sua dupla de pilotos.

E o que não deixou de ser especulado no Paddock era a possível presença de um brasileiro no próximo ano. Ao desfecho da história, o atual campeão (Felipe Drugovich) foi anunciado como reserva da Aston Martin e o quarto colocado do campeonato de 2022 de Fórmula 2, Logan Sargeant, ocupou a segunda vaga na Williams Racing.

Em geral, alguns fãs do esporte apontam que o americano conquistou espaço na categoria porque tinha mais dinheiro, mas aí que a situação muda. Sargeant fazia parte da academia de pilotos da equipe britânica e pelo fato de ser americano, abre a possibilidade da equipe ter mais visibilidade na competição.

De acordo com Julliane Cerasoli, colunista do UOL e produtora da TV Bandeirantes, ela aponta que para um brasileiro entrar na F1 precisa ter um bom patrocínio e deixar ótimos resultados.

Para entrar você precisa ter um bom pacote (patrocínio, ter deixado uma boa impressão nos anos anteriores – e isso nem sempre quer dizer resultado, mas sim a maneira como o resultado foi conquistado – ter conseguido alguma experiência com F1 – e aí estar ligado a alguma equipe faz diferença, etc), completa Cerasoli.

CATEGORIAS DE BASE

Qualquer piloto jovem que tenha um sonho de entrar na disputa por uma vaga no grid mais popular do automobilismo, irá passar por diferentes categorias de base, por exemplo, a fórmula 2 (F2), a fórmula 3 (F3) e a fórmula 4 (F4). Lembrando que a F2 é considerada a porta de entrada para a Fórmula 1. 

Vencer as competições ajuda o atleta a conseguir pontos para a superlicença FIA – habilitação para participar das corridas. 

Hoje em dia, observamos o quanto os brasileiros estão crescendo nos campeonatos juniores, como a F3 e F4 brasileira, Campeonato brasileiro de Kart, entre outras.

PATROCÍNIO E APOIO FINANCEIRO  

Como citado anteriormente, as categorias de base são importantes para a carreira do piloto. Mas contar com patrocinadores fortes ainda é um dilema para os jovens atletas que buscam entrar na maior competição automobilística. 

Uma situação vivida na Fórmula 1 atualmente é a questão dos pilotos pagantes. De acordo com Max Wilson, atual comentarista de automobilismo na TV Bandeirantes, um quarto dos pilotos eram pagantes antes da saída de Nikita Mazepin da Haas. O russo estava na categoria porque seu pai, Dmitry Mazepin, investia bilhões de euros em patrocínio na equipe americana para ver seu filho correndo pela F1. 

“Na elite do esporte, quando acontece uma situação dessa, na minha visão, é uma coisa completamente contrasenso e incoerente. Realmente quando pensamos que o cara tem que ser bom e levar um monte de dinheiro, acaba se tornando um dilema desfavorável, pois entrar em uma competição bancária é difícil para nós”, completou Wilson em entrevista ao Canal Livre. 

Até 2021, o grid da Fórmula 1 era formado por três filhos de bilionários que estavam há anos na categoria e somaram mais prejuízos do que pontos em suas respectivas equipes, como foi no caso de Nicolas Latifi, Lance Stroll e Nikita Mazepin. Atualmente, ainda são questionados no esporte pelo dinheiro e influência dos pais em mantê-los no torneio.  

Vindo de uma origem humilde, correndo pela Mercedes e considerado o maior na história da F1 com sete títulos conquistados, o britânico Lewis Hamilton conta que a categoria acabou virando um clube de bilionários e defende os direitos à acessibilidade no esporte.

“Pessoalmente, acredito que estamos em um momento no qual isso aqui se tornou um clube dos meninos bilionários. Crescendo em uma família normal da classe trabalhadora, eu não teria como estar aqui. Os caras com que tenho que lutar contra têm muito mais dinheiro”, completou Hamilton em entrevista ao jornal espanhol AS.

UMA NOVA GERAÇÃO  

Os irmãos Fittipaldi: Pietro e Enzo, ambos netos do bicampeão mundial Emerson Fittipaldi, acertaram uma parceria junto ao Banco do Brasil, visando reunir o automobilismo real com o virtual, atingindo o público mais jovem.  

