As mídias da UFG informam?

A UFG tem postado diversos memes nas redes sociais e ganhando bastante engajamento, porém algumas reclamações têm surgido por conta disso. Com isso, basta a pergunta: as mídias da UFG realmente cumprem com a missão de informar o público?
Tempo de leitura: 14 min
Tayná Freitas
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Recentemente, os perfis de Instagram e Twitter da Universidade Federal de Goiás (UFG) têm ganhado notabilidade entre a comunidade universitária referente à instituição. Com uma linguagem mais jovial e descontraída, com memes e gírias, muitos usuários das rede sociais que seguem as contas da UFG têm engajado com posts por meio de comentários, retweets e compartilhamentos.

No entanto, elogios não são toda a base de opiniões sobre o gerenciamento das redes sociais: há algumas críticas e chateações devido à forma como as contas, que falam oficialmente pela Universidade, trataram alguns assuntos.

Para descobrirmos se isso é verídico, e se for, qual o problema que mais incomoda os usuários e seguidores das contas da Academia, a equipe do LabNotícias fez uma pesquisa por meio de um formulário online anônimo, voltado à comunidade acadêmica, para compreender o que as pessoas pensam.

Desfalques na mídia: informações em falta

A UFG está presente em seis redes sociais, ao todo, em perfis que são atualizados pela Secretaria de Comunicação (SECOM-UFG). São eles: Facebook (83 mil seguidores), Instagram (125 mil seguidores), Twitter (209,2 mil seguidores), TikTok (2120 seguidores), LinkedIn (86,7 mil seguidores), e, mais recentemente, Threads (5,3 mil seguidores).

Para esta reportagem, será feito o recorte para Instagram e Twitter, por serem as contas oficiais que mais têm seguidores.

A equipe do LabNotícias entrou em contato com a Secom para conseguir informações referentes ao alcance das publicações nas duas redes citadas: Instagram e Twitter, porém, até o momento desta publicação, não obtivemos retorno referente à isso.

No entanto, a pesquisa feita por meio do formulário online teve um resultado bem diferente: ao todo, 143 pessoas responderam, com a maioria sendo discentes, equivalente a 87,4% das respostas, com 2,8% vindo de profissionais que compõe o corpo docente, enquanto 4,9% vieram de servidores técnico-administrativos. As demais respostas (4,9%) foram provenientes do público externo.

Desta pesquisa, apenas 4,2% dos entrevistados (seis pessoas) não seguem a UFG nas redes, enquanto os demais, 95,8% seguem em ao menos um dos perfis (ou Instagram, ou Twitter).

Quando questionado se os entrevistados achavam que os perfis da UFG nas redes citadas cumprem com a missão de informar o público, 13,3% das pessoas votaram que não. Entretanto, quando outro questionamento é feito, sobre se a instituição deixou de informar ou divulgar sobre algum evento que poderia ser de seu interesse, esse número sobe para 41,3%.

Imagem 1: gráfico sobre quantas pessoas concordam ou discordam se a instituição cumpre com missão de informar o público-alvo.
Imagem 2: gráfico sobre quantas pessoas acham que a UFG já deixou de divulgar ou informar sobre algum evento ou acontecimento que poderia ser de interesse do participante.

As reclamações principais variam de falta de pronunciamento sobre algum acontecimento de caráter sério (como notas sobre racismo e notas de falecimento), como falta de divulgação sobre participações esportivas, palestras e lançamento de livros, assim como de assuntos mais inerentes a cada faculdade, como divulgação de estágios, projetos de extensão e editais acadêmicos.

No entanto, a resposta que mais chamou atenção é referente à falta de seriedade com a qual é tratada a questão dos cachorros de rua que são abandonados no campus, em específico o Samambaia.

O caso de abandono de animais na UFG

No último mês de junho, a UFG postou um reels, vídeo em formato horizontal voltado para as redes, no Instagram, que mostrava um cachorro sem dono que entrou em uma das salas de aula da Faculdade de Artes Visuais (FAV) e destruiu o trabalho dos alunos.

No entanto, antes que o dia acabasse, o conteúdo foi removido. Nossa equipe conseguiu uma resposta da Secom, que afirmou que a remoção foi motivada por terem percebido que o assunto é delicado.

“Porque percebemos que a questão do abandono de animais no campus é um tema sensível e que, portanto, não pode ser tratado com humor. Entramos em contato com a PROGRAD, que informou que criou um comitê para desenvolver soluções para o problema.”, respondeu a secretaria.

