Linguagem neutra proibida em órgãos públicos: simplificação da comunicação ou preconceito?

A proibição do uso de linguagem neutra tem a justificativa de facilitar a comunicação, mas será isso mesmo?
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Augusto Nunes

A Câmara dos deputados aprovou no último dia 5 de dezembro de 2023, a proibição do uso da linguagem neutra em órgãos públicos, com a justificativa de facilitação da comunicação. Os parlamentares aprovaram uma emenda projetada pelo deputado Junio Amaral (PL-MG), que impõe que a administração pública não deverá usar “novas formas de flexão de gênero e de número das palavras da língua portuguesa”.  Além disso, Amaral apontou a linguagem neutra como uma “aberração” e não se encaixa em uma linguagem simples.

A emenda foi chamada de “Jabuiti” (jargão parlamentar que refere à inclusão de trecho sem relação com o projeto original.) As federações PT/PCdoB/PV e Psol/Rede, além da bancada do governo e da maioria, orientaram votos contra o trecho. A emenda foi aprovada por 257 votos a favor, 144 deputados votaram contra e 2 se abstiveram. Lembrando que a emenda ainda precisa ser aprovada pelo Senado antes de começar a ser executada, mas já podemos interpretar se isso é técnico ou preconceito.

Posição da ABL

A linguagem neutra vem ganhando força nos últimos anos, como uma forma de representar aqueles que não se sentem bem definidos como “ele” ou “ela”. Com essa crescente, a discussão sobre o uso ou não dessa linguagem vem ganhando notório espaço nas discussões sociais, nos plenários e em todo território brasileiro.

A Academia Brasileira de Letras (ABL) ainda não vê o momento como ideal para a oficialização da linguagem neutra. O presidente Merval Pereira esclareceu que a ABL analisa o tema com prudência e completou que a linguagem neutra ainda é um fenômeno incipiente incipiente e de nicho, e ressaltou que a mudança seria complexa, já que alteraria a estrutura do português brasileiro.

“Os documentos oficiais devem seguir as normas oficiais que estão vigentes. Se o professor quiser falar ‘todes’ na sala de aula, ele estará prejudicando a maioria dos alunos que não sabe o que é isso. Ele também não pode obrigar os alunos a usarem a linguagem neutra, porque não há nada que obrigue a isso”

A posição do presidente, foi confirmada quando a acadêmica Heloísa Teixeira usou vocabulários neutros em seu discurso de posse na ABL , causando espanto do presidente que definiu a situação como um “espanto”.

“Um espanto, como se a Academia Brasileira de Letras estivesse adotando a linguagem neutra naquele momento, não é nada disso”

O presidente, completou dizendo que é preciso cautela para que não se cometa um erro nem ao assumi-lo oficialmente, nem ao renegá-lo definitivamente.

“A gente tem que ficar atento a continuidade do uso ou não dessa linguagem, ver até que ponto ela pode se ampliar na sociedade, fora do nicho na qual nasceu e que, no momento, só pessoas ligadas a esse nicho usam”

Opinião de especialistas

Rodrigo Seixas professor Adjunto da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás (FL/UFG) e Doutor em Estudos Linguísticos (UFMG), em rápida fala, pontuou que: “é apenas um subterfúgio mesmo dos parlamentares para aprovar uma pauta conservadora de costumes.”

Em contato com outra especialista, a professora Neide Lima, formada em letras pela Universidade Estadual de Goiás, ela pontuou que não vê a necessidade do uso da linguagem neutra e também citou que uma aprovação dessa forma linguística alteraria toda a estrutura da língua portuguesa.

“Augusto, eu sou muito defensora do não preconceito linguístico, e sou muito da linha de Marcos Maylon, então assim na minha opinião eu respeito quem pensa de forma diferente e defende o gênero neutro, mas pra mim quando eu digo, por exemplo,bom dia a todos, boa tarde a todos, boa noite a todos. Eu já incluo todos os grupos sem exceção e sem preconceito, e fazer uma, mudança incluir esse “todes” que eles querem por exemplo, gênero neutro na língua portuguesa na gramática da língua portuguesa não é algo tão simples. Na verdade se isso acontecer futuramente de se incluir esse gênero neutro necessitará de uma mudança de estrutura na língua porque não é só o pronome em si. Teríamos que mudar por exemplo adjetivos, substantivos pra combinar com isso pra nós. É tudo uma questão estrutural da língua. Então eu não vejo que seja preconceito linguístico.”

Afinal, objetividade ou preconceito?

Com um debate que se tem vários pontos a discussão é profunda e longa, fazendo com que nem a própria ABL se posicione de forma concreta. Com isso, o tema pode se levar anos para ter sua inserção a língua portuguesa, mas no momento isso se tem longe uma vez que os representantes políticos querem a proibição dessa forma de linguagem. A estudante de Filosofia, na UFG, Patrícia Gerais é uma pessoa da comunidade LGBTQIA+ e deu sua opinião sobre o assunto.

“Creio eu que deixa a comunicação extremamente mais fácil. Até por que, o mundo passou anos e anos utilizando os pronomes que já temos, não há motivo algum para a utilização de outro tipo de pronome.”

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