Os dois são donos do canal “Fittipaldi Brothers” (considerado o maior de corridas no Brasil e segundo maior do mundo na Twitch) que reúne vários amantes de games automobilísticos. 

Além disso, o banco vai estampar sua marca no macacão de Pietro como piloto reserva da MoneyGray Haas. Enzo também estampa o nome do Banco do Brasil nas rodadas da Fórmula 2. 

Pietro Fittipaldi a esquerda e Enzo Fittipaldi a direita. Créditos: Zach Catanzareti Photo

Após conquistar o título da F2 no ano passado, Felipe Drugovich é uma das promessas brasileiras na F1 e se juntou ao time da Aston Martin Racing como piloto de desenvolvimento da equipe britânica. Em 2023, o paranaense fechou com a Porto Seguro para ser sua patrocinadora oficial nas corridas. 

A parceria é firmada em aumentar a popularidade do automobilismo brasileiro no esporte e desenvolver novos nomes, como Felipe.  

Lembrando também que a Aston Martin chegou a um acordo com empresa XP investimentos, com o intuito de aumentar a visibilidade dos pilotos brasileiros e trazer o amor do Brasil pelo automobilismo.  

O paranaense disse que a falta de apoio das empresas são um dos fatores para os brasileiros não estarem entre os vinte melhores no Grid da Fórmula 1, uma vez que não depende só do talento e sim da dificuldade das jovens promessas em subir para as categorias mais altas. 

“Olha, eu acho que é a boa vontade das empresas, no final das contas”, avaliou. “O brasileiro, hoje em dia, está muito carente de um piloto na F1, e, de uma certa forma, me parece que eles (patrocinadores) estão esperando alguém chegar lá para realmente ajudar, e não é assim que acontece”, ressaltou Drugovich.  

Créditos: Joe Portlock – Formula 1/Formula Motorsport Limited via Getty Images

O TALENTO AINDA VALE ?

O papel fundamental da FIA nesse quesito era construir um ambiente de igual para igual na F1, sem lutas de classes sociais. Por isso, deveria ser uma categoria em que os atletas conseguissem entrar por talento e mérito próprio e não fazendo um jogo grotesco de “quem dar o lance maior, está dentro”. 

As equipes tanto nessa categoria quanto em outras do automobilismo devem promover rodas de conversas entre os chefes de equipes, pilotos e os fãs que acompanham o esporte. Com o objetivo de trazer a importância sobre assuntos como: as lutas de classes sociais e espalhar campanhas de incentivo contra a discriminação racial.  

Para mudar esse cenário elitista, Lewis Hamilton criou a fundação Mission 44 que tem como principal objetivo, ajudar e incentivar jovens de grupos minoritários do Reino Unido. Nos próximos anos a comunidade trabalhará em parceria com o novo programa da Mercedes, que garantirá mais inclusão e diversidade dentro do esporte.  

“No passado, eu vivi como é ser, sair de uma condição pouco representada e como pode afetar o futuro. Mas, felizmente, fui capaz de superar as probabilidades com oportunidades e apoio. Quero garantir que outros jovens, de cenários similares, sejam capazes de fazer o mesmo”, completou o heptacampeão. 

Falando nas categorias de bases, o comentarista da TV Bandeirantes, Reginaldo Leme, reforça a importância do assunto citado neste artigo. “Se a geração de pilotos, hoje, é menor em quantidade e menos talentosa, é por falta de investimento nas categorias de base”, diz Leme, jornalista especializado em esportes a motor. 

As competições juniores são essenciais na vida do piloto, pois ao longo do tempo vão adquirindo mais experiências e conhecimentos. Acredito que a maior dificuldade presentemente é que depois de uma determinada categoria, os jovens competidores não conseguem ninguém que os levem a outro patamar no esporte.  

Nessa fase da vida, terão que deixar toda a sua estrutura, por exemplo, ir morar fora (na Europa principalmente), encontrar uma equipe e ter uma boa renda financeira até chegar à porta de entrada da Fórmula 1: a F2. 

Créditos: Lars Baron via Getty Images

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