O vídeo é similar ao que o Portal6 postou no instagram:

A postagem no perfil da UFG no Instagram recebeu diversas reclamações, que levaram à exclusão do post. No formulário, alguns participantes abordaram diretamente essa questão:

“Acredito que até um certo ponto era divertido e descontraído, mas passou a beirar a desinformação e, em alguns casos, parecer maquiar e esconder um descompromisso com algumas causas importantes, como, por exemplo, a situação dos cachorros que habitam o campus. Em um dado momento, publicaram um cachorro destruindo um trabalho da FAV enquanto os animais vivem machucados e brigando entre si por conta da falta da castração.”

E esta não foi a única opinião: “Gosto dos modelos, acredito que aproxima mais o discente das redes oficias da universidade, mesmo que extrapolem às vezes, como no caso dos cachorros do Campus Samambaia em que a publicação ignorava completamente o abandono dos animais.”

A questão do abandono de animais é crime e a universidade recebe muitos cachorros que são largados por seus donos, tendo isso se tornado algo recorrente, que já chegou a causar problemas para estudantes da própria universidade.

Essa publicação levanta o questionamento sobre o uso de uma linguagem de “memes” em situações que não são adequadas. Apesar da publicação sobre o cachorro na FAV ter sido excluída, outra postagem foi alvo de comentários e reclamações no formulário, esta ainda está no ar.

O caso do Mês do Orgulho

No último mês, foi celebrado o mês do orgulho, onde ocorrem diversos movimentos a favor da comunidade LGBTQIA+. Em alusão à isso, a UFG publicou em suas redes sociais, com recorte no Instagram e no Twitter, duas postagens fixas e não temporárias.

A primeira a ser apresentada tem um caráter informativo, trazendo os órgãos da universidade que podem prestar auxílio à comunidade.

No entanto, esta publicação foi feita em ambas as redes sociais apenas em 28 de junho, quando a publicação abaixo, que angariou opiniões contraditórias da comunidade, já havia sido publicada no dia 19.

A postagem recebeu, além de comentários de caráter homofóbicos, questionamentos sobre políticas públicas. O comentário abaixo diz: “o meme tá legal, mas a assistência estudantil pra comunidade LGBTQIA+ vai mal…”.

Dentre reivindicações de políticas públicas para estudantes da comunidade trans (em específico) e LGBTQIA+, outra crítica é feita em referência ao post de tom engraçado, mas por uma instituição que é cobrada na questão de apoio à comunidade. “Políticas públicas são mais eficientes do que post engraçadinho”, afirmou um internauta.

Anna Clara Rodrigues, estudante de graduação da UFG e parte da comunidade, se mostrou insatisfeita com a situação e o post. “A publicação é muito estereotipada e é um desserviço para a comunidade. Esse tipo de publicação abre margem para comentários homofóbicos. Alguns assuntos não devem ser tratados de forma engraçada, com memes”.

Esse tipo de comentário não é exclusivo. Alguns participantes do formulário também compartilham da mesma informação, afirmando que a Universidade deveria ter uma linguagem um pouco mais formal.

“Acredito que por ser uma instituição de ensino superior renomada deveria manter uma linguagem mais formal em alguns momentos. Acho que os memes auxiliam a se conectar com o público ingressante, mas 90% do público da universidade está mais interessado na informação do que na brincadeira, então acredito que possa atrapalhar. Além disso, diversos memes usados já causaram polêmicas, como o do cachorro que comeu um trabalho da FAV, ou o da visibilidade LGBT. Sendo ambas polêmicas tranquilamente evitáveis se a equipe de mídias tivesse uma postura adequada.”

A questão dos memes

A linguagem indicada para instituições formais, é, por questão, formal. No entanto, não é raro ver situações em que empresas adotam uma forma mais descontraída para conseguir conversar com seu público e atraí-lo mais para seus conteúdos. Um exemplo é o trabalho que é feito pela Netflix em suas redes sociais.

A UFG tem usado cada vez mais dessa estratégia, e em parte, tem obtido muito sucesso. Em torno de 78,3% dos entrevistados concordam que a utilização de memes tem auxiliado na passagem de informação, porém, as críticas não são poucas.

Entre comentários positivos, que afirmam que o meme é engraçado e ajuda no engajamento, assim como na retenção de atenção dos usuários das redes, há vozes concordando que quando ultrapassado o limite, o tom de seriedade da mensagem desaparece e prejudica a informação.

“A gente entende o uso de memes na assessoria de mídias de empresas comerciais, mas a UFG não é uma empresa e não está tentando vender nada. Essa linguagem humorística é complexa e pode tirar o foco de coisas importantes, além de que na prática, não informa nada.”

A opinião compartilhada acima não é única. No formulário, diversas outras pessoas citam como a utilização de memes prejudica de certa forma a passagem da informação ou a imagem da Universidade Federal de Goiás como uma instituição de ensino de caráter sério.

“O uso constante de memes é algo típico de uma fandom (comunidade de fãs) de cantora pop, de um perfil de Twitter ou página de fofocas no Instagram. Essa JAMAIS deveria ser a postura adotada por uma Universidade Federal que se leve a sério. Se nem mesmo a página oficial da Faculdade se leva a sério, imagina os alunos?”

Em uma publicação feita pelo perfil da universidade no Twitter feito no dia 6 de junho deste ano, foi usado um vídeo da página de memes “Acervo Nazaré“. No entanto, a publicação da UFG teve a mídia desativada “em resposta a uma denúncia do proprietário dos direitos autorais”.

Por conta de situações como essa, nossa equipe perguntou à Secom quem é responsável pela criação e desenvolvimento das redes, que nos respondeu com a informação de que todos os perfis são administrados pela coordenação de redes sociais, que engloba quatro profissionais, das áreas de jornalismo, relações públicas, publicidade e audiovisual.

A Secretaria nos informou também sobre quem dá o veredicto final para as publicações irem ao ar.

“Depende do conteúdo. Quando o post envolve algum órgão ou pró-reitoria, o material é enviado para aprovação antes de ser postado. Outros tipos de conteúdo são debatidos internamente entre a equipe.”, disse Mariza Fernandes, jornalista que trabalha na coordenação das redes sociais da Secom.

É importante ressaltar que, de acordo com o manual de redes sociais da Secom, o principal objetivo das redes sociais é de “engajar estudantes, professores, técnico administrativos, pesquisadores e comunidade externa”. O documento, que você pode acessar ao clicar aqui, não há ressalvas específicas para memes, apenas para uso de emojis.

No entanto, há um tópico destinado à linguagem que traz:

“Os diálogos devem receber os usuários como eles procuraram as redes sociais.
Posturas sérias pedem respostas sérias. Brincadeiras pedem respostas em tom de
brincadeira. Em casos específicos, posts sérios ou em momentos de crise utilize
linguagem neutra, mas ainda acessível.”

Ainda sim, com os casos citados aqui, como o do cachorro na FAV e o do Mês do Orgulho, podem ser percebidos como uma disparidade do que é determinado no manual.

Apesar disso, são muitos os elogios destinados à Secretaria e a forma como são geridas as redes, que conseguem mobilizar o público e trazer um conteúdo, que por vezes acerta no engajamento quando é usado um tom mais descontraído.

“A linguagem usada aproxima a faculdade dos alunos, usando uma linguagem leve e divertida, que eles estão acostumados a usar todos os dias na internet. Diferente da linguagem acadêmica que seria usada pra se direcionar a docentes, por exemplo.”, afirmou um dos comentários.

Quando perguntados sobre o nível de satisfação que os entrevistados sentiam em respeito aos perfis no Instagram e Twitter, 69,3% responderam que entre satisfeitos a extremamente satisfeitos, enquanto 30,7% demonstraram neutralidade a extrema insatisfação.

A recepção é boa, mas devem ser tomados os devidos cuidados: “Acho que deixa com uma cara muito fútil e muitas vezes perco ate interesse sobre o que está sendo dito. É ok e divertido o uso de memes, mas acho que atualmente tem ultrapassado o necessário.”, relatou um dos participantes da pesquisa.

Sobre o tópico, o assessor de imprensa João Pedro Felix Ortiz, que atualmente trabalha na área por meio do orgão estadual Goiás Previdência (Goiasprev), comentou que essa linguagem é essencial, porém deve ser feita com cuidado.

“Tanto a comunicação institucional, quanto na assessoria de imprensa em si, é preciso buscar um equilíbrio entre a criatividade e o respeito. Considerar o dinamismo das tendências digitais e formas de comunicação é essencial sim para alcançar um público mais ativo e engajado socialmente, mas isso deve acontecer sem ignorar justamente a efêmeridade dos memes e linguagens e do público que não se adequa ao perfil jovem e ativo digitalmente. Nesses casos, o uso dessas ferramentas devem estar em conformidade com os valores e objetivos da universidade — que tende a buscar um contato contato direto com os discentes, inclusão social e até mesmo entretenimento — mas isso deve ocorrer sem a perca do caráter institucional e informativo. A informação deve vir antes da busca do engajamento casual.”

Dessa forma, ainda há um canal direto de conversa entre o público que segue a UFG e a coordenação das redes sociais. Para sugestões, críticas construtivas e elogios, basta que seja enviado um e-mail para o endereço redes.secom@ufg.br que a sua opinião será recebida pelos profissionais, que afirmam “O principal objetivo das nossas redes sociais é a interação, por isso sempre agradecemos pelos feedbacks e analisamos em equipe”.

Foto em destaque: Dale777/Unsplash.